12 de maio de 2019

"Isto é puro ciclismo"

Aos 18 anos, Diogo Barbosa é quase como qualquer outro ciclista da sua idade. Quase, porque a sua luta vai além de chegar ao mais alto nível da modalidade. Luta por uma identidade própria, que lhe permita sair da sombra do seu pai, uma referência do ciclismo nacional: Cândido Barbosa. O orgulho pelo pai é enorme e a influência que este tem na carreira de Diogo é inequívoca. No entanto, o jovem atleta procura o seu próprio sucesso e acaba por ter a sua favor, no que a comparações diz respeito, ter características um pouco diferentes do pai: "Ele diz que eu tenho as fibras rápidas como ele, mas sou um pouco mais completo. Não tenho tanta força como ele tinha. Tenho alguma, com o resto a ficar para a montanha."

É inevitável falar-se sobre Cândido, mas foi a primeira experiência no estrangeiro de Diogo que serviu de mote para a entrevista. O jovem ciclista não escondeu como a mudança para a equipa amadora, de sub-23, da Caja Rural foi inicialmente um pouco difícil. Contudo, é rápido em acrescentar como agora se sente muito feliz, desejoso de continuar a evoluir, de ter oportunidades de lutar por vitórias, além de trabalhar para outros colegas. "Ao início foi um pouco diferente do que estava habituado. Senti principalmente a nível de companheirismo. Era diferente daqui [em Portugal]. Não senti logo lá [o companheirismo], mas com o passar do tempo já estou a adaptar-me bem", garantiu ao Volta ao Ciclismo.

Não hesita também em expressar-se no plural, pois a seu lado estava outro português, Guilherme Mota, que também mudou-se para a Caja Rural neste primeiro ano de ambos como sub-23. Juntos vão integrando-se numa realidade que os deixa muito entusiasmados e que está longe da vivida em Portugal. "Há muitas diferenças. Isto é o puro ciclismo. Antes era uma brincadeira, por assim dizer. Agora aprendemos a trabalhar, a respeitar mais os colegas. É completamente diferente", salientou Diogo Barbosa. E acrescentou: "Temos 120 corridas e somos 19 corredores na equipa." Um panorama impensável para uma equipa sub-23 portuguesa.


"Avalio as minhas prestações como boas e muito boas. Estou a deixar os directores contentes e não posso pedir mais"

Perguntar se quer continuar por Espanha foi quase desnecessário: "Sim, quero continuar. Voltar a Portugal? Estando lá fora e voltar para vir para pior, não compensa. Se estou lá, é para continuar ou subir para melhor", referiu, querendo, como tantos outros jovens ciclistas, chegar ao World Tour. Ao pensar se tivesse ficado pelo seu país, Barbosa admite que "se calhar teria mais oportunidades" para se destacar. No entanto, prefere que a oportunidade seja estar "numa das melhores equipas de sub-23 do mundo" e assim "aprender a trabalhar". "Nesta primeira fase do ciclismo, isso é o mais importante. Aqui [na Caja Rural] somos todos muito bons e temos de trabalhar uns para os outros", disse.

Como ambicioso que é, poder tentar ganhar uma corrida neste seu primeiro ano na Caja Rural seria especial. Contudo, mantém-se fiel ao discurso que quer aprender, trabalhar para os líderes e depois, um dia, pensar em ser ele a figura principal. "Nesta primeira fase pedem-me para aprender e trabalhar ao máximo para que os meus colegas possam obter os melhores resultados. Com o desenvolver da época podem colocar alguma pressão, mas agora é trabalhar e é o que faço. Nunca desisto. Vou até ao fim. Desistir nunca foi palavra para mim." E não realçou de imediato: "Estou feliz. Estou a lutar por aquilo que quero."

Recentemente, Diogo Barbosa voltou a competir em Portugal, na Clássica Aldeias do Xisto, mas o seu calendário incluiu, até ao momento, corridas também em França, além, claro, de em Espanha. "Avalio as minhas prestações como boas e muito boas. Estou a fazer o que me pedem e estou a ter bons resultados. Estou a deixar os directores contentes e não posso pedir mais", afirmou.

Não sendo um ciclista com todas as mesmas características do pai, agora que está na categoria de sub-23, Diogo vai percebendo cada vez melhor que tipo de corredor é e em que direcção pode evoluir mais: "Faço de tudo um pouco. Sinto-me bem a subir, mas acho que sou explosivo, mais rápido. Se calhar numa montanha de primeira categoria ou categoria especial posso passar com mais dificuldades, mas passo bem outras subidas."

A influência de Cândido Barbosa

Não é fácil ouvir-se falar de Diogo sem que se oiça de imediato dizer de quem é filho. Quer afirmar-se por mérito próprio, mas não esconde como recorre ao pai para conselhos antes de qualquer outra pessoa, frisando como recebe todo o seu apoio, mas... "Ele não queria que eu fosse ciclista. Ele já passou por elas, sabe que é muito duro e que se corre vários perigos. Mas disse-me se eu fosse ciclista que me apoiaria em tudo e é o que está a fazer. Não me mete pressão, diz para eu aprender."


"Chegar ao ponto que o meu pai chegou, vencer as etapas que ele venceu... Não é fácil para ninguém"

Cândido teve a sua influência na ida para a Caja Rural do filho. "No ano passado realizei duas corridas em Espanha por uma equipa de juniores de lá. Fiz a Volta a Pamplona e uma clássica. Em Pamplona fiz quarto na geral e lutei por etapas. Na última fui segundo. Depois surgiu o convite da Caja Rural e de mais duas formações de Espanha. O meu pai é amigo do dono da equipa. Quando ele soube quem eu era, já não deixou que eu assinasse por outra formação", contou. E Diogo nem hesitou em aceitar o convite. "Estar aqui é o reconhecimento do que tenho vindo a fazer", disse o ciclista, que esteve nos juniores da Vito-Feirense-BlackJack.

A Cândido Barbosa chamavam-lhe o Foguete da Rebordosa, alcunha ganha pela forma como se impunha ao sprint. Conquistou 25 etapas na Volta a Portugal, mais 16 na Volta ao Algarve, além de duas classificações gerais, isto só para nomear algumas das mais importantes vitórias. Tentou transformar-se num ciclista para ganhar a Grandíssima, mas esse foi um sonho que não concretizou. Representou algumas das principais equipas nacionais e chegou ao nível mais alto do ciclismo na toda poderosa Banesto (actual Movistar). O legado é grande e o peso faz-se sentir. "Estão a pôr-me pressão [ao dizer sempre de quem é filho]. Tenho uma carga às costas para transportar e não é fácil. Chegar ao ponto que o meu pai chegou, vencer as etapas que ele venceu... Não é fácil para ninguém", desabafou, confessando que mexe um pouco com ele.

É por isso que o seu objectivo passa por conquistar o seu espaço, a sua identidade, construir a sua carreira de forma a não ser constantemente referido como filho de Cândido Barbosa. Mas claro, quer fazê-lo tendo o pai a seu lado, num apoio familiar que realça ser muito importante: "É um orgulho ser filho dele. É um ídolo."

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