8 de março de 2019

Strade Bianche brilha por direito próprio

(Fotografia. Facebook Strade Bianche)
Pequeno intervalo nas clássicas do norte, do pavé. Faz-se a viagem até ao sul da Europa, para a espantosa paisagem da Toscana. Chamam-lhe o sexto monumento, mas é apenas uma designação oficiosa. A Strade Bianche conquistou os grandes nomes do ciclismo e as principais equipas do pelotão praticamente desde a sua primeira edição. A ascensão foi rápida. É diferente, é desafiadora, é espectacular. Tem a intensidade que faz parte da génese de qualquer monumento, contudo, é ainda jovem - vai para a 13ª edição -, pelo que terá de esperar para talvez um dia ser oficialmente o sexto monumento. Mas será que precisa de ser oficial?

O pavé há muito que faz parte do ciclismo. São percursos centenários, históricos. E são o terror de muitos voltistas, que se preparam ao máximo quando uma etapa destas surge na Volta ao França, quase com tanta preocupação como se de uma alta montanha se tratasse. No entanto, o pavé faz as delícias de outros grandes ciclistas e que o digam os ex-corredores como Peter Sagan e Greg van Avermaet. Já a terra batida foi saindo dos percursos, à medida que as estradas foram sendo alcatroadas, oferecendo melhores condições ao ciclismo. Mas a Strade Bianche prima por isso mesmo: os sectores de terra batida, ou de sterrato, palavra que acaba por fazer parte do léxico do ciclismo e que não assusta tanto ciclistas que têm as grandes voltas como principal objectivo.

Apesar desta referência ao pavé, não se compare a Strade Bianche a um Paris-Roubaix ou uma Volta a Flandres. Fabian Cancellara salientou precisamente isso numa entrevista à Gazzetta dello Sport e o suíço, já retirado, sabe melhor do que ninguém do que fala, pois ganhou três vezes em Itália. Sim, a Strade Bianche tem algumas rampas cuja dificuldade fazem lembrar a Flandres. É definida pelos sectores de sterrato, como as outras duas provas são definidas pelos sectores de pavé. Porém, tem a capacidade de atrair vários tipos de ciclistas e tem uma identidade própria e sem comparação. Thibaut Pinot (Groupama-FDJ) é um defensor que a corrida italiana seja considerada o sexto monumento. Romain Bardet (AG2R) fez segundo há um ano. Michal Kwiatkowski (Sky) já a ganhou duas vezes.

Nenhum vai estar presente neste sábado nos 184 quilómetros que têm Siena como ponto de partida e chegada. Mas haverá Geraint Thomas (Sky), Vincenzo Nibali (Bahrain-Merida), Rafal Majka (Bora-Hansgrohe), Julian Alaphilippe (Decenuninck-QuickStep) e Bauke Mollema (Trek-Segafredo), por exemplo. Até Rui Costa (UAE Team Emirates) trocou este ano o Paris-Nice pelo sterrato da Strade Bianche. Thomas e Nibali nem surpreendem muito. O galês até começou a carreira a prometer ser um forte homem de clássicas e o italiano tem a capacidade para se adaptar a todo o tipo de terreno e adora um bom desafio.

O percurso abre a possibilidade de vários tipos de ciclistas vencerem, mas o destaque vai para nomes como Greg van Avermaet (CCC), Zdenek Stybar (Deceuninck-QuickStep e vencedor em 2015) e Wout van Aert (Jumbo-Visma, fez terceiro há um ano). E claro Tiesj Benoot. Uma das provas que esta é uma corrida que vários ciclistas adoram é o facto de o belga ter feito tudo o que era possível para estar presente, depois de há uma semana ter sofrido uma queda feia na Omloop Het Nieuwsblad, que o obrigou a visitar o hospital. Temeu-se que o vencedor de 2018 não estaria presente em Itália, mas o ciclista da Lotto Soudal quer mesmo estar na luta por um segundo triunfo.

Benoot realçou que há quem subestime a Strade Bianche. Provavelmente quem o faz arrepende-se ao fim de poucos quilómetros! Mas muitos até ficam fãs. Já Wout van Aert recordou como, depois de uma grande corrida, quebrou na rampa final. As cãibras até o fizeram sair da bicicleta e fazer uns poucos metros a pé. Ainda assim foi terceiro. A Strade Bianche é uma corrida que quebra o mais forte e especialista dos ciclistas e Peter Sagan também o sabe. Tem dois segundos lugares que revelam como um grande favorito pode ser quebrado naquela chegada. O eslovaco é outra das ausências, mas que não se tema, haverá espectáculo.


Chegar aos metros finais na discussão da vitória é uma batalha contra os rivais, contra um percurso que elimina quem mostra fraqueza e proibida que se tenha azares, contra si próprio, pois a Strade Bianche exige muito a nível físico e a nível. Se a subida final é um enorme teste, há muitos antes para passar.

"Porque é tão especial? As estradas de terra batida, a paisagem da Toscana, a magia de Siena, os caminhos ondulantes, a tradição..." Quem o diz é Fabian Cancellara. Como venceu três edições (2008, 2012 e 2016) teve direito a dar o seu nome a um sector de sterrato, o único até ao momento com essa distinção e não será este ano que haverá mais alguém, já que só Kwiatkowski está a um triunfo dos três, mas não estará presente.

E há uma boa notícia para os ciclistas: a meteorologia será bem simpática, comparativamente com 2018. Chuva, frio, lama... Benoot conquistou uma daquelas vitórias épicas, mas Greg van Avermaet não se importa nada de dizer que prefere que o sol brilhe e "só" ter de lidar com o pó.

Será a 13ª edição, apenas a terceira como corrida do World Tour, mas é uma corrida digna de monumento. Não, não precisa ser oficial. Só ficará bem se o chegar a ser, mas a Strade Bianche ganhou um estatuto em tão pouco tempo, que dificilmente outra corrida mais recente conseguirá. "Por favor, vamos parar de fazer comparações com Flandres e Roubaix. As estradas de terra batida branca brilham por direito próprio." Diz Cancellara e este sábado vai-se mais uma vez perceber que tem toda a razão.

Lista de inscritos, via Procycling Stats. Além de Rui Costa, também os portugueses Nelson Oliveira (Movistar) e Ruben Guerreiro (Katusha-Alpecin) irão competir neste sábado.


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