2 de junho de 2019

Agora todos vão acreditar em Carapaz

(Fotografia: Giro d'Italia)
Há um ano Richard Carapaz teve uma recepção impressionante quando regressou ao seu país. Então era um ciclista que tinha feito história ao ganhar uma etapa numa grande volta. O primeiro equatoriano a fazê-lo. Foi uma recepção daquelas que por cá se vê mais numa conquista do futebol, mas no Equador, Carapaz, o ciclista, foi herói. Tornou-se uma referência. E agora? O Equador está em festa. A última etapa até foi transmitida em sinal aberto na televisão. Carapaz fez ainda mais história. É um ídolo. Ganhou mesmo uma grande volta. Ele bem avisou que estava no Giro para disputá-lo. Todos olharam mais para Mikel Landa. Até o deixaram vestir a camisola rosa como decisão táctica. Menosprezar um grande ciclista dá nisto. Não viram ou não quiseram ver, mas Carapaz sabe ser grande.

Recuamos uns dias, até 25 de Maio, a 14ª etapa. Primoz Roglic fez tudo para que Carapaz vestisse a rosa, para não ser ele e a equipa, Jumbo-Visma, a ter a responsabilidade de controlar a corrida. Landa andava a tentar recuperar o terreno perdido da primeira semana. Era o espanhol que era visto como líder da Movistar. Naquele dia, tudo mudou, ainda que só mais tarde se tivesse percebido a importância daquela etapa. A Movistar uniu-se em torno do seu líder de rosa. E até Landa rendeu-se às evidências que tinha de ser um braço-direito, ainda que pudesse beneficiar de tal para tentar chegar a um pódio.

(Fotografia: Giro d'Italia)
Carapaz não foi um miúdo nervoso com a responsabilidade que lhe caiu nos ombros. Foi um senhor ciclista, sem medo de assumir o risco, essa responsabilidade, a liderança de uma equipa que tanto tem sido criticada nos últimos anos nas grandes voltas. Fez algo que há muito não se via: unir a Movistar. O melhor não ficou guardado para o Tour. O melhor esteve mesmo no Giro. Andrey Amador, Héctor Carretero, Lluís Mas, Antonio Pedrero, José Joaquín Rojas e Jasha Sütterlin merecem o reconhecimento. Uns tiveram um trabalho mais visível que outros, mas todos estiveram ao lado de um Carapaz que foi o líder que a Movistar precisava. Até trabalhou para que Landa ganhasse uma etapa.

Ainda alguém se lembra que Alejandro Valverde foi considerado uma das grandes ausências, antes do Giro começar? Até parece mal falar assim deste ciclista, o campeão do mundo. Mas a verdade é que a Movistar funcionou em pleno sem Valverde. Carapaz foi perfeito. Foi regular, o factor mais importante nesta Volta a Itália. Defendeu-se nos contra-relógios, geriu o esforço na montanha, atacou nos momentos certos, protegeu-se quando assim tinha de ser. Ainda apanhou um susto logo no início, mas depois foi sempre a melhorar. E há que não esquecer que venceu duas etapas.

O menino de El Carmelo (Turcan, na província de Carchi) a quem roubaram a sua primeira bicicleta, que tinha os pais a trabalhar arduamente no campo enquanto Carapaz sonhava alto. O ciclismo abriu-lhe as portas do mundo e Carapaz foi a Itália colocar o Equador definitivamente no mapa da modalidade aos 26 anos. Diz que quer ser um exemplo para as crianças, quer que todas tenham um sonho e que lutem por ele. Agora, mais do que nunca, tornou-se numa referência, num ídolo do país e muito além fronteiras.

(Texto continua por baixo da fotografia)

(Fotografia: Giro d'Italia)

"Há 21 dias ninguém contava comigo como favorito. Ninguém acreditava que eu o conseguiria fazer", disse no final do Giro. Verdade! Mas agora passa-se a acreditar que tudo é possível para este talentoso ciclista. Agora o que mais se quer ver é como vai a Movistar gerir este corredor. Não é mais um ciclista de segunda fila. É um vencedor de uma grande volta.

Para Carapaz inicia-se uma nova fase na carreira. Há que comprovar que tem capacidade para continuar no topo. Há exemplos de quem fez sonhar tanto, mas acaba a desiludir. Pela Movistar há um colombiano nessa posição...

Mas Carapaz tem tempo para começar a pensar no próximo passo, no próximo objectivo. Agora é tempo de desfrutar e terá um Equador certamente à sua espera com uma recepção ainda mais memorável.

Contra-relógio final sem emoção esperada

(Fotografia: Giro d'Italia)
Tanto se jogou neste Giro com o contra-relógio de 17 quilómetros em Verona, mas afinal estava tudo praticamente definido. Mérito para Carapaz que fez o seu trabalho na montanha. Algum demérito para Primoz Roglic que foi sempre a descer de forma no Giro depois de começar tão forte. Demasiado forte. Até no contra-relógio esteve longe do seu melhor, mas o suficiente para tirar Mikel Landa do pódio por oito segundos.

Um prémio de consolação para Roglic, enquanto Landa já perdeu um pódio por um segundo, no Tour, pelo que não foi nada de novo. Pena aquela primeira semana e muita pena ser tão fraco no esforço individual. Ainda não foi desta para o espanhol.

Nibali foi segundo merecidamente. Talvez tenha-se concentrado de mais em Roglic. Ele que chegou a avisar que, perante a atitude passiva do esloveno, que se ele (Nibali) não pudesse ganhar o Giro, não "rebocaria" Roglic para este ganhar. Pois... nenhum ganhou.

Para Miguel Ángel López (Astana) a consolação veio em formato de camisola branca. Segunda vitória na juventude, mas soube a pouco para o colombiano. Contudo, depois de tanto azar - furo, avaria mecânica, adepto a atirá-lo ao chão -, não foi mau. Ficou ainda na sétima posição na geral, perdendo um lugar para Rafal Majka (Bora-Hansgrohe) no contra-relógio.

Giulio Ciccone (Trek-Segafredo) termina a Volta a Itália como uma das grandes figuras. Rei da montanha e vencedor de uma etapa. Este ciclista promete. Pascal Ackermann (Bora-Hansgrohe) estreou-se numa grande volta com duas vitórias de etapa e a camisola dos pontos. Excelente! A Movistar venceu a classificação colectiva e desta vez a tabela reflectiu mesmo a melhor equipa. Chad Haga venceu a derradeira tirada, com a Sunweb a sair do Giro com pelo menos um motivo para sorrir.

Para terminar, Amaro Antunes. Que Volta a Itália de emoções. Não começou nas melhores condições, com uma lesão a limitar-lhe a preparação. Mas o objectivo estava bem definido: tentar uma etapa. Porém, numa das reviravoltas do Giro, o algarvio viu-se no top dez. Acabaria a regressar ao plano inicial e foram 12 segundos que na 19ª etapa o separaram da estreia perfeita em três semanas. Foi terceiro e deixou boas indicações para quem nunca tinha corrida tanto tempo seguido. Corrida positiva para o português da CCC.

Classificações completas, via ProCyclingStats.



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