16 de fevereiro de 2018

Um contra-relógio visto no carro da Wanty-Groupe Gobert

Em fila. Assim se aguarda pela vez de Tom Devriendt partir para o contra-relógio dentro do carro da sua equipa. Nada de nervosismo, pois o belga de 26 anos não tem pretensões à Volta ao Algarve, nem é um especialista, ainda que se defenda no contra-relógio. Frederik Veuchelen tenta perceber se está no lugar certo. O antigo ciclista da Wanty-Groupe Gobert é agora preparador físico da equipa belga e vai ao volante. Afinal tem de se chegar à frente. No carro vai ainda o médico, Simon Verdonck e um ilustre convidado: Hugo Sabido, vencedor da Volta ao Algarve em 2005. Ficou de imediato o aviso que se estava presente alguém que conhece bem a corrida e também um mote para a conversa. Tinha chegado a altura de se ver em primeira mão como é um contra-relógio visto de dentro.

Devriendt teve ordens para ir a fundo, afinal a Wanty-Groupe Gobert - equipa que estará na Volta a França - trouxe ao Algarve um grupo de ciclistas que tem como objectivo as clássicas que se aproximam. "O tempo aqui é fantástico. Quando cá chegámos até apanhámos um choque de calor", confessou Verdonck, recordando que na Bélgica a realidade meteorológica é bem diferente e muito pouco simpática. Contudo, não se podem habituar, já que na próxima semana estarão de regresso! Entretanto, Devriendt pedala vigorosamente. Veuchelen aproxima-se para o motivar e Sabido grava tudo. Transmitiu em directo no Facebook e fez com outra câmara a gravação para entregar ao ciclista, que queria ver como se tinha comportado.

O percurso é sinuoso. Curvas contra curvas, duas rampas pouco simpáticas, acelerações e desacelerações que fazem sofrer quem vai no carro. Ficar no lugar nem sempre foi fácil! "Bom circuito", comenta Veuchelen, sobre o percurso de 20,3 quilómetros de Lagoa. Vão saindo uma buzinadelas e não é para animar o ciclista, é uma forma de ajudá-lo a perceber que vai fazer uma curva mais perigosa ou entrar numa zona mais complicada.

Devriendt parecia voar, pelo menos na perspectiva de quem vai no carro. De vez em quando, quase parecia que Veuchelen queria empurrar o ciclista, tal era a proximidade que ficava da roda traseira. Ilusão de óptica talvez... Já Mickael Delage (FDJ) à frente não era ilusão. O belga pareceu ganhar alento e lá foi ele passar um ciclista que tinha partido um minuto antes. Delage foi mantendo o adversário à vista e olhando para trás no carro, lá vinha ele bem próximo, mas sem desrespeitar as regras. Aqui entra a destreza que é necessário ter quando se conduz um carro de equipa. Nas curvas, nas rotundas, Delage ganhava vantagem por estar de bicicleta e Veuchelen nunca atrapalhou. Pequenos pormenores que fazem toda a diferença, mesmo que o francês não estivesse propriamente preocupado em fazer um grande tempo.


Devriendt mostra os seus números a Sabido
Sabido pode mesmo dar bons conselhos. Foi ele quem perguntou sobre que pedaleira estava Devriendt a utilizar. Era a 55. "Eu teria usado a 56", diz o português. "Aqui?", quer confirmar Verdonck. "Sim", garante Sabido. O belga era o primeiro da equipa a partir, ainda faltavam os restantes... Ficou a dica.

Os quilómetros aproximam-se do fim, mas ainda houve tempo para deixar o jovem Rafael Lourenço (Liberty Seguros-Carglass) para trás a grande velocidade. Mais uns abanões no carro pelas curvas apertadas e nem uma das rodas resistiu e caiu na bagageira. Devriendt leva um último incentivo para levar a sua bicicleta Cube ao máximo. Foi preciso esperar bastante até saber o resultado final, mas 55º lugar, a 2:09 de Geraint Thomas é um resultado bem positivo para quem partiu sem pretensões.

Ao sair-se do carro só se pode pensar numa coisa: como será viver um contra-relógio decisivo numa grande volta? Não é difícil perceber como deve ser algo muito intenso, principalmente depois de uma experiência que para quem gosta de ciclismo foi única. 

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