3 de dezembro de 2016

O melhor nove de 2016

Este tipo de escolha acaba por estar sempre aberta a discussão. Porém, alguns dos nomes serão claramente consensuais, como Chris Froome ou Peter Sagan. Foi um ano de grandes momentos de ciclismo e os ciclistas que se seguem estiveram envolvidos em alguns deles. Aqui fica a escolha do Volta ao Ciclismo para o melhor nove do ano (a ordem é meramente alfabética).

Alejandro Valverde (espanhol da Movistar, 36 anos)
Faltam palavras para descrever este ciclista. Viveu o melhor e o pior do ciclismo e aos 36 anos mantém a ambição intocável e uma capacidade física invejável. Não há muito tempo seria impensável ter um ciclista com esta idade a somar os resultados que Valverde consegue. E o melhor é que há uma certeza que ainda tem algo mais para dar e, por isso, mesmo a Movistar renovou com o ciclista até 2019. Mas vamos a este ano de loucos. Valverde mudou os seus habituais objectivos. Estreou-se na Volta a Itália e logo com uma vitória de etapa e um terceiro lugar final e depois foi ainda fazer o Tour e a Vuelta como gregário de luxo de Quintana. E como Valverde não sabe correr mal, foi sexto em França e 12º em Espanha. Quanto às provas de um dia, venceu pela quarta vez a sua preferida Flèche Wallonne, mas não conseguiu repetir a "dobradinha" de 2015, sendo "apenas" 16º na Liège-Bastogne-Liège. Mesmo depois de uma época estafante e longa (92 dias de competição), chegou à Lombardia e esteve na luta para terminar o ano com a conquista de um monumento, mas essa mesma época estafante e longa tiveram um preço nos últimos quilómetros, sendo sexto. Ainda assim, mais um excelente ano para este ciclista fora de série.

Chris Froome (britânico da Sky, 31 anos)
Se ganhou a Volta a França, então teve uma época positiva, mas Chris Froome soube tornar 2016 ainda mais memorável e ainda melhor do que "apenas" conquistar o seu terceiro Tour, segundo consecutivo. Pronto prévio: já se sabe que a Sky tem o dom da perfeição no que diz respeito à Volta a França e mais uma vez assim foi. No entanto, de nada serviria a perfeição da equipa se o seu líder não correspondesse e Froome não só o fez, como demonstrou que ainda tem a capacidade de inovar. O britânico começou a ganhar o Tour na etapa oito, quando na descida que levaria a meta, deixou a concorrência para traz e encontrou uma posição aerodinâmica de pedalar não necessariamente inédita, mas não é habitual ver um ciclista mantê-la durante tantos quilómetros. Depois correu (literalmente) o Mont Ventoux acima até ter uma bicicleta, após o incidente de uma moto com o público que provocou a queda do trio Froome/Porte/Mollema e partiu a bicicleta do britânico. Ainda venceu o contra-relógio para não restarem dúvidas. Antes do Tour, Froome já tinha conquistado o Critérium de Dauphiné e a Herald Sun Tour. Se na prova de estrada dos Jogos Olímpicos terá ficado desiludido com o 12º lugar, conquistou depois a medalha de bronze no contra-relógio. Para terminar o ano uma Vuelta espectacular, onde a Sky foi tudo menos perfeita e Chris Froome deu a luta possível a Nairo Quintana. Quando precisou da equipa, esta falhou, mas Froome não só cumpriu ficando em segundo lugar, como proporcionou mais uma imagem para recordar: o aplauso ao rival quando cortou a meta na penúltima etapa.

Greg van Avermaet (belga da BMC, 31 anos)
Acabou o estigma do segundo lugar e acabou o ser conhecido apenas como a besta negra de Peter Sagan. Em 2016 Avermaet conquistou o direito de ser reconhecido pelo excelente ciclista que é, principalmente em provas de um dia, mas também teve o seu momento na Volta a França. O belga pode ter despontado tarde como um líder da BMC, mas agora não há dúvidas que é o homem a apostar nas clássica, de tal forma que a equipa não se incomodou em ver Philippe Gilbert sair. Avermaet venceu a sua primeira clássica na Bélgica - a Omloop Het Nieuwsblad -, foi quinto na Milano-Sanrem e conquistou surpreendentemente o Tirreno-Adriático, beneficiando da etapa rainha ter sido cancelada devido ao mau tempo e de um contra-relógio muito acima do habitual para não deixar Peter Sagan tirar-lhe o triunfo. Uma motivação para os seus monumentos preferidos: a Volta a Flandres e o Paris-Roubaix. Porém, uma queda juntamente com colegas da BMC na primeira terminou com a sua temporada nas clássicas. Voltou ao seu melhor no Tour ao conquistar uma etapa e vestir de amarelo. Mas é aquela medalha de ouro olímpica que o irá imortalizar. Uma vitória em tons de épica e que deixou Avermaet a sorrir o resto do ano e provavelmente durante a restante carreira. Ainda conquistou o Grande Prémio de Montreal e uma etapa do Eneco Tour. Cuidado com ele para o ano nos monumentos do pavé. Afinal, é o que mais ambiciona vencer, talvez mais do que ser campeão do Mundo.

Johan Esteban Chaves (colombiano da Orica-BikeExchange, 26 anos)
Já se esperava que "Chavito" fosse um ciclista com futuro e o futuro chegou em 2016. O colombiano confirmou que é homem para lutar pela geral de uma grande volta, não defraudando as expectativas criadas na Vuelta em 2015, quando terminou no quinto lugar, vencendo ainda duas etapas. 2016 foi tão bom para Johan Esteban Chaves, que até os responsáveis da Orica-BikeExchange admitiram não esperarem tanto. Chaves terminou em segundo no Giro e esteve perto de ganhar, mas na derradeira etapa de montanha, não conseguiu parar a super recuperação de Vincenzo Nibali. Conquistou ainda uma etapa. Nos Jogos Olímpicos ficou-se por um modesto 21º lugar, mas chegou à Volta a Espanha preparado para mostrar que pode lutar com as grandes referências das corridas de três semanas: Chris Froome, Nairo Quintana e Alberto Contador. O colombiano foi um lutador - e contou com ajuda de uma equipa cada vez mais virada para este tipo de competições - e tirou o espanhol do pódio, terminando em terceiro. E para acabar o ano de forma perfeita, conquistou o seu primeiro moumento: Il Lombardia. Uma das principais evoluções de Chaves foi precisamente a nível táctico, o que deu muito jeito na clássica.

Mark Cavendish (britânico da Dimension Data, 31 anos)
Preterido na Etixx-QuickStep que optou por contratar Marcel Kittel, o britânico parecia ter entrado numa fase descendente da carreira. As vitórias tinham vindo a diminuir nos últimos anos e quando mais parecia que se estava a preparar o enterro como um sprinter candidato às grandes vitórias, Cavendish reencontrou-se com a melhor forma na Dimension Data, num ano em que dividiu a estrada com a pista. Na pista sagrou-se campeão do Mundo de Madison com Bradley Wiggins e conquistou a muito desejada medalha olímpica (ainda que a de prata) no Omnium, apesar de ter sido muito criticado por ter provocado uma queda a um ciclista, sem que tivesse sido desclassificado. Os Jogos Olímpicos foram depois de uma Volta a França inacreditável. Quatro vitórias de etapas (faltam quatro para apanhar Eddy Merckx como o ciclista com mais triunfos no Tour) e ainda conseguiu concretizar um dos seus maiores sonhos: vestir a camisola amarela. Foi apenas por um dia, mas valeu por uma carreira. Seguiu-se o forte desejo de sagrar-se campeão do mundo de estrada pela segunda vez, depois de o ter feito em 2011. No Qatar, o percurso era feito à medida dos sprinters, mas Cavendish viu a sua tentativa frustrada por Peter Sagan. A desilusão foi grande e o britânico não a esconde. Porém, o fantástico ano fez com que Cavendish recuperasse alguma da confiança perdida e agora já fala em conquistar novamente a Milano-Sanremo.

Nairo Quintana (colombiano da Movistar, 26 anos)
Metódico na sua preparação rumo ao que é conhecido como "sueño amarillo", Nairo Quintana teve uma época em que não alcançar um bom resultado simplesmente não entrava nos seus planos. Passou muito tempo em treino de altitude pela Colômbia, mas quando competiu terminou sempre no pódio, menos nos Campeonatos Nacionais (foi quarto) e no Grande Prémio Miguel Indurain (abandonou). O "sueño amarillo" tornou-se num pesadelo, com Quintana a não conseguir acompanhar Froome. Pior do que isso, nem chegou a medir forças com o britânico, pois acabava sempre apanhado por alguém da Sky. E quando foi necessário responder a Froome, não foi capaz. Ainda assim foi terceiro. Porém, poucas semanas depois era um Quintana quase irreconhecível, comparativamente com o Tour, porque o colombiano que surgiu na Vuelta foi muito mais o ciclista que se conhece, com uma grande diferença: deixou de jogar tão na defensiva e passou ao ataque. E que espectáculo que foi. Já tem um Giro, já tem uma Vuelta, agora falta aparecer ao melhor nível na Volta a França. Foi um grande final de temporada, na qual conquistou ainda a Volta a Catalunha, a Volta a Romandia e a Route du Sud, ainda que nesta última não tenha tido praticamente concorrência.

Peter Sagan (eslovaco da Tinkoff, 26 anos)
Campeão do Mundo pelo segundo ano consecutivo, campeão Europeu na primeira vez que a prova contou com a elite, conquistou o seu primeiro monumento na Volta a Flandres, três etapas no Tour e a quinta camisola verde consecutiva (e ainda vestiu a amarela). Ao todo foram 15 vitórias num ano simplesmente fenomenal, em que apenas foi estranho não o ver nos Jogos Olímpicos. Optou pelo BTT, pois considerava que o percurso de estrada não era para ele. No entanto, venceu o seu grande rival., Greg van Avermaet Mas a falta de medalha olímpica não deve estar a preocupar o eslovaco. Apesar de não ter uma Tinkoff que o apoie como deveria, Sagan consegue "sacar" vitórias em quase todas as provas por onde passa. Não era considerado um sprinter puro, apesar de sprintar muito bem. Mas chegou ao Qatar e bateu os sprinters puros e um muito experiente Tom Boonen, também ele um sprinter de eleição noutros tempos. Sagan é um ciclista para todas as ocasiões, para todos (ou quase) os percursos. A grande questão é: se faz o que faz sem grande ajuda, o que poderá fazer se na Bora-Hansgrohe tiver uma equipa que trabalhe para ele?

Romain Bardet (francês da AG2R, 26 anos)
Thibaut Pinot mereceu maior atenção no início da temporada muito devido à sua surpreendente evolução no contra-relógio. Porém, na guerra de franceses, Bardet - que tem sido sempre mais discreto - foi realizando uma boa preparação para a Volta a França, somando vários top dez. No Critérium du Dauphiné, vista como a corrida que dá as mais fortes indicações de como estão os ciclistas para o Tour, Bardet foi segundo atrás de Chris Froome. Ao contrário de Pinot, quando chegou o momento da verdade, Bardet esteve a grande nível da Volta a França, vencendo uma etapa e terminando no segundo lugar... atrás de Froome. O ciclista francês demonstrou que podem contar com ele para ser um forte candidato a suceder a Bernard Hinault como vencedor gaulês do Tour e acabar com o jejum que dura desde 1985. Atenção também a Bardet para a Lombardia. Foi quarto e é uma prova que lhe agrada.

Tom Dumoulin (holandês da Giant-Alpecin, 26 anos)
Foi uma época de altos e baixos para o holandês. Não ajudou ter parte da equipa a ser atropelada na pré-época. Dumoulin não estava lá, mas naturalmente que o afectou ter alguns colegas que ficaram feridos e invariavelmente com a preparação atrasada. Depois do brilharete na Vuelta em 2015 - na qual venceu duas etapas e claudicou na última etapa de montanha, caindo de primeiro para sexto - queria-se perceber se o que tinha acontecido em Espanha tinha sido um acaso, ou se realmente estamos perante de um candidato a uma vitória numa grande volta. Pelo que vez este ano a resposta terá de ser não. Mas a presença de Dumoulin neste nove ideal de 2016 justifica-se porque confirmou-se como um dos melhores contra-relogistas do mundo, além de claramente estar a tornar-se cada vez mais num trepador decente, mas que, para já, "apenas" lhe vai garantindo vitórias de etapa. No Giro venceu o contra-relógio inicial e vestiu a camisola rosa, naquela que foi a primeira vitória do ano da Giant-Alpecin. Esteve muito bem na primeira semana e parecia que seria mesmo candidato, mas acabou por abandonar a prova quando as maiores dificuldades surgiram. No Tour não se interessou pela geral, preferindo etapas e venceu num dia tempestade em Andorra Arcalis, à custa de Rui Costa. Depois venceu mais um contra-relógio e desistiu na 19ª etapa. Ficou desiludido por não ter sido campeão olímpico de contra-relógio. A medalha de prata soube-lhe a pouco, mas Fabian Cancellara resolveu acabar a carreira em grande e tirou um ouro que parecia destinado ao holandês. Nos Mundiais, o percurso plano já não o beneficiava, mas Dumoulin sofreu e muito com o calor. Foi sétimo na sua especialidade. A este ciclista falta ainda evoluir um pouco mais como trepador e ter uma equipa que o apoie. O talento e a qualidade estão lá, a ver vamos se consegue em 2017 confirmar as expectativas nas grandes voltas.

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