23 de março de 2019

Milano-Sanremo o monumento dos sprinters? A tradição já não é o que era

Alaphilippe deixou a forte concorrência a vê-lo festejar mais uma vitória
(Fotografia: Facebook Milano-Sanremo)
Os sprinters que não se deixem abater. A Milano-Sanremo irá continuar a ser o monumento que melhor lhes assenta. Mas talvez esteja a perder a sua conotação de "monumento dos sprinters". Mais do que nunca, ciclistas com outras características colocam a clássica nos seus objectivos e como que "perderam o respeito" pelos homens rápidos, que nos últimos três anos têm estado afastados das decisões. O corredor do momento foi selar um triunfo que nem surpreende e apenas serviu para confirmar o poderio de uma Deceuninck-QuickStep que se dá ao luxo de "queimar" o seu sprinter, perfeitamente capaz de ganhar a Milano-Sanremo, para levar Julian Alaphilippe ao topo. Que época sensacional está a ter o D'Artagnan do ciclismo!

"É muito difícil perceber o que alcancei hoje aqui juntamente com esta fantástica equipa", disse Alaphilippe após a vitória em que bateu ao sprint um renascido Oliver Nasen (AG2R) e Michal Kwiatkwoski (Sky), o vencedor da clássica em 2017 (Alaphilippe foi terceiro nessa edição). Mas não é assim tão difícil entender. Não quando há uma Deceuninck-QuickStep que neste tipo de provas não só se dá ao luxo de ter um plano A, B, C e até D, com todos a darem garantias, como tem ciclistas que trabalham na perfeição no controlo de corridas. E depois tem Tim Declercq, o Tractor, como é conhecido. Sim, o belga merece ser destacado, pois em 291 quilómetros "puxou" durante muitos deles e foi um dos principais responsáveis por um ritmo alucinante que começou a sufocar os sprinters quando se aproximou o momento da decisão, que este ano foi no Poggio.

São apenas três quilómetros, com o mais complicado da subida a ser uma zona a 8%. Mas quando o ritmo é tão alto, nem Elia Viviani resistiu ao ritmo dos colegas de equipa. Quando saiu Declerq, entrou Philippe Gilbert e Zdenek Stybar em acção. E quando o trabalho colectivo estava feito, com todos os sprinters ditos "puros" a ficarem para trás, lá foi Alaphilippe.

Não ficou sozinho, mas só Peter Sagan (Bora-Hansgrohe) e Matteo Trentin (Mitchelton-Scott), ex-companheiro de Alaphilippe, foram os dois ciclistas com características de sprinters no top dez. O primeiro continua a não encontrar o caminho da vitória na Milano-Sanremo, o segundo ainda tentou surpreender nos metros finais, mas fugas impressionantes são mais para um Vincenzo Nibali. O ciclista da Bahrain-Merida, vencedor há um ano, também entrou no grupo da discussão. Mas com Alaphilippe na forma que está, a discussão é pouca. Nem Alejandro Valverde (Movistar) tem pedalada para o francês, seu rival, ou mais do que provável sucessor nas Ardenas.

O francês, de 26 anos, está com uma marca impressionante em 2019. Ganhou em todas as corridas. Na Volta a San Juan e no Tirreno-Adriatico venceu duas etapas em cada, na Volta à Colômbia conquistou uma tirada e a classificação dos pontos. Participou em duas clássicas e somou mais duas vitórias: Strade Bianche e agora a Milano-Sanremo.

Alaphilippe já tem o seu monumento. Parecia (e parece) destinado a conquistar uma Liège-Bastogne-Liège, mas foi no monumento dos sprinters que abriu a sua contagem, seguindo assim o exemplo de Kwiatkowski e Nibali, que têm contribuído para que os homens mais rápidos do pelotão saiam frustrados da corrida que historicamente tem sido maioritariamente para eles.

Se a semana das Ardenas fosse já, a dúvida seria se alguém conseguiria estar ao nível de Alaphilippe, que tem tudo para atirar para segundo plano um Alejandro Valverde campeão do mundo. No entanto, esta semana de três clássicas é só daqui a um mês, com o francês a viajar até ao País Basco antes, onde há um ano ganhou duas etapas. A manter a forma, daqui a mês estar-se-á a colocar Alaphilippe no topo dos favoritos e, quem sabe, a assumir de vez um trono que em 2018 mostrou estar preparado para reclamar. Bateu Valverde na Flèche Wallonne e irá agora à procura do seu segundo monumento do ano na Liège. Começam a faltar palavras para descrever a temporada assombrosa de Alaphilippe.

Com esta vitória, talvez a Milano-Sanremo comece a ser um pouco menos conotada com o monumento dos sprinters. Alaphilippe era um dos favoritos, mas não se esperava que nem um dos grandes nomes actuais do sprint - com a excepção de Sagan - conseguisse estar na luta. Ninguém - Caleb Ewan, Dylan Gronewegen, Arnaud Démare, Fenado Gaviria, Sam Bennett (e a lista continua) - passou o Poggio com o grupo que se formou na frente.

Próximo monumento, Volta a Flandres, a 7 de Abril e uma semana depois será o Inferno do Norte, Paris-Roubaix. A Liège-Bastogne-Liège está marcada para dia 28 do mesmo mês, com a Lombardia a fechar os cinco monumentos a 12 de Outubro.

José Gonçalves (Katusha-Alpecin) foi o único português em prova, terminando na 76ª posição, a 1:29 do vencedor. Pode conferir aqui a classificação completa da 110ª edição da Milano-Sanremo, via ProCyclingStats.

E na disputa particular entre Deceuninck-QuickStep vs Astana, está novamente tudo empatado, com 19 vitórias para cada uma das equipas.





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