28 de julho de 2018

Thomas deixou cair a máscara num ano que se espera ser de mudança para o Tour

(Fotografia: © ASO/Pauline Ballet)
"Isto é de doidos!" Talvez este seja um aspecto que todos concordam com Geraint Thomas. É uma vitória que se alguém tivesse dito no início da Volta a França que iria acontecer, se teria dito que era uma opinião de doidos! Mas aconteceu mesmo e foi do melhor que poderia ter acontecido ao Tour e à própria Sky. Thomas é um justíssimo vencedor. Foi o mais forte, não demonstrou fraqueza, tenha sido por nunca ter sido verdadeiramente testado, ou porque quando alguém tentou atacá-lo, rapidamente a superioridade do galês e da Sky ficou bem clara. Thomas sempre manteve uma postura muito britânica, sem deixar transparecer emoções. O discurso era cauteloso e de respeito para com Chris Froome. Quando acabou o contra-relógio deixou finalmente cair a máscara e nem conseguiu acabar a primeira entrevista como o vencedor da Volta a França.

Nos últimos dois anos Thomas tem reclamado uma oportunidade para liderar a toda poderosa Sky. Recebeu-a na Volta a Itália em 2017, mas uma queda devido a uma má paragem de uma moto da polícia, levou-o ao abandono. Prometeu regressar, mas Chris Froome decidiu ir ao Giro. Foi das poucas vezes que Thomas deixou escapar alguma emoção, não escondendo que não queria continuar dependente da decisões de Froome. Assumiu-se como co-líder da Sky para o Tour, mas nunca conseguiu convencer que era mesmo hipótese para ganhar a Volta a França.

Afinal Froome ultrapassou o caso do salbutamol e tinha estado fenomenal no Giro. Sem colocar em causa a harmonia da equipa, Thomas assumiu-se mesmo como o mais forte durante o Tour e com Froome a pagar a factura de ter estado em Itália, o galês agarrou com os mãos, pernas, com tudo o que tinha a uma oportunidade que poderia ser única se falhasse. Não só não falhou, como convenceu todos que é voltista. A amizade entre ambos terá mesmo funcionado a favor de uma sempre perigosa co-liderança, mas que desta vez funcionou (a Movistar não pode dizer o mesmo, por exemplo).

Curiosamente, ainda na sexta-feira, Thomas escolheu uma frase que marcou o início da era de Froome: "Os meus resultados irá resistir ao teste do tempo." Froome disse o mesmo quando ganhou o seu primeiro Tour, contudo, terá sempre uma suspeita a pairar sobre si, perante o que aconteceu na Vuelta. A Sky também, pelo que os seus ciclistas estarão sempre debaixo de olho. No entanto, todo o percurso de Thomas desde a pista, à estrada, de gregário a vencedor de corridas de uma semana e a confirmação que é um voltista de respeito, demonstra que o galês tinha capacidade para mais do que um papel secundário. E sim, merece todo o reconhecimento, sem que se esteja sempre a duvidar. Apuparam-no, tentaram empurrá-lo, questionaram-lhe constantemente se ia ajudar Froome ou se correr por ele e Thomas mostrou-se forte psicologicamente, aguentou uma enorme pressão. Também isso define um grande atleta.

Depois de neste domingo celebrar nos Campos Elísios, Thomas terá de definir o seu futuro. Todas as questões que foram sendo colocadas durante o Tour - se tinha capacidade para lutar pela vitória, se era mesmo líder... - foram respondidas a favor de Thomas, que venceu duas etapas, incluindo no mítico Alpe d'Huez. Falta agora responder a uma: irá renovar? A Sky quer manter este ciclista de 32 anos. Porém, quando Froome parecia estar relegado até do pódio, eis que o campeão reaparece no contra-relógio e deixa bem vincado que continua mais do que preparado para conquistar mais alguma (ou algumas) grandes voltas. 

Se Thomas renovar, vai querer continuar a apostar no Tour, mas Froome também o irá fazer em 2019, à procura do quinto triunfo. Esta foi uma co-liderança em que Thomas não deixava de ser um plano B. Mas vencendo, quer ser o A e aí sim, haverá um luta de egos que nem uma amizade poderá controlar.

Thomas poderá optar por mudar de equipa, na qual terá sempre outro desafio. Nenhuma lhe poderá oferecer um grupo tão forte de gregários como a Sky. Mas terá a liderança desejada, sem depender das escolhas de Froome e sem um Egan Bernal que não vai demorar muito a tornar-se também ele num líder.

Geraint Thomas quebrou uma hegemonia que se tornava quase monótona de ver Froome ganhar. Para o Tour foi excelente ver uma maior indefinição, mesmo que essa tenha vindo de dentro de uma Sky que pode não reunir a maior das admirações em França, mas já são seis Tours em sete anos. Mesmo para a equipa foi positivo ter o galês a vencer e assim evitar o prolongar polémicas em redor de um ciclista que está a precisar de ficar uns tempos mais discreto, para provavelmente ressurgir forte nos Mundiais.

Este Tour pode marcar uma mudança no que se tem visto nos últimos anos. Thomas não é nenhum jovem, mas pode ser mais um candidato a juntar-se a uma lista que garantidamente tem Tom Dumoulin (Sunweb) como um grande voltista, além do possível nascer de uma estrela chamada Primoz Roglic (Lotto-Jumbo). Mikel Landa (Movistar) esteve muito aquém do desejado, mas o melhor do espanhol há-de reaparecer e não vamos já afastar Romain Bardet (AG2R). O francês falhou depois de dois pódios consecutivos, mas é um ciclista que está ainda precisa de evoluir um pouco mais para atingir a consistência daqueles que este ano lutaram pelo Tour. Tem tudo para o conseguir.  Da geração de Thomas, fica a esperança de ainda se ver um último fôlego de Richie Porte, outro antigo gregário da Sky, que mostrava mais capacidade para se tornar líder do que Thomas, mas que não consegue escapar a azares.

A Volta a França foi das mais interessantes dos últimos anos, com várias etapas de apresentaram espectáculo e este conjunto de ciclistas, a que se podem a qualquer momento juntar uma juventude agora a surgir e que tem neste momento Egan Bernal como a figura máxima, pode ser decisiva para esta corrida recuperar o estatuto de ser a melhor de três semanas. Nas mais recentes edições foi batida constantemente por uma Vuelta e mesmo o Giro. Sim, a Sky controlou e pouco ou nada abanou, mesmo com a expulsão de Gianni Moscon. Porém, já praticamente todos não têm receio de tentar fazer frente.




21ª e última etapa da 105ª edição do Tour: Houilles - Paris Champs-Élysées, 116 quilómetros

Este domingo é dia de consagração e de conhecer quem vencerá nos Campos Elísios. Com quase todos os principais sprinters de fora e com um Peter Sagan limitado devido à queda na quarta-feira, serão muitos a tentar um último momento de glória, no palco mais sonhado pela maioria dos ciclistas.

No pódio estarão certamente Geraint Thomas, ladeado por Tom Dumoulin (que venceu o contra-relógio deste sábado - bateu Froome por um segundo e ficou a 1:51 de Thomas, que foi terceiro na etapa) e Chris Froome, que recuperou o terceiro lugar que Primoz Roglic lhe tinha tirado na sexta-feira (fica a 2:24 do colega de equipa). Peter Sagan (Bora-Hansgrohe) confirma a conquista da camisola verde dos pontos e iguala o recorde de Erik Zabel (seis), Julian Alaphilippe (Quick-Step Floors) é o rei da montanha e Pierre Latour (AG2R) venceu a classificação da juventude. Daniel Martin (UAE Team Emirates) foi considerado o supercombativo do Tour, enquanto a Movistar ganhou por equipas.

Pode ver aqui a classificação.



»»O renascer de uma equipa««

»»Froome "é humano", Thomas o mais forte, Bernal o futuro a pedir para se tornar no presente««

Sem comentários:

Enviar um comentário