1 de julho de 2018

A paciência tem limites. ASO tenta afastar Froome do Tour

(Fotografia: filip bossuyt/Wikimedia Commons)
A uma semana do início da Volta a França esgotou-se a paciência da Amaury Sport Organisation (ASO). A organizadora da corrida avançou mesmo para a tentativa de barrar a presença de Chris Froome no Tour. Não é ainda garantida, mas tendo em conta que os recursos da Sky poderão não obter resposta a tempo do ciclista estar em Noirmoutier-en-l'Île no próximo sábado, poderemos estar perante uma situação que marcará o ciclismo.

A ASO recorreu ao artigo 28 dos seus regulamentos que dita que a empresa "reserva o direito para impedir ou desqualificar do evento as equipas ou membros cuja presença poderá ser um dano para a reputação da organização ou da competição". Este artigo é o resultado de uma lição aprendida pela ASO há 20 anos, quando rebentou o caso Festina. Já lá vão duas décadas e se muito mudou desde então no combate ao doping, casos como o de Froome demonstram como muito mais há ainda a fazer. A começar pela demora na resolução dos processos.

A amostra que acabou por demonstrar o dobro do permitido da substância salbutamol (utilizada por asmáticos) foi recolhida a 7 de Setembro, na 18ª etapa  da Vuelta, corrida que Froome ganhou. O ciclista foi informado do resultado analítico adverso no dia 20, tendo ainda assim competido nos Mundiais. Conquistou a medalha de bronze no contra-relógio. Nada o impedia de o fazer, nem o impede. Esta é uma substância que não acarreta uma imediata suspensão provisória. Só em Dezembro o caso foi divulgado publicamente, com a Sky sempre demonstrar o seu descontentamento, já que o processo era suposto ser sigiloso.

Por mais que a equipa bata nesta tecla, a fuga de informação existiu. Por mais que Froome bata na tecla que o regulamento o permite competir, também poderia optado por auto-suspender-se. Mas o ciclista tem toda a razão. Não é ele quem está errado, são as regras. Se a demora na resolução do processo implica muitas questões, que assentam numa defesa minuciosa por parte do britânico, o facto de estar a competir é da inteira responsabilidade das regras estabelecidas. Poderia o processo demorar menos? Deveria para o bem da credibilidade do ciclismo. O porquê da demora talvez se venha a perceber mais tarde.

Sem luz ao fundo do túnel quanto ao final deste longo e polémico processo do salbutamol, a atitude da ASO não surpreende. Se na Volta a Itália ninguém quer ver a repetição do caso Contador e ter de entregar a vitória na corrida a outro ciclista, se na Vuelta desespera-se por perceber quem é o vencedor de 2017 antes da edição de 2018, no Tour tem uma história recente que manchou a corrida que continua a ser mais importante e mediática do calendário. O caso Festina foi grave. Lance Armstrong foi uma bomba atómica. Há sete edições sem vencedor... E depois temos ainda um Floyd Landis desclassificado (2006) e também um Alberto Contador (2010).

Desde que foi descoberto o que se passava na equipa Festina que a organização do Tour intensificou a protecção à imagem da corrida. Na sequência desse escândalo, Richard Virenque chegou também ele a ser barrado. Porém, como nunca foi provado que também ele tinha recorrido ao doping e essa batalha foi perdida. Houve nova tentativa em 2009 contra Tom Boonen, quando o ciclista deu positivo por cocaína. O belga acabou a competir. No ano antes foi a Astana que não foi autorizada a estar presente devido aos vários casos de doping que estavam a afectar os seus corredores. Foi precisamente a questão da imagem da corrida que foi salientada. A formação cazaque ficou mesmo de fora.

Existe uma diferença entre o que aconteceu com Virenque e Boonen e agora Froome. O britânico não tem a sua situação resolvida. A Sky vai recorrer e tem já uma audiência no Comité Olímpico e Desportivo francês. O problema é se houver recurso ao Tribunal Arbitral do Desporto, pois não está garantida de forma alguma uma decisão antes de sábado.

Durante todos estes meses, ciclistas, directores desportivos e, principalmente os responsáveis pelas organizações das grandes voltas, apelaram para que este processo ficasse resolvido rapidamente. O presidente da UCI, David Lappartient, sempre foi adiantando que dificilmente haveria a celeridade desejada por todos, a começar por Chris Froome. Este processo é analisado pelo Tribunal Anti-doping da UCI, que é, no entanto, completamente independente. Ou seja, Lappartient não pode intervir. O francês tem estado muito activo desde que assumiu a liderança do organismo no ano passado. O doping e a fraude mecânica têm estado na sua mira. Ficar-se-á à espera de ver se fará algo para evitar que um caso destes volte a acontecer no futuro. Pelo menos, que se aprenda essa lição.

A paciência tem limites. Christian Prudhomme - director do Tour e homem forte da empresa organizadora - e a ASO mostraram isso mesmo, segundo a notícia avançada pelo jornal Le Monde. Para o bem ou para o mal, agiram, ainda que não consigam evitar que seja o assunto que muito se falará durante a competição. Se Froome estiver no Tour, haverá sempre suspeição. Se não estiver, irá sempre continuar-se a falar dele e de toda esta confusão. Os restantes ciclistas que vão estar na corrida merecem mais. Merecem que se fale da corrida, da luta pela vitória...Mas vai ser tão difícil... Impossível, mesmo. O tema Froome estará sempre presente. Será o elefante no meio da sala.

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