15 de outubro de 2019

Uma Volta a França de assustar o melhor dos trepadores

(Imagem: Le Tour de France)
Se a edição de 2019 foi das melhores em anos recentes, a organização do Tour resolveu deixar todos a sonhar com algo inacreditável para 2020. Uma coisa é certa, não se poderá dizer tão cedo que a Volta a França não tem as dificuldades de uma Vuelta por exemplo. Para o ano será montanha, mais um pouco de montanha e quando alguém pensar em descansar, terá mais um pouco de montanha para enfrentar antes de chegar a Paris.

A expressão de Caleb Ewan demonstrou perfeitamente o sentimento de um sprinter, mas diga-se que os candidatos à geral também não pareceram muito tranquilos com o que estavam a ver durante a apresentação desta terça-feira, em Paris. Sorrisos só da parte de Thibaut Pinot (um Tour à sua medida) e de Julian Alaphilippe. Romain Bardet também não tem razões de queixa. E sim, são todos franceses! Tom Dumoulin não esteve presente, mas não tem razões para sorrir, tal como Primoz Roglic (ambos serão colegas na Jumbo-Visma em 2020), é que a ASO apenas colocou um contra-relógio e... é a subir... e não é numa subida qualquer!

Começando precisamente por esta etapa, a penúltima. Não é uma crono-escalada pura, já que dos 36 quilómetros, uma boa parte são planos. Haverá a subida ao Col de la Chevestraye antes da La Planche des Belles Filles, um local que está cada vez mais a tornar-se uma referência no Tour. São cerca de seis quilómetros a 8,4% de média, com a fase final a chegar aos 14%. Para Pinot (Groupama-FDJ), que consegue defender-se bem no contra-relógio, ter um perfil de montanha beneficia-o, já para não falar de Bardet. O líder da AG2R é muito mau no esforço individual, mas talvez consiga minimizar perdas sendo a subir. E claro que há que recordar: esta é a penúltima etapa de um Tour que irá massacrar o melhor dos trepadores. Não haverá tempo para corrigir falhas. O dia seguinte é de consagração.

Haverá muito a pensar nas equipas sobre as escolhas a fazer, ainda mais quando se estará em ano de Jogos Olímpicos. O Tour até começará uma semana mais cedo, mas ainda assim, quem for até ao fim e quiser ir a Tóquio, só terá seis dias para recuperar. Vincenzo Nibali, por exemplo, é um ciclista que está inclinado a escolher o Giro e depois os Jogos Olímpicos, não indo a França. E não será de surpreender que mais ciclistas sigam o mesmo plano em 2020, mas as decisões deverão ser tomadas quando forem conhecidos os percursos da Volta a Itália e da corrida em Espanha. Principalmente do Giro.

Na Volta a França esperam ao pelotão nove etapas de montanha, seis finais em alto, num total de 29 subidas categorizadas. Há ainda três tiradas que a organização apelida de "acidentadas" e as restantes são consideradas planas, mas muitas terão pequenas armadilhas (atenção ao vento em algumas das tiradas). Estas poderão criar dificuldades às equipas que apostem no sprint em conseguir garantir que de facto os homens mais rápidos disputem as vitórias. Este poderá ser um Tour com muito menos sprinters do que o normal. Chegar a Paris será um inferno que nenhum deles alguma vez enfrentou. Até Peter Sagan poderá enfrentar mais dificuldades para continuar a senda de conquistas de camisolas verdes.

Algo pouco habitual no Tour, além de apenas um contra-relógio (nem um colectivo foi incluído), é existir uma etapa de montanha logo ao segundo dia. Se um sprinter pode vestir a camisola amarela no primeiro dia, também a perderá logo de seguida. Nice receberá duas etapas e o início da terceira. E para não se ter dúvidas que este é de facto um Tour diferente, só haverá uma etapa acima dos 200 quilómetros.

O norte de França não entra no percurso, mas regressa o Maciço Central. Os Pirenéus chegarão primeiro do que os Alpes e a ASO procurou incluir novas subidas, deixando de fora locais míticos como o Mont Ventoux e o Alpe d'Huez. Mas haverá o Col de la Madeleine, na 17ª etapa, considerada a rainha. Na descrição do director da corrida, Christian Prudhomme, lê-se: "Apenas um grande campeão poderá ganhar no Col de la Loze." É uma subida a 2304 mil metros de altitude, que se tornará no sétimo ponto mais alto da Volta a França. Será uma etapa em que os ciclistas vão procurar reconhecer muito bem antes, pois haverá muitas estradas que nunca foram passadas, incluindo uma via construída apenas para bicicletas que levará até Méribel. E no dia seguinte haverá mais de quatro mil metros de acumulado para fazer!

Entre a 16ª e 18ª etapa muito poderá ficar decidido, mas claro que o objectivo deste percurso é que a decisão vá até La Planche des Belles Filles. Num Tour tão difícil que até levou Chris Froome a dizer que nunca tinha visto nada assim, descrevendo-o como "brutal", será muito difícil a equipas como a Ineos e a Jumbo-Visma controlarem. São etapas que convidam a ataques, o que faz com que Julian Alaphilippe tenha gostado do percurso, com o ciclista da Deceuninck-QuickStep a garantir que não quer lutar pela geral, mas não se importará de repetir o brilharete de 2019, ganhando etapas e andando de amarelo.

Tanta dureza pode resultar em espectáculo, mas poderá haver algum cuidado nos primeiros dias, com as equipas e ciclistas a preocuparem-se em poupar forças a pensar que haverá muito sofrimento pela frente. Uma Volta a França como esta acaba por ser uma incógnita como será enfrentada e até levanta a dúvida de quem a quererá enfrentar.

À primeira vista, assenta bem aos colombianos de características de trepador, com Egan Bernal, o vencedor de 2019, à cabeça. Nairo Quintana poderá estar satisfeito com o que viu. Além dos francesas referidos, Pinot e Bardet, o espanhol Mikel Landa (que vai para a Bahrain-Merida) também gostará da muita montanha e do pouco contra-relógio. Chris Froome (Ineos) teria apreciado mais contra-relógio, tal como Dumoulin e Roglic. Steven Kruijswijk será uma aposta da Jumbo-Visma que talvez se adapte melhor. A Mitchelton-Scott tem os irmãos Yates para um percurso com esta dificuldade.

As etapas e a indicação do tipo de percurso: 

1ª etapa (27 de Junho): Nice - Nice (156 quilómetros, plana)

2ª etapa (28): Nice - Nice (187, montanha)

3ª etapa (29): Nice - Sisteron (198, plana)

4ª etapa (30): Sisteron - Orcière-Merlette (157, montanha)

5ª etapa (1 de Julho): Gap - Privas (183, plana)

6ª etapa (2): Le Teil - Mont Aigoual (191, montanha)

7ª etapa (3): Millaur - Lavaur (168, plana)

8ª etapa (4): Czères-sur-Garonne - Loudenvielle (140, montanha)

9ª etapa (5): Pau - Laruns (154, montanha)

Dia de descanso em La Charente-Maritime (6)

10ª etapa (7): Îled'Oleron - Île de Ré (170, plana)

11ª etapa (8): Châtelaillon-Plage - Poitiers (167, plana)

12ª etapa (9): Chauvigny - Sarran (218, acidentada)

13ª etapa (10): Châtel-Guyon - Puy Mary (191, acidentada)

14ª etapa (11): Clermont-Ferrand - Lyon (197, acidentada)

15ª etapa (12): Lyon - Grand Colombier (175, montanha)

Dia de descanso em Isère (13)

16ª etapa (14): La-Tour-du-Pin - Villard de Lans (164, montanha)

17ª etapa (15): Grenoble - Méribel Col de la Loze (168, montanha)

18ª etapa (16): Méribel - La Roche-sur-Foron (168, montanha)

19ª etapa (17): Bour-en-Bresse - Champagnole (160, plana)

20ª etapa (18): Lure - La Planche des Belles Filles (36, contra-relógio)

21ª etapa (19): Mantes-la-Jolie - Paris (122, plana)



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