14 de janeiro de 2018

Sagan já ganha na época do tudo por tudo pelos monumentos

(Fotografia: Bettiniphoto/Bora-Hansgrohe)
Começar uma temporada como se acabou é sempre muito moralizador, mesmo que seja uma corrida mais para o espectáculo do que para a glória. Mas tendo em conta os adversários... todos querem ganhar. A People's Choice Classic tornou-se no primeiro pódio de Peter Sagan, num ano com uma calendarização ligeiramente diferente, mas com os objectivos intocáveis. Intocáveis, mas de desejo reforçado. O eslovaco está prestes a celebrar 28 anos (a 26 de Janeiro) e por esta altura, tendo em conta tudo o que já demonstrou no ciclismo, já se esperava que estivesse a coleccionar monumentos e não apenas ter uma Volta a Flandres para exibir no seu impressionante currículo, centenário em termos de vitórias, mas com a falta das grandes clássicas.

Não há dúvidas que Peter Sagan ficará na história como um dos grandes classicistas. Porém, o próprio sabe que para atingir aquele nível épico onde estão nomes como Tom Boonen e Fabian Cancellara, para referir dois dos mais recentes, terá de ter mais monumentos conquistados. E Sagan vai apontar tudo à Milano-Sanremo e ao Paris-Roubaix. Não o esconde e nem o tem de fazer. A primeira ainda lhe provocará sentimentos de enorme frustração. Como é que perdeu ao sprint para Michal Kwiatkowski no ano passado? Foi uma parte final excelente de Sagan, mas o polaco resguardou-se e bateu um homem muito melhor do que ele ao sprint. E essa foi uma lição que o tricampeão mundial parece ter aprendido de vez.

Em 2017, assistiu-se ao habitual Sagan a tentar recuperar tempo sozinho, com adversários a ficarem na roda. Porém, o eslovaco começou a deixar o seu lado de puro lutador solitário e demonstrou o seu lado táctico. Agora sabe-se que Sagan irá sempre dar luta, mas não contem com ele para fazer o trabalho sozinho e depois somar segundos lugares. Na Milano-Sanremo fez quase tudo bem. Não fosse o seu ataque e provavelmente teria sido um final com mais concorrência. Foi bem jogado tacticamente, até àquele sprint em que percebeu que deveria ter guardado algumas forças. ou seja, ter sido mais frio e obrigado Kwiatkowski a trabalhar mais. É fácil falar agora, claro, mas foi uma lição que Sagan não esqueceu, nem esquecerá.

Na clássicas do norte deixou então bem claro que estava a tornar-se num ciclista diferente quando foi bem claro que dizia a quem ficava na sua roda: ou ajudas, ou ficamos por aqui. E chegou mesmo a "ficar por ali". Depois teve uns azares pelo caminho - queda na Volta a Flandres provocada por uma casaco, furo no Paris-Roubaix - que acabaram por não ajudar à temporada nas clássicas, que se resumiu a uma vitória na Kuurne-Bruxelles-Kuurne. Muito pouco para um corredor como Sagan.

Este ano haverá diferenças logo a começar pelo calendário. É idêntico, mas falhará, o fim-de-semana da Omloop Het Nieuwsblad e da Kuurne-Bruxelles-Kuurne. Sagan foi pai recentemente e a justificação é que pretende passar mais tempo com a família. Normal, é certo, mas também permitirá a um menor desgaste físico já que não competirá em Fevereiro, e a uma menor exposição, pois é sempre o centro das atenções nas corridas e fora delas. A Bora-Hansgrohe também irá promover alguns estágios em altitude que serão intercalados com as fases de competição, que relativamente a Sagan terão um objectivo a pensar mais para o término da temporada.

Com a Volta a França a estar marcada quase por um sentimento de repor alguma justiça depois da expulsão em 2017, os treinos em altitude terão a sua influência, mas é nos Mundiais de Innsbruck que podem assumir um papel decisivo. Em Julho será o segundo tudo por tudo do ano, agora por etapas e pela sexta camisola verde (dos pontos) no Tour. Após o Paris-Roubaix, fará uma pequena paragem, com a Volta à Califórnia e à Suíça na agenda para preparar o assalto ao Tour. A partir daqui ter-se-á de esperar.

Apesar dos Mundiais na Áustria terem um percurso que convida claramente os trepadores - e já são alguns que estão a apontar à camisola do arco-íris como Fabio Aru e Mikel Landa - Peter Sagan já avisou para não o colocarem de parte, pois quer o seu quarto título consecutivo. Se lhe faltam monumentos, já nos Mundiais tem o seu lugar na história, pois nunca ninguém tinha conquistado três consecutivos. Ganhar em Innsbruck significaria ser o primeiro a sagrar-se campeão mundial quatro vezes (consecutivamente ou não).

Sagan sabe defender-se na montanha, como demonstrou quando ganhou a Volta à Califórnia em 2015. Porém, toda a sua estrutura física (e mental) é de um homem de clássicas e sprints. A estratégia passa por perder cerca de 1,5 quilos e assim jogar a sua sorte frente aos especialistas. Se conseguir vencer, também ficará na história por ganhar Mundiais seja qual for o percurso: completamente plano, um pouco acidentado ou com subidas de muito respeito.

Mas primeiro a Milano-Sanremo e o Paris-Roubaix. E será difícil não ver Sagan a lutar antes pela Strade Bianche. Haverá outra diferença relativamente a 2017, além da mudança de calendário e da táctica de Sagan: a equipa. Na estreia no escalão do World Tour, a estrutura alemã manteve muitos dos ciclistas que já a representavam quando era Profissional Continental, contratando alguns nomes fortes, com Sagan e Rafal Majka à cabeça. Este ano foi buscar outros nomes bem interessantes, mas a pensar um pouco mais em reforçar o apoio em redor das suas estrelas.

O italiano Daniel Oss (ex-BMC) não escondeu que escolheu a Bora-Hansgrohe porque queria trabalhar com Sagan. Da Sky veio Peter Kennaugh, que, para já, é aposta clara para a semana das Ardenas, mas não é de excluir que possa ser chamado a dar uma ajuda a Sagan. Pelo menos Oss já demonstra como está dedicado e feliz por ajudar o eslovaco... (Texto continua em baixo.)


Philippe Gilbert (Quick-Step Floors) também tem como objectivos a Milano-Sanremo e o Paris-Roubaix, para assim conquistar todos os cinco monumentos. Greg van Avermaet (BMC) quebrou o enguiço em 2017 ao vencer o seu primeiro (Paris-Roubaix) e o campeão olímpico já só pensa em juntar mais. A Milano-Sanremo volta a estar na mira e claro que a Volta a Flandres é quase uma obsessão para o belga. A lista de adversários continua, mas, lá está, é em Peter Sagan que as atenções tendem a centrar-se. É um ciclista mediático, admirado, respeitado... mas faltam-lhe as vitórias nos monumentos para o consagrar entre os melhores dos melhores e para evitar ser o grande Sagan a quem lhe faltou as clássicas, que parecia ser quase natural que as vencesse, até mais do que uma vez.

Acima de tudo, Sagan sabe que não é as expectativas dos outros que tem de confirmar, mas as que ele próprio criou. É um grande... enorme ciclista e que quer acabar com a saga dos segundos lugares. Peter Sagan quer ainda acrescentar umas páginas inesquecíveis na sua história que temos a sorte de estar à assistir enquanto a escreve.

Programa de Sagan já confirmado: Tour Down Under (16 a 21 de Janeiro), Strade Bianche (3 de Março), Tirreno-Adriatico (7 a 13 de Março), Milano-Sanremo (17), E3 Harelbeke (23), Gent-Wevelgem (25), Volta a Flandres (1 de Abril), Paris-Roubaix (8), Volta à Califórnia (13 a 19 de Maio), Volta à Suíça (9 a 17 de Junho), Volta a França (7 a 29 de Julho).

Aqui ficam as imagens da primeira vitória do ano para Sagan, que bateu ao sprint André Greipel (Lotto Soudal) e Caleb Ewan (Mitchelton-Scott), que havia vencido as últimas duas edições da People's Choice Classic. A corrida é vista como um "aquecimento" para o Tour Down Under, que começa terça-feira e será a primeira do calendário World Tour. São 50 quilómetros intensos ou de "corrente bem esticadinha", como descreveu Tiago Machado (Katusha-Alpecin) no seu Twitter. Elia Viviani estreou-se com um quarto lugar na Quick-Step Floors, enquanto o antigo colega dos gémeos Oliveira na Axeon Hagens Berman, Christopher Lawless, foi sexto na primeira corrida pela Sky. Já o seu lançador, o norueguês Kristoffer Halvorsen, começou na nova equipa com uma aparatosa queda.
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