25 de julho de 2019

Lutas internas, tácticas estranhas... E Alaphilippe continua de amarelo

(Fotografia: © ASO/Alex Broadway)
Reina a confusão na Movistar e na Ineos. Se na primeira equipa já não é surpresa nenhuma, até é habitual, já na Ineos é mais um sinal que nem tudo vai bem numa formação britânica bem diferente daquela que tomou conta da Volta a França nos últimos anos. A causa é idêntica em ambas: apostar em mais do que um ciclista, algo que tem sempre um enorme potencial para correr mal. Se ninguém ceder na estrada, o momento de sacrificar um poderá não ser fácil de aceitar.

E a Ineos está neste momento na mira de ser vítima de uma táctica que teve um resultado positivo por um lado, mas que também pode ter um resultado nefasto. O que aconteceu no Col du Galibier foi desportivamente estranho, mas há o lado emocional que afecta Geraint Thomas. Egan Bernal atacou, ganhou vantagem, e com o pequeno grupo de candidatos todo junto e sem reagir, Thomas resolveu atacar. Não apanhou Bernal, pelo contrário acabou apanhado pelos outros ciclistas, mas contribuiu para que a diferença para o colombiano fosse reduzida.

Thomas começou o dia como o melhor classificado da Ineos, no segundo lugar. Agora é terceiro atrás de Bernal, que recuperou 32 segundos a Alaphilippe, estando agora a 1:30, menos cinco segundos que o galês. Será que Bernal tinha permissão para atacar? O próprio Thomas disse que sim, que a equipa deu essa indicação. Bernal até afirmou que foi Thomas quem lhe deu o sinal para sair do grupo. O galês explicou que o plano era tentar que alguém reagisse entre os candidatos para aumentar o ritmo. Como ninguém o fez, Thomas deu o mote. Se tivesse deixado todos para trás (Alaphilippe ainda cedeu, mas recuperou na descida) e até se aproximado de Bernal, estar-se-ia a falar de uma movimentação arriscada, mas de mestre. Assim... foi o oposto.

A táctica beneficiou Bernal, mas talvez não tanto se Thomas tivesse ficado no grupo. Esta é uma Ineos dividida. Thomas é uma espécie de mal-amado. Há um ano estava mais forte do que Chris Froome, mas, ainda assim, a equipa alertou-o que o deixaria para trás se tivesse problemas no contra-relógio colectivo e Froome terá dito que o iria atacar em certas etapas. Foi o próprio Thomas quem contou. A vitória foi absolutamente merecida e sem discussão, mas teve de enfrentar uns directores que queriam ver Froome a ganhar o quinto Tour.

Sem Froome nesta Volta a França, Thomas não consegue ser, ainda assim, um líder indiscutível. O encanto por Bernal é enorme e a qualidade do colombiano assim o justifica. Thomas tenta defender um estatuto que não consegue ter, o que ajuda a enfraquecer uma Ineos, numa Volta a França em que nenhum gregário consegue ficar com os líderes nas fases decisivas. E não há um líder que ninguém se atreve a questionar e quem o faz é rapidamente colocado no seu lugar (que o diga Mikel Landa quando por lá passou).

Alguém vai ter de ceder... Com a exibição de hoje de Bernal, Thomas arrisca ser o sacrificado. Aceitar ou não pode fazer a diferença entre uma vitória no Tour da Ineos ou ver um ciclista de outra equipa vencer. 

Julian Alaphilippe (Deceuninck-QuickStep) continua de amarelo...

Mas se queremos falar de tácticas estranhas, a Movistar é rainha! Primeiro o habitual: colocou homens na frente para mais tarde ajudarem o líder. Esse era, à partida da 18ª etapa, Mikel Landa. Foi a equipa espanhola que abriu as hostilidades ainda no Col d'Izoard. Acelerou e muito o ritmo, seleccionando naquela subida a maior parte do grupo de candidatos. 

Grande trabalho de Marc Soler, com Andrey Amador a ser um dos homens que deixaria a fuga para ajudar Landa. Esperava-se um ataque do espanhol, mas não foi um dia bom neste início de passagem pelos Alpes. Landa assim o admitiu. Mas então por que razão a Movistar elevou tanto o ritmo? Já o tinha feito nos Pirenéus e deixou Quintana para trás... Desta feita, pelo menos Landa não perdeu tempo, mas também já não o melhor colocado na geral. Quintana ultrapassou-o.

(Fotografia: © ASO/Pauline Ballet)
Rapidamente se percebeu pelo posicionamento na fuga que o colombiano não estava para esperar por ninguém. Enquanto Amador chegou a andar muito tempo na parte de trás antes de quase parar para esperar por Landa, Quintana esteve sempre bem colocado, atento a possíveis ataques e a preparar o seu, como acabou por se comprovar e que lhe valeu uma excelente vitória de etapa. Agora está a 3:54 de Alaphilippe e tem um minuto de vantagem sobre Landa. Alejandro Valverde é 10º, a 5:58 minutos. O espanhol está numa corrida muito própria. Pouco ajuda Landa, já criticou Quintana e não se percebe muito bem qual é o seu papel em prol da equipa. Se é que o tem.

A Movistar uniu-se em prol de Landa. Mesmo com a exibição de hoje, Quintana parece isolado. Está de malas feitas para uma nova aventura, só faltando saber oficialmente se vai para a Arkéa Samsic, e com Landa - esteve com pé e meio fora, com a Bahrain-Merida a cobiçá-lo -, mais perto de renovar depois de saber das saídas do colombiano e de Richard Carapaz (estará a caminho da Ineos), não será de estranhar que este pormenor tenha o seu peso.

Na Volta a Itália, quando a Movistar se uniu por completo em redor de Richard Carapaz, venceu a grande volta. Contudo, também é verdade que o equatoriano recusou ficar em segundo plano, perante a assumida liderança de Landa e foi à procura do seu resultado. Perante as circunstâncias da corrida, até o espanhol acabou ajudou o companheiro e tal fez toda a diferença. Mas no Tour, este tridente está mais tempo a lutar entre si do que a trabalhar em conjunto. A repetição do filme de terror de 2018. Quintana já se percebeu que não trabalha para Landa. Landa não vai trabalhar para Quintana. Para quem vai trabalhar equipa?

E no meio de tanta luta interna, é Julian Alaphilippe (Deceuninck-QuickStep) que continua de amarelo...

As equipas podem tentar jogar lançando ataques à vez com os seus candidatos, mas arriscam a que os egos se metam no caminho.

19ª etapa (26 de Julho): Saint-Jean-de-Maurienne - Tignes, 126,5 quilómetros


Está a ser um Tour emocionante - até a luta pela camisola da montanha está a ser acesa, com Romain Bardet (AG2R) a ser o novo líder - e faltam dois dias de Alpes para ficar tudo decidido. Os colombianos estão a dar-se muito bem com a altitude nesta fase do Tour e no Col de l'Iseran estarão quase a três mil metros: 2770, com o final da etapa a estar um pouco acima dos dois mil. As duas subidas finais têm bastante dureza e a ver vamos se as condições meteorológicas não pregam uma partida. Nesta quinta-feira, os ciclistas passaram bastante tempo a colocar gelo por dentro das camisolas e terminaram debaixo de uma chuva torrencial. A chuva poderá marcar presença, o que influenciará muito, por exemplo, a descida entre a categoria especial e a primeira categoria final, com a meta a estar colocada numa fase já plana. Irá Alaphilippe resistir de amarelo?

De referir que, relativamente à expulsão de Luke Rowe (Ineos) e Tony Martin (Jumbo-Visma) na etapa de ontem, ambos os ciclistas ainda compareceram com as equipas na partida em Embrun, com as formações a tentarem apelar junto do Tribunal Arbitral do Desporto. A decisão dos comissários da UCI manteve-se e os dois foram para casa.

Classificações completas, via ProCyclingStats.




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