16 de dezembro de 2018

A aposta falhada num trio que não foi maravilha

(Fotografia: Facebook Movistar Team)
Quem tudo quer, tudo perde. É o primeiro pensamento quando se fala da Movistar de 2018. Por um lado houve um Alejandro Valverde irresistível, que finalmente se sagrou campeão do mundo. Houve ainda um Richard Carapaz a mostrar que podem contar com ele para começar a pensar em discutir algo mais nas grandes voltas e um Marc Soler a deixar bem claro que não pode ficar na sombra do tridente líder durante muito mais tempo. Por outro, esse mesmo tridente falhou por completo na Volta a França e na Vuelta, esta sem Mikel Landa, acabou por também ver escapar quase todos os objectivos. No caso da Movistar há que separar a época em duas partes: a que correu bem, com boas vitórias e a que foi uma tremenda decepção em quem apostou tudo em ganhar o Tour e nem na Vuelta se salvou.

E se este último aspecto marcou e muito a temporada da equipa espanhola, é mais do que justo começar com um Valverde que, aos 38 anos, continua a ganhar como poucos (14 triunfos e só em 2004 venceu mais, 15), com Innsbruck a ser o palco do título que lhe faltava: o mundial. Valverde está de arco-íris vestido e até o tricampeão mundial Peter Sagan considerou que a camisola ficou bem entregue... por um ano, claro! Curiosamente foi um 2018 pouco feliz nas clássicas das Ardenas que tanto gosta, mas o espanhol foi experimentar o pavé para preparar a etapa do Tour neste terreno e deu-se bem. Em 2019 vai estrear-se na Volta a Flandres.

Da nova geração, Richard Carapaz tornou-se no primeiro equatoriano a ganhar uma etapa numa grande volta, no Giro, mas, mais importante, tornou-se num ciclista que a Movistar sabe poder apostar mais, tal como Marc Soler, que conquistou brilhantemente o Paris-Nice. O problema de ambos é a equipa ter Nairo Quintana e Mikel Landa, além de Valverde. Se este último acaba por não ser o maior impedimento aos dois jovens poderem afirmar-se como líderes - tanto pela idade, como pelos objectivos -, já Quintana e Landa não vão ceder o seu estatuto. A não ser que saiam.

Apesar da tentativa de mostrar que o ambiente era de união, no Tour a aposta no tridente acabou por não ser significado de equipa forte, mas de ter ciclistas com os mesmos planos, o que também não ajudou no trabalho de quem teve de ajudar. Quintana até ganhou uma etapa, mas Landa também andou à procura de uma e ambos queriam discutir o pódio, ainda que tiveram de se contentar com um top dez. Mas para a Movistar foi uma derrota.

Valverde guardou forças para a Vuelta. Landa ficou de fora devido a lesão, após uma queda, senão lá iria novamente o tridente. Quintana esteve presente e teve de se render ao facto do companheiro estar mais forte, com Valverde a estar na discussão da vitória até às últimas montanhas, quando cedeu por completo. Houve uma ajuda pouco convincente do colombiano, mas houve mais a certeza que Nairo Quintana não está confortável com a situação actual na Movistar e há pouco tempo foi bem claro ao dizer que não gosta que existam três líderes. A relação com Eusebio Unzué continua a parecer cada vez mais distante, algo que se foi agravando desde que o colombiano fez o Giro e o Tour em 2017, numa aposta que não resultou.

Ranking: 8º (7351 pontos)
Vitórias: 26 (incluindo uma etapa no Giro e no Tour e duas na Vuelta)
Ciclista com mais triunfos: Alejandro Valverde (14 - o título mundial foi ao serviço da selecção)


Se Valverde - que falhou o pódio na Vuelta, mas venceu duas etapas - só sai da equipa se decidir retirar-se. Já Quintana e Landa estão ambos no mercado em 2019, pois os seus contratos terminam no final da próxima temporada. O espanhol já avisou que tudo é possível quanto ao seu futuro e pretendentes não faltam. Quintana também tem interessados, mas o que fizer em 2019 no Tour - será a sua principal aposta -, poderá ser decisivo para escolher o seu destino, seja ficar ou mudar de ares. Landa abriu as portas de um regresso ao Giro, pois se quer ganhar em França, quer ainda mais conquistar finalmente uma grande volta e sempre gostou de Itália. Será interessante ver o tridente separado. Talvez "espalhar" as forças possa dar resultados mais positivos, pois sempre se evita choques de egos.

Carlos Betancur recebeu provavelmente a última oportunidade de se mostrar numa grande volta. Contudo, foi completamente ultrapassado por Carapaz no Giro e um possível renascimento do colombiano já terá de ser mais dedicado ao trabalho de gregário. Também Andrey Amador está mais dedicado a esse papel, agora que, além dos líderes, tem os jovens talentos a afirmarem-se e a taparem-lhe maiores oportunidades. Mas Amador é um gregário de luxo quando surge em forma. Rafael Valls não teve um regresso feliz a Espanha e Jaime Rosón, outro jovem que a Movistar queria apostar e que foi buscar à Caja Rural, está suspenso.

Foi detectada uma anomalia no seu passaporte biológico, ainda do tempo da sua anterior equipa. Tinha ganho a Volta a Aragão e ambicionava a estar pelo menos na Vuelta. Agora nem faz parte dos planos da Movistar para 2019 e corre o risco de sofrer uma suspensão pesada.

Quanto aos portugueses, o Paris-Roubaix foi pelo terceiro ano consecutivo maldito para Nelson Oliveira. Nova queda grave, ainda que desta feita tenha conseguido recuperar a forma a tempo de estar no Tour. Ou assim esperava. No entanto, ficou de fora das escolhas e foi antes à Vuelta, onde cumpriu à risca o seu papel, como sempre, tendo ainda deixado boas indicações nos contra-relógios, com um quarto e um sétimo lugar. Foi aos Mundiais fazer quinto. A merecida medalha continua a escapar! E também merece que possa ir cada vez mais a fundo para tentar ganhar um contra-relógio numa grande corrida... numa grande volta!

Nelson Oliveira gosta do Paris-Roubaix e da Volta a Flandres, nesta última costuma normalmente estar melhor. A ver vamos se em 2019 ou fica fora de Roubaix, ou o monumento francês deixa de ser um marco negativo na época do português.

O compatriota Nuno Bico teve mais uma temporada complicada. Começou forte na Austrália, mas logo caiu, o que até lhe valeu o prémio de mais combativo numa etapa do Tour Down Under, pois prosseguiu até ao fim, mesmo com os ferimentos bem visíveis. Bico não conseguiu nestes dois anos na Movistar estabilizar a nível de resultados de qualidade e vai agora prosseguir a sua carreira numa equipa do escalão Profissional Continental, a Burgos-BH, onde terá outro tipo de pressão, de responsabilidade e principalmente mais espaço para evoluir. Dar um passo atrás é, muitas vezes, uma decisão difícil, mas acertada.

Para 2019, a Movistar terá novamente de tentar lidar com os egos de líderes que já se percebeu que não estão muito disponíveis para ajudar, se assim tiver de ser. Não serão muitas as mudanças, com a equipa a reforçar o bloco das clássicas com Jurgen Roelandts (BMC) e a dar uma oportunidade de Carlos Verona confirmar as expectativas depois de uma passagem menos feliz pela Mitchelton-Scott. Da Euskadi-Murias chega um Eduard Prades que, aos 31 anos, terá a sua oportunidade no World Tour, depois de esta época ter vencido a Volta à Turquia. É um ciclista que esteve em Portugal, na então OFM-Quinta da Lixa, actual W52-FC Porto. Da Caja Rural chega Luís Mas, que acabou por ser o melhor da equipa numa Vuelta aquém do esperado da formação e que aos 29 anos também fará a estreia na categoria mais alta do ciclismo.

Os anos passam e a Movistar não consegue quebrar o domínio da Sky no Tour e Quintana tem estado longe de repetir em França as exibições que lhe valeram um Giro e uma Vuelta. A pressão é grande, a ambição é ainda maior, ter vários ciclistas que só querem ser líderes está a revelar-se um calcanhar de Aquiles.

No entanto, 2018 termina com uma boa notícia. A Movistar anunciou que vai prolongar o seu patrocínio até 2021, ou seja, vão ultrapassar a década de apoio à equipa espanhola, que começou em 2011, substituindo então a Caisse d'Espargne. A história desta estrutura remonta à década de 80, não esquecendo que foi a muito popular Banesto, dos tempos de Miguel Indurain.

Permanências: Alejandro Valverde, Nairo Quintana, Mikel Landa, Richard Carapaz, Marc Soler, Andrey Amador, Winner Anacona, Nelson Oliveira, Jorge Arcas, Carlos Barbero, Daniele Bennati, Carlos Betancur, Héctor Carretero, Jaime Castrillo, Imanol Erviti, Rubén Fernández, Antonio Pedrero, José Joaquín Rojas, Eduardo Sepúlveda, Jasha Sütterlin e Rafael Valls.

Contratações: Jurgen Roelandts (BMC), Carlos Verona (Mitchelton-Scott), Eduard Prades (Euskadi-Murias) e Luís Mas (Caja Rural).

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