17 de julho de 2019

Não temos Cavendish nem Kittel, mas temos muito mais

(Fotografia: © ASO/Alex Broadway)
Habituados que estamos a ter um sprinter que tem tendência a destacar-se, mesmo que em seu redor estejam outros de muita qualidade, a Volta a França de 2019 está a ser bem diferente. Só nos tempos mais recentes tivemos um Mario Cipollini que era sempre o super favorito, com Mark Cavendish a aparecer para ser o rei do sprint depois do italiano. Com Cavendish no auge, veio um Marcel Kittel ameaçar e até retirar-lhe em certas ocasiões o trono. Agora está vazio. Fernando Gaviria continua a ser um forte candidato, mas estamos perante uma geração de sprinters que primam pelo equilíbrio e neste Tour ainda nenhum se conseguiu destacar. Ou seja, ninguém venceu mais que uma etapa.

A mudança de Gaviria para a UAE Team Emirates ainda não foi tão profícua como se esperava. No entanto, não se saberá o que poderia estar a fazer já que falhou o Tour por lesão, pelo que não se vai entrar na toada "e se Gaviria lá estivesse". Interessa quem está e são praticamente todos os que se podem considerar de topo mundial. A qualidade do sprinter também está intrinsecamente ligada à qualidade da equipa. Se a Deceuninck-QuickStep é das melhores a preparar os famosos comboios, a verdade é que Lotto Soudal (que começa a tirar dividendos da "troca" de André Greipel por Caleb Ewan) também há muito sabe gerir bem esta arte, mas Jumbo-Visma e Bora-Hansgrohe são igualmente cada vez mais especialistas, mesmo que, ao contrário das outras duas formações, também tenham pretensões à classificação geral. Mas sim, a Deceuninck-QuickStep continua a ser a melhor, o que explica porque não há sprinter que não ganhe na formação belga.

Neste Tour os sprinters estão a dividir as vitórias entre si. Desde o início do século que, com 11 etapas realizadas, o mesmo só tinha acontecido em 2002 e 2006. Estamos a falar de anos com grandes nomes como Robbie McEwen, Erik Zabel (o actual recordista de camisolas dos pontos a par de Peter Sagan, com seis) ou Thor Hushovd. Curiosamente foram uns anos entre a fase descendente de Cipollini - entre 2000 e 2003 nem foi ao Tour e o de 2004 foi o seu último - e pouco antes da ascensão de Cavendish - estreou-se em 2007.

Recentemente, um jornalista do Cycling Weekly perguntou a alguns sprinters como viam este tipo de decisão de etapa sem Cavendish e Kittel. Sonny Colbrelli (Bahrain-Merida) deu uma resposta que comprova precisamente o que tem acontecido: "É, se calhar, mais interessante porque é incerto. Antes talvez se soubesse que o Cavendish estava tão forte que iria ganhar. Agora há incerteza. Há o Elia Viviani, o Dylan Groenewegen, o Caleb Ewan... a vida continua."

E de facto, os três mencionados já assinaram uma vitória, com Viviani e Ewan a terem o extra de passarem a pertencer ao clube de ciclistas que venceram nas três grandes voltas. Peter Sagan também já venceu nesta edição, com Wout van Aert a dizer que o podem começar a colocar entre os sprinters mundiais de respeito. Houve ainda um Mike Teunissen a ser a grande surpresa. O único domínio tem sido da Jumbo-Visma que venceu com estes dois últimos ciclistas e o seu principal sprinter, Groenewegen. Isso sim, é uma surpresa. E ainda venceu o contra-relógio colectivo!

Alexander Kristoff, vencedor em 2018 nos Campos Elísios, e Michael Matthews são, para já, os principais nomes que ainda não conseguiram um triunfo, uma desilusão para a Sunweb que tem sido das equipas que mais tem trabalhado. Nesta quarta-feira, Matthews até se afastou do sprint e foi o jovem Cees Bol a tentar aparecer, sem sucesso. Mas atenção a este holandês de 23 anos, mesmo que não seja já para este Tour...

Os sprinters vão agora entrar em modo sobrevivência, pois vem aí a alta montanha. Bem-vindos aos Pirenéus! Etapa mais plana, só na terça-feira, depois do dia de descanso. Apesar de na 17ª tirada poder algum sprinter até passar a subida perto da meta, o mais provável é que seja um bom dia para uma fuga triunfar, enquanto os homens rápidos vão tentar poupar-se (se tal for possível) na passagem pelos Alpes para depois irem à procura da etapa que todo este tipo de ciclista mais quer: vencer nos Campos Elísios.

A escolha acertada de Caleb Ewan e um pouco de história ao seu alcance

(Fotografia: © ASO/Thomas Maheux)
O pequeno australiano parece que tem de bater umas quantas vezes na trave, para depois explodir para o sucesso. Foi assim no Giro e acabou com duas etapas ganhas. Estava a ser assim no Tour e eis que finalmente consegue a vitória que tanto ambicionava. Foi para a conseguir que deixou a casa que era a Mitchelton-Scott. A equipa está completamente centrada em conquistar gerais com os irmãos Yates, pelo que o Tour estava vedado ao sprinter. Desiludido, foi para a Lotto Soudal para preencher uma vaga complicada. Aos poucos vai começando a impor-se. Greipel não será esquecido, mas Ewan está a saber ganhar o respeito de todos.

1,65 metros e cerca de 67 quilos de pura potência, com aquele estilo ortodoxo de sprintar deitado sobre o guiador, Ewan é agora um dos 95 ciclistas que conquistou etapas nas três grandes voltas. Aos 25 anos estreou-se finalmente no Tour e já tem a sua vitória, depois de ter ganho na Vuelta em 2015 e no Giro em 2017 e este ano. Ao todo são agora cinco etapas em grandes voltas. Aos poucos começa a construir o seu palmarés, tal como aos poucos a Lotto Soudal está a adaptar-se ao seu novo líder nos sprints. Não foi um início fácil de temporada, mas o entendimento entre Ewan e os seus lançadores vai ficando cada vez mais aprimorado.

O australiano até pode entrar para outro ranking da história. Desde 2003 que ninguém ganha uma etapa em cada uma das três grandes no mesmo ano. O último foi Alessandro Petacchi, num feito que só tinha sido alcançado na década de 50 por outro italiano Pierino Baffi (1958) e o espanhol Miguel Poblet (1956). Ainda se desconhece se Ewan vai à Vuelta, mas aqui fica um incentivo!

Classificações completas, via ProCyclingStats.

12ª etapa (18 de Julho): Toulouse - Bagnères-de-Bigorre, 209,5 quilómetros


Há que concordar com Geraint Thomas. Não deverá ser já nesta etapa que se vão verificar grandes mexidas. Claro que a última vez que se pensou assim, foi a loucura total, na segunda-feira, mas aí o vento teve uma palavra a dizer! Com o contra-relógio de Pau na sexta-feira e o Tourmalet no sábado poderá haver alguma gestão de esforço. Ainda assim, os segundos bónus em jogo na última subida do dia poderão seduzir algum candidato mais atrasado, mas, ainda assim, é um dia em que a fuga pode triunfar.




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