25 de maio de 2019

Movistar e a pergunta do costume: afinal quem é o líder?

Carapaz está de rosa, mas não significa que Landa não continue a querer
ficar com essa camisola (Fotografia: Giro d'Italia)
Numa fase do Giro em que está a ser de "baralha e voltar a dar" todos os dias, a 14ª etapa deu outro ênfase à eterna questão que envolve a Movistar: quem é o líder? Até agora ter Mikel Landa e Richard Carapaz a lutar por esse estatuto não teve consequências nefastas, principalmente porque o espanhol perdeu muito tempo logo de início. Mesmo com Carapaz a ter vencido uma etapa e a estar na frente do companheiro na geral, cada um tem tido a oportunidade de fazer a sua corrida, com o apoio dos restantes ciclistas a estar do lado de Landa. Contudo, Carapaz não tem precisado de ninguém para estar a realizar um excelente Giro. Porém, tudo pode mudar agora que o equatoriano está com a camisola rosa.

Não era bem o objectivo de Carapaz quando atacou na segunda primeira categoria de um dia muito complicado. Foram apenas 131 quilómetros, mas com duas primeiras, duas segundas e uma terceira categoria para acabar, entre Saint-Vincent e Courmayeur. O equatoriano foi à procura de mais uma vitória de etapa e de ganhar tempo. Saiu-lhe um belo bónus.

Além de espectáculo, esta fase de alta montanha da Volta a Itália está a ser marcada por muito sentido táctico. Carapaz está de rosa pelo excelente trabalho que realizou, mas também porque Primoz Roglic não a quis vestir.

Antes de mais, de salientar que Carapaz fez mais um pouco de história. Há um ano foi o primeiro equatoriano a ganhar uma etapa numa grande volta, em 2019 torna-se no primeiro a liderar uma corrida de três semanas, além de ter já duas tiradas na presente edição do Giro. Mas vamos então falar de tácticas.

Na Movistar há que repensar a liberdade dada aos dois ciclistas. O discurso continua a ser que Landa e Carapaz são os líderes. Landa até disse que agora é o momento de defender a rosa, mas também não se afastou da luta por vencer a Volta a Itália... São 2:50 minutos que o separam do companheiro. O espanhol tem vindo sempre a melhorar e depois de dois dias intensos, hoje foi altura de recuperar um pouco de forças. Compreensível.

Esta é uma história que se tem repetido em tempos recentes na Movistar. Desde que Nairo Quintana não conseguiu ser o ciclista ganhador que se esperava no Tour que tem sido o assalto ao papel de líder. O exemplo mais recente foi a aposta no tridente Quintana/Valverde/Landa na Volta a França e que dificilmente poderia ter corrido pior.

Mas ainda antes da contratação de Landa esta divisão já se tinha verificado: Valverde/Quintana ou até Valverde/Andrey Amador em 2016. Foi precisamente no Giro que o ciclista da Costa Rica pediu uma oportunidade depois de boas exibições em anos anteriores. A partilha com Valverde cedo se percebeu que era mais só de falar em voz alta do que na prática. O espanhol foi terceiro. A Movistar com divisões não tem conseguido ganhar.

Carapaz só tem sete segundos de vantagem para Roglic. Precisa de ganhar mais tempo devido ao contra-relógio. Porém, o seu problema não será apenas o esloveno. Passa a ser um alvo a abater, pois o equatoriano é um candidato à vitória, ao contrário de Jan Polanc ou Valerio Conti (a senda da UAE Team Emirates chegou ao fim).

Seria estranho ver uma equipa não ajudar o seu líder de rosa, mas já não será estranho ver Mikel Landa continuar a ter um papel livre de responsabilidade, que não seja a pensar nele. O espanhol não é ciclista para agora vestir novamente a pele de gregário, o que poderá ser um ponto negativo na Movistar. Contudo, também poderá haver um jogo duplo, com a Movistar a tentar jogar com os seus dois líderes, ainda que se Carapaz demonstrar que tem mesmo capacidade para segurar a camisola rosa, até quando vão os responsáveis adiar a tomada de decisão drástica que não deixará Landa nada satisfeito.

Mas lá está, num Giro de "baralha e volta a dar", o melhor é ir vivendo e pensando dia-a-dia.

➤ O "casal maravilha" continua juntinho e até um pouco mais unido do que na sexta-feira. Primoz Roglic e Vincenzo Nibali não se largaram, mas desta vez o esloveno até saiu de quando em vez da roda do italiano. O jogo táctico da Bahrain-Merida previa que Roglic vestisse novamente a camisola rosa para tentar obrigar o ciclista a assumir mais a corrida. Já Roglic agradeceu o ataque de Carapaz e não se chateou nada com o equatoriano subir à liderança. Para Roglic está tudo controlado, pois já se sabe que no seu pensamento está que poderá recuperar distâncias no contra-relógio, ainda mais de apenas sete segundos.

Se estas três etapas foram difíceis, atenção que vem pior na próxima semana. Infelizmente a passagem pelo Passo Gavia estará prestes a ser cortada do percurso devido à neve acumulada e risco de avalanche. Mas não significa que Roglic possa respirar fundo. A sua passividade, preferindo marcar Nibali, fez com que outros rivais se aproximassem. O esloveno ainda não foi testado seriamente dada a vantagem que tinha, mas não transmite confiança nenhuma ver como a Jumbo-Visma se desfaz mal o ritmo acelera na frente. Na Bahrain-Merida, ou Domenico Pozzovivo ou Damiano Caruso têm conseguido dar uma ajuda a Nibali.

Para Roglic será bom se acontecer o que se tem visto: quase todos os líderes ficam sozinhos muito cedo. No um contra um, o esloveno terá mais hipóteses se os ataques começarem a ser mais complicados de controlar.

E que não se duvide, há muito ataque ainda pela frente, mesmo que as forças estejam a ficar mais reduzidas. Até Simon Yates (Mitchelton-Scott) apareceu. Não convenceu muito, mas o segundo lugar na etapa poderá dar-lhe ânimo. Miguel Ángel López (Astana) também não está disposto a desistir, com Rafal Majka (Bora-Hansgrohe) a tanto mostrar que afinal vai quebrar, mas depois volta a aparecer bem.

➤ Depois há um Bauke Mollema (Trek-Segafredo) e um Ilnur Zakarin (Katusha-Alpecin) que é melhor não elogiar em demasia. O holandês, naquele estilo muito típico de pedalar um pouco "às cabeçadas", conseguiu minimizar estragos e o pódio ainda continua na mira. Já o russo, foi espectacular num dia, ganhou a etapa e 24 horas foi o colapso total: de terceiro caiu para 11º, a 6:04 de Carapaz. Ambos pagaram o esforço da etapa em que foram figuras. E já se sabe, numa grande volta a recuperação é parte importante da chave do sucesso.

Quanto a Amaro Antunes (CCC) perdeu mais de 29 minutos, estando a 50:21. Fica-se à espera de ver o português ao ataque, assim que as pernas o permitam.

Classificações completas, via ProCyclingStats.

15ª etapa (26 de Maio): Ivrea - Como, 232 quilómetros


Regresso das maratonas. Com o cansaço a ser difícil de esconder, segunda-feira é dia de descanso, pelo que poderá haver uma etapa animada. Com duas segundas categorias e uma terceira, antes da descida final, será uma etapa ao estilo Lombardia, já que são subidas conhecidas do monumento italiano que Vincenzo Nibali já venceu duas vezes. Sem surpresa, muitas das atenções vão estar centradas no ciclista da Bahrain-Merida.

Apesar do dia ser longo, as dificuldades surgirão nos últimos 90 quilómetros, pelo que poderão verificar-se mais uns testes a Roglic, mas agora também a Carapaz. É um bom dia para alguns corredores tentarem fazer singrar uma fuga, enquanto no grupo de favoritos se discute a geral. Como os dois sprints intermédios surgem antes da subida, será um dia para ver também a luta particular entre Arnaud Démare (Groupama-FDJ) e Pascal Ackermann (Bora-Hansgrohe) pela camisola ciclamino. O francês tem 11 pontos de vantagem.




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