10 de setembro de 2017

Os mais e menos desta sensacional Vuelta

O pódio da 72ª edição da Vuelta: Zakarin (3º), Froome (1º) e Nibali (2º)
(Fotografia: Unipublic/Photogomez Sport)
É verdade que já se repetiu aqui várias vezes a "sensacional Vuelta", ou "fenomenal Vuelta". Mas foi e há que sublinhar isso mesmo. Com um Giro interessante, mas não tão espectacular como em anos anteriores e com uma Volta a França, mais emotiva do que tem sido normal, mas ainda assim a pecar por ter um percurso conservador, esta Vuelta foi uma corrida de três semanas de fazer os adeptos de ciclismo ficarem sentados quase da primeira à última etapa sem grandes momentos para se bocejar! Chegou ao fim e podemos começar a pensar no final de temporada, com os Mundiais e a Lombardia como principais destaques. Mas antes fica aqui os mais e menos de uma Vuelta de emoções fortes.

Os mais...

Chris Froome, claro. É o primeiro ciclista a fazer a dobradinha Tour/Vuelta desde que as corridas estão no actual calendário. Depois de três segundos lugares, finalmente a vitória e com uma demonstração do poderio que nos habituámos a ver no Tour e que este ano tinha sido colocado em causa. Venceu duas etapas (uma foi o contra-relógio) e vestiu a camisola vermelha na terceira etapa e nunca mais a tirou. A Sky também esteve em grande nível, depois de há um ano ter falhado perante o seu líder na Vuelta. Wout Poels foi imperial, Gianni Moscon uma confirmação que é mais um homem preparado para servir a Sky nas grandes voltas.

Alberto Contador. Começou tão mal esta Vuelta que se chegou a temer que a despedida seria marcada por um abandono. Afinal, a má etapa de Andorra tinha sido devido a um problema de saúde. Recuperou e foi espectáculo atrás de espectáculo. Custou, mas ganhou uma etapa e logo no Angliru. É o primeiro ciclista a vencer duas vezes nesta mítica subida. Faltou-lhe o pódio na hora do adeus, mas deixou uma marca tão profunda nesta Volta a Espanha, que garantiu que será lembrado por mais uma grande corrida que fez, independentemente do quarto lugar. E que bonita foi aquela entrada em Madrid, com o pelotão a deixar-se ficar para trás, deixando Contador receber uma enorme ovação pelas ruas da sua cidade. Mais um pormenor: salvou a Espanha de não ter nenhum ciclista seu a vencer em casa, algo que só aconteceu em 1996.

Ilnur Zakarin e Wilco Kelderman. O russo da Katusha-Alpecin consegue o seu primeiro pódio numa grande volta. A aposta de José Azevedo começa a render, depois do quinto lugar no Giro. A concorrência era bem mais feroz na Vuelta e apesar de um início pouco convincente, Zakarin terminou em grande e a dizer que está pronto para um maior desafio em 2018: o Tour. Quanto ao holandês da Sunweb, depois de ter sido o homem de confiança que Tom Dumoulin perdeu no incidente com a moto no Giro, agarrou com tudo o que tinha a oportunidade de liderar uma grande volta. Acabou por cair de terceiro para quinto lugar no Angliru, mas ainda assim são mais os aspectos positivos a tirar do que os negativos. Demonstrou que a Sunweb tinha razão em mandar para casa um Warren Barguil a querer ser a estrela e não um homem de equipa. A ver vamos o que reserva a Kelderman em 2018, sendo certo que não irá livrar-se de ajudar Dumoulin, mas a merecer nova oportunidade como líder.

Michael Woods. É a surpresa no top dez. Aos 30 anos fez a sua melhor corrida, naquela que foi apenas a sua segunda grande volta. Brilhante sétimo lugar do canadiano que pouco se falou até hoje, mas que agora fica-se a pensar se tem mais para mostrar ou se apenas garantiu um lugar na equipa para 2018, no apoio a Rigoberto Uran. Pode já ter aparecido tarde, mas serão três semanas marcantes na carreira de um ciclista que normalmente mostra-se em provas de uma semana nos EUA, ou nas clássicas. Por curiosidade, Woods ganhou em 2015 a Clássica Internacional de Loulé. A Cannondale-Drapac colocou ainda Davide Villella como o rei da montanha, num ano muito positivo nas provas de três semanas, mesmo com a ameaça de ser o fim da linha da formação, algo já confirmado que não irá acontecer.

Miguel Ángel López. O Super-Homem do ciclismo está de regresso. Foi um ano penoso depois no final de 2016 ter sofrido uma queda grave num treino, na qual fracturou a perna. A confirmação do seu talento para as três semanas não aconteceu na Vuelta de 2016 (também caiu e abandonou depois de ter vencido nesse ano a Volta a Suíça), surgiu nesta, com duas vitórias de etapa e o oitavo posto na geral. Foi o melhor ciclista da Astana, que tinha Fabio Aru como líder. É um ciclista com um futuro muito (mesmo muito) promissor.

Os caçadores de etapas. Matteo Trentin (quatro) e Tomasz Marczynski (duas) foram os ciclistas que repetiram vitórias na Vuelta, além de López e Froome. Para o italiano foi o passaporte para o grupo de corredores que conquistaram tiradas nas três grandes voltas, enquanto o polaco estreou-se a vencer nestas corridas. Trentin venceu em Madrid, mas falhou a camisola verde porque, ao contrário do que se esperava, Froome foi sprintar e garantiu por dois pontos essa classificação. Ainda assim, para o italiano e para a Quick-Step Floors foi um saldo muito positivo. A equipa belga sai da Vuelta com seis vitórias, mais uma do que as conquistas no Giro e no Tour. Que época tremenda! Mas Marczynski contribuiu também para a Lotto Soudal ter razões para sorrir depois de um Tour em que ficou a zero. Armée Sander e Thomas de Gendt também venceram para a equipa. O belga juntou-se a Trentin como o vencedor nas três grandes.

A Aqua Blue Sport foi a única equipa das que receberam um convite para a Vuelta a conquistar uma vitória de etapa. A formação irlandesa - que conta com o massagista português Pedro Claudino - tentou ao sprint com o campeão inglês em 2016 Adam Blythe e integrou algumas fugas. Foi assim que conseguiu um triunfo por intermédio do austríaco Stefan Denifl. Foi uma vitória de extrema importância para uma formação a cumprir o seu primeiro ano de existência e a justificar um convite que surpreendeu muitos. Cofidis, Manzana Postobón e a formação da casa, Caja Rural, não conseguiram o mesmo protagonismo.

Os menos...

Começando pelas outras promessas além de López. As atenções eram muito sobre as espanholas e foi Marc Soler quem mais se mostrou. O jovem de 23 anos entrou em fugas e esteve muito activo na Vuelta, mas não foi recompensado nem com uma vitória de etapa, nem com uma classificação na geral digna de nota (perdeu mais de duas horas). Ganhou experiência o que poderá ser importante para o futuro, já que é um ciclista muito novo. O mesmo acontece com Jaime Rosón. Esteve um pouco melhor, mas o reforço da Movistar para 2017 - actualmente na Caja Rural - não se viu muito e acabou com mais de uma hora de atraso. Mais um caso em que se pode dizer que ganhou experiência.

Há ainda Rubén Fernández e David de la Cruz. O primeiro, da Movistar, deu tanto espectáculo há um ano e neste... praticamente nada. O segundo, da Quick-Step Floors e de malas feitas para a Sky, mostrou debilidades sempre que as dificuldades montanhosas mais complicadas apareceram. Quando se queria mostrar para garantir pelo menos um top dez, caiu antes de chegar ao Angliru e abandonou. Esperava-se mais e melhor dos dois.

Já se falou de dois ciclistas da Movistar, mas se há um grande menos nesta Vuelta é a equipa espanhola. Orfã de um líder (Nairo Quintana fez o Giro e o Tour e Alejandro Valverde está a recuperar de uma grave queda na Volta a França), a oportunidade dada aos ciclistas mais novos não deu frutos, pelos menos nesta Vuelta. Aposta para o futuro dirá o director desportivo Eusebio Unzué. Também não ajudou Carlos Betancur desistir após uma queda, ele que até parecia estar de facto bem fisicamente. Mas para uma equipa espanhol, a única do World Tour, com um patrocinador tão exigente que nem deixa que o campeão espanhol utilize uma camisola que o identifique claramente como tal, ter o melhor classificado na 36ª posição a 1:43.45 horas (Richard Carapaz)... Não há razões para sorrir. E nem uma etapa foi ganha pela Movistar. Volta para esquecer da equipa de Nelson Oliveira.

Destacam-se pela negativa mais duas equipas. A BMC que começou por vestir a vermelha e tentar disputar a geral primeiro com Rohan Dennis (mais uma vez não acabou uma grande volta) e depois com Nicholas Roche que foi um descalabro depois de sonhar com o pódio. Salvou-se o top dez de Tejay van Garderen, "oferecido" por Fabio Aru no Angliru. A Orica-Scott apostou forte com Johan Esteban Chaves e os gémeos Yates. Adam e Simon foram uma tremenda desilusão. Talento não lhes falta, mas está a faltar algo para começarem finalmente a discutir grandes voltas, além das classificações da juventude. Quanto a Chaves, foi ao Tour para ganhar ritmo depois de meio ano perdido a recuperar de uma lesão no joelho. Apareceu bem na Vuelta, mas não na apresentada há um ano, que lhe valeu o pódio. Com um contra-relógio de 40 quilómetros foi impossível lutar por resultado idêntico. Apesar de no início ser o colombiano o único que não largava Froome, quebrou e terminou fora do top dez. Mesmo com alguns problemas na montanha, que revelam que ainda não está a 100%, tem de melhorar no contra-relógio se quer aspirar a algo mais.

Já aqui se falou de Fabio Aru. O que dizer de um ciclista que perdeu 15 minutos no Angliru? Terminou o Tour doente e não conseguiu estar ao seu melhor na Vuelta. É uma pena, porque numa corrida com tanto espectáculo, teria sido tão bom ver este italiano a ser aquele ciclista irreverente que sabe e gosta de ser.

Os portugueses

José Gonçalves não terminou, pois uma queda na sexta etapa acabou com a sua Vuelta. Mas o contingente português contou com mais quatro ciclistas e todos andaram em fugas. Rui Costa e Nelson Oliveira com bons resultados, mas não houve vitória. O ciclista da UAE Team Emirates conseguiu um quarto lugar, que tem de ser valorizado já que fez uma parte da Vuelta com uma ferida nas costas, resultado de uma queda. Ainda este domingo tentou novamente a sua sorte. Foi 43º, a 1:58.46 horas, mas mais do que esta classificação ficaram indicações que poderá aparecer bem nos Mundiais. Nelson Oliveira conseguiu um quinto lugar e a certa altura chegou a bater à porta do top dez. Foi um teste às capacidades de voltista do ciclista da Movistar, sem estar no papel de gregário. Mas esta Vuelta é mesmo muito dura e com o passar das montanhas Oliveira foi perdendo tempo. Terminou na 47ª posição, a 2:16.03. No contra-relógio, o próprio assumiu que foi uma desilusão a sua exibição nesse dia, ficando longe dos melhores: a 2 2:47 de Chris Froome.

Ricardo Vilela fez a Vuelta lesionado. Ainda assim manteve-se em prova até final, representando uma Manzana Postobón que tanto se quis mostrar nesta corrida. Foi 50º, a 2:25.21 de Froome. Rafael Reis fez a sua estreia e acabou por ser o intervenientes de um dos momentos negativos na Vuelta. Não por sua responsabilidade. Quando integrava uma fuga, acabou por ser tocado por uma moto, que lhe provocou uma queda. Infelicidade para o português da Caja Rural que certamente ganhou uma experiência importante durante as últimas três semanas, naquele que está a ser o seu primeiro ano numa equipa Profissional Continental. Terminou na 132ª posição, a 4:27.14.

Muito mais haveria a dizer, mas vamos evitar um testamento. De ano para ano esta Vuelta tem sido o palco de cada vez mais espectáculo e, por isso, entramos em contagem decrescente até à próxima, a 73ª edição.


Summary - Stage 21 - La Vuelta 2017 por la_vuelta



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