23 de julho de 2018

Um Tour a intrometer-se na amizade entre Thomas e Froome

(Fotografia: Facebook Team Sky)
Amigos, amigos... Geraint Thomas e Chris Froome têm mantido a aparência de que tudo está bem entre eles e não há razões para acreditar que assim não seja. Porém, esta amizade de longa data irá sofrer um enorme teste numa altura em que Thomas é um justíssimo líder da Volta a França. Demonstra também ser quem está na melhor condição física. Froome é o ciclista que ganhou três grandes voltas consecutivas, que persegue a quarta, o que significará um quinto Tour. Froome é o líder da Sky e esta partilha assumida pela equipa está a tornar-se mais complicada para o britânico, do que o próprio poderia esperar. Podem dar-se muito bem, mas não há volta a dar: Froome terá de atacar Thomas se quer ganhar o seu quinto Tour. Esperar pelo contra-relógio poderá ser perigoso.

Tom Dumoulin (Sunweb) não pode ser excluído desta disputa (a 1:50) e Primoz Roglic (Lotto-Jumbo) não deve ser menosprezado (a 2:38 minutos de Thomas). As reviravoltas podem acontecer, com Mikel Landa (Movistar), por exemplo, a prometer tentar reentrar na luta nos Pirenéus (a 3:42). A etapa dos 65 quilómetros é uma autêntica incógnita. Porém, Thomas e Froome estão donos e senhores deste Tour.

A Sky escreveu uma história muito própria no ciclismo. Nesta Volta a França está a tentar acrescentar um capítulo que será praticamente inédito. Pode esta co-liderança funcionar? Os responsáveis da equipa estão a tentar fazer-se valer do pormenor importante: a amizade entre Thomas e Froome. Há muito que competem e treinam juntos, desde os tempos da Barloworld. Quando Geraint Thomas recebeu a oportunidade para liderar a equipa no Giro de 2016, Froome levou o galês para a África do Sul para os dois prepararem a Volta a Itália para Thomas, enquanto Froome pensava no Tour.

Tem sido comum ver os dois a conversarem durante esta Volta a França, mas manter esta aparente tranquilidade entre os ciclistas que estão melhor posicionados para disputar a corrida de três semanas que todos querem ganhar, pode tornar-se complicada agora que se aproximam as decisões.

"Pareceríamos muito estúpidos se corrêssemos um contra o outro", disse Thomas. A separar estão 1:39 minutos, uma diferença que tem de preocupar Froome. Recuperar tanto tempo no contra-relógio poderá ser difícil, pois Thomas também é um bom contra-relogista. Estamos então perante uma inevitabilidade: Froome tem de atacar se quiser ganhar esta Volta a França e juntar-se ao exclusivo grupo dos que a venceram por cinco vezes: Bernard Hinault, Eddy Merckx, Jacques Anquetil e Miguel Indurain.

Se atacar acaba-se o ambiente sereno. Se não atacar, arrisca-se seriamente a perder o Tour. O melhor para Froome e para a amizade seria Thomas ceder, mas até ao momento não houve um sinal de fraqueza e o galês ainda foi ganhar as duas principais etapas de montanha com chegada em alto, incluindo o mítico Alpe d'Huez (nem por "simpatia", nem por ordens de equipa Thomas vai entregar uma vitória na Volta a França).

Sendo Froome o número um, mesmo que se fale de uma co-liderança, não ajudar o companheiro não será uma surpresa. Faltará saber como agirão os restantes membros da Sky. Ficarão com Thomas  se este ceder ou será Froome quem reunirá a preferência? Se acontecer o contrário e for Froome a mostrar fraqueza, coloca-se a mesma questão quanto à forma de proceder da equipa. E ainda por cima há agora menos um homem importante no trabalho, com Gianni Moscon a manchar ainda mais a sua reputação ao ser expulso do Tour. O italiano agrediu Elie Gisbert da Fortuneo-Samsic, a 800 metros da meta, no doming.

O galês tem mantido o discurso de enorme respeito pelo amigo. Talvez a única vez que mostrou um pouco de outra face foi, há uns meses, quando afirmou que não queria continuar à espera das decisões de Froome para definir o seu próprio calendário (a propósito de quando o britânico escolheu o Giro, "bloqueando" o regresso de Thomas à corrida italiana). As recentes palavras de Thomas que só pensa no dia-a-dia e não ganhar o Tour, ou de Froome a dizer que desde que seja alguém da Sky a vencer, que está tudo bem... São bonitas, fica-lhes bem, mas convence pouca gente, ou talvez ninguém!

Se Froome atacar, Thomas terá de responder se quiser ficar com a amarela. Os sorrisos entre amigos podem esmorecer quando chegar o momento de decidir quem fica com o Tour até porque Thomas tem toda a razão: ou Dumoulin (ou outro ciclista) faz uma performance única - não precisa de ser ao nível de Froome em Bardonecchia, no Giro, mas anda lá perto -, ou então, perder a corrida poderá muito bem ser da responsabilidade de uma Sky, que está a apostar numa sempre perigosa co-liderança.

Os adversários estão à espera que os egos apareçam e que possam tirar partido disso. Dumoulin e Landa estão bem atentos a isso, com o espanhol a ter a vantagem de conhecer muito bem os antigos companheiros de equipa.

Noutras co-lideranças, Greg Lemond e Bernard Hinault foram tudo menos amigos, Alberto Contador e Lance Armstrong dividiram uma Astana ao meio, com o espanhol a sair por cima nesta rivalidade. Em duas semanas não se viu esta rivalidade entre Thomas e Froome, mas será difícil não vir ao de cima nas cinco etapas que faltam (exclui-se a de consagração no domingo).

Certo é que este está a ser o Tour mais interessante dos últimos anos. Apesar dos adversários já terem perdido o medo de atacar mais a Sky, a equipa britânica tem respondido de forma exímia às ameaças e esta luta interna está a ser um extra bem-vindo.

16ª etapa (terça-feira): Carcassonne - Bagnères-de-Luchon, 218 quilómetros

A semana começa com uma das etapas mais longas do Tour, antecedendo a mais esperada: a de 65 quilómetros. Quinta-feira será um dia apenas com duas quartas categorias, antes da última tirada de montanha na sexta-feira (e que dia poderá ser: duas quartas, uma segunda, uma primeira, duas especiais...). Portanto, três etapas para aqueles que se dizem candidatos para tentar chegar ao contra-relógio de sábado (31 quilómetros) com possibilidade de disputar o Tour.

E há que reiterar, que bom ter uma Volta a França ainda com pontos de interesse, mesmo que seja a Sky a controlar até ao momento.



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