27 de maio de 2018

E para terminar o Giro...

(Fotografia: Giro d'Italia)
Volta a Itália de reviravoltas, de enormes quebras físicas de vários ciclistas, da revelação de Richard Carapaz, da confirmação de Miguel Ángel López, de um Tom Dumoulin a mostrar que a vitória no Giro100 não foi por acaso e de um Chris Froome de carácter. Foi uma corrida interessante, ainda que muita da acção ficasse guardada mais para os finais de etapa. Simon Yates foi dos que mais espectáculo deu, mas será sempre aquela etapa 19 de Froome que será recordada neste Giro. Não foi só a melhor (além de inacreditável) desta edição, mas uma das melhores exibições de sempre. Aqui ficam as individualidades analisadas dentro das exibições das equipas. Afinal, o ciclismo é um desporto colectivo, ainda que no final seja um nome a ficar gravado na história. Desta feita, Chris Froome, o primeiro britânico a ganhar a Volta a Itália, além de ter entrado no restrito grupo dos que ganharam as três corridas de três semanas e no ainda mais restrito grupo de quem as conquistou de forma consecutiva.

Sky: Parecia  que havia uma espécie de maldição a afectar a equipa no Giro. Bradley Wiggins, Richie Porte, Mikel Landa, Geraint Thomas, todos foram para a vencer e não saíram com grandes recordações. Não foi a equipa dominadora de outros tempos e foi quase à vez que ia aparecendo alguém a tentar ajudar Chris Froome. Kenny Elissonde foi dos mais regulares numa primeira fase, Sergio Henao teve altos e baixos e Wout Poels apareceu no fim. E na altura certa. A Sky cumpriu o objectivo de ganhar o Giro, vendo o seu líder demonstrar grande carácter ao enfrentar todas as suspeitas, todas as contrariedades que lhe foram surgindo neste Giro. Foi dado como fora da luta pela vitória, até se especulou sobre um possível abandono. Chegou a Roma de rosa depois de uma etapa que ficará para a história: 80 quilómetros em solitário na etapa rainha da corrida. E não esquecer que conquistou também o Zoncolan. Foi uma Sky q.b. para ganhar em Itália e leva ainda a classificação colectiva e Froome venceu também a da montanha.

Astana: Faltou a etapa e a certa altura pareceu que o Giro iria ser uma desilusão. A aposta em Miguel Ángel Lopez era total, mas o colombiano não começou nada bem. Porém, há que elogiar a reacção do colombiano que o levou ao terceiro lugar. Não baixou os braços, foi subindo na classificação, tirou a camisola branca a Richard Carapaz e entrou numa interessante luta com o equatoriano e, com uma ajuda das quebras de Simon Yates, Fabio Aru e Thibaut Pinot, chegou ao desejado pódio. Pello Bilbao confirmou as expectativas e foi além de ser um bom apoio para López. O espanhol fechou em sexto. Tem sido das equipas mais ganhadoras este ano, mas mesmo sem uma vitória de etapa, a Astana tem razões para ficar satisfeita com o seu Giro. Agora "só" falta encontrar um maior equilíbrio para López. Já se sabia que tinha capacidade para terminar bem as grandes voltas, mas não pode começar a perder tanto tempo.

(Fotografia: Giro d'Italia)
Bora-Hansgrohe: Nota muito positiva para a equipa alemã que não tinha nenhuma das suas grandes estrelas na corrida, pois essas ficam guardadas para o Tour. Há um ano a equipa começou o Giro com uma vitória de etapa e ainda levou as camisolas todas nesse dia. Desta feita foi brilhando durante toda a corrida. Sam Bennett finalmente ganhou numa grande volta e logo por três vezes, incluindo a última etapa, em Roma. Patrick Konrad mostrou que está a atingir uma maturidade que o poderá levar para outro tipo de apostas mais ambiciosas (foi sétimo, a 13:01). Já Davide Formolo provoca um misto de satisfação e frustração. A queda no Etna atirou-o para fora de uma luta pelos lugares cimeiros, mas o italiano não desistiu e foi ainda fechar o top dez, a 15:16.

Sunweb: Levou uma equipa muito jovem para apoiar Tom Dumoulin, o vencedor do Giro no ano passado. Se em alguns momentos poderia ter beneficiado de maior ajuda, não foi por isso que não ganhou a corrida. Sam Oomen confirmou o que se esperava dele. Aos 22 anos é um voltista em formação e como gregário fechou na nona posição, a 14:18! Dumoulin foi dos ciclistas do top dez que foi mais regular. Ganhou a primeira etapa, desceu para segundo no dia seguinte e não mais saiu daquela posição. Terminou a 46 segundos de Froome e ficará sempre a sensação que poderia ter chegado à segunda vitória. Esteve abaixo do seu nível no contra-relógio, esteve muito melhor na montanha, mas perdeu tempo nas descidas na 19ª etapa, a tal em que Froome fez história. Ainda assim, foi um bom Giro. Agora é esperar para ver se Dumoulin irá ao Tour, ou se "saltará" para a Vuelta. Seria estranho se repetisse o calendário do ano passado, quando só fez a Volta a Itália.

AG2R: Pouco se falou desta equipa, ainda que tenha colocado um ou outro ciclista em fugas. Porém, Alexandre Geniez esteve a bom nível, fechando na 11ª posição, a 17:30. O objectivo da AG2R é 100% o Tour e Geniez irá estar ao lado de Romain Bardet, pelo que não surpreendeu esta postura mais discreta.

Movistar: Carlos Betancur teve a oportunidade que pediu para liderar a equipa, mesmo que soubesse que Richard Carapaz teria também liberdade para perseguir um bom resultado. O colombiano não aproveitou, tendo sido muito irregular e nem no top dez fechou (foi 15º, a 41:48). Não será fácil para Betancur voltar a ter este papel porque já não bastava estar numa equipa fortíssima, ainda viu aparecer a nova estrela. Carapaz venceu uma etapa, andou de camisola branca, lutou até ao fim por ela e ainda foi fazer um brilhante quarto lugar na geral, a 5:44 de Froome. E esta foi apenas a sua segunda grande volta.

Lotto-Jumbo: Cumpriu. Talvez se esperasse um pouco mais de George Bennett que raramente conseguiu andar com os melhores. Porém, foi oitavo (a 13:17) e o top dez era o primeiro objectivo. Enrico Battaglin deu uma vitória de etapa, já Danny van Poppel não consegue discutir sprints com os melhores. Depois de ter visto escapar o Giro há dois anos quando Steven Kruijswijk caiu perto do final, a equipa holandesa coloca grandes esperanças em Bennett e não tem razões para as perder.

Uma imagem que marcou o Giro na etapa do Etna. Mas Chaves e Yates acabariam
por ter enormes quebras ((Fotografia: Giro d'Italia))
Mitchelton-Scott: Cinco vitórias de etapa (empate com a Quick-Step Floors), 12 dias de camisola rosa... O Giro tinha tudo para ser de sonho não fosse ter escapado. Será difícil não ver esta corrida assim. Simon Yates foi fenomenal e nem a quebra de Johan Esteban Chaves no início da segunda semana estragou tanto os planos da equipa como se chegou a temer. Mas três semanas pedem regularidade. Quase todos os candidatos tiveram maus dias. Mas Chaves e Yates tiveram uns péssimos. A Mitchelton-Scott pensou que o trabalho de transformação para uma equipa que pode vencer uma grande volta seria premiado em Itália, mas afinal ainda há muito a aprender, principalmente a compreender o que aconteceu aos seus dois líderes. São dois excelentes ciclistas, que estiveram rodeados por outros que até ao descalabro de Yates estavam a formar a melhor equipa no Giro. Yates ficou a mais de uma hora de Froome e Chaves a mais de três e até foi dobrado o último dia, no circuito de Roma. Ficam as vitórias nas etapas, três de Yates, uma de Chaves e outra de Nieve. Neste aspecto, foi excelente e a formação australiana tem de estar orgulhosa, pois não se esperava tanto.

UAE Team Emirates: De equipa teve pouco, Fabio Aru andou em esforço praticamente desde o primeiro dia e teve pouca ou nenhuma ajuda. Foi mais um dos que simplesmente apagou no Giro e depois de mostrar uma grande reacção no contra-relógio, afinal tinha andado atrás de uma moto. Acabaria por abandonar a corrida e a equipa sai sem qualquer ponto de nota nesta corrida, como aliás tem sido basicamente toda a temporada. E o pior, é que nem surpreendeu. Aru chegou ao Giro sem convencer na preparação e confirmou que não estava nada bem. A UAE Team Emirates vai estar sobre enorme pressão no Tour, dado o alto investimento que foi feito e que não está a ser traduzido em vitórias.

Groupama-FDJ: Faltava uma etapa para a equipa justificar a aposta em levar Thibaut Pinot a Itália, que até preferia estar concentrado no Tour. No entanto, diga-se, que é o Giro que parece assentar-lhe melhor. No ano passado ficou à porta do pódio. Este ano estava lá e quando se pensava que teria "apenas" de se defender de Miguel Ángel López para cumprir o objectivo, Pinot também quebrou. Foi de tal forma que acabou o dia no hospital e nem partiu para a etapa de Roma. Começou bem, fraquejou um pouco, recuperou e depois acabou tudo mal. De referir que também não foi bonito ver como Pinot agiu na etapa 19, não ajudando Tom Dumoulin na perseguição a Froome, quando o seu companheiro, Sebastien Reichenbach não tinha forças para o fazer. Giro perdido para a Groupama-FDJ.

Bahrain-Merida: Domenico Pozzovivo viu escapar-lhe o pódio. Este pequeno italiano, de 35 anos, deu mostras de estar num dos seus melhores momentos da carreira. Acabou por ser sempre muito defensivo e a ligeira quebra (comparado com a de outros) na 19ª etapa custou-lhe o terceiro lugar. Um pouco mais ambicioso e assumindo algum risco em certos dias e Pozzovivo poderia ter terminado num sonhado pódio. Matej Mohoric deu uma vitória de etapa e para uma equipa sem o seu líder, Vincenzo Nibali, mesmo com Pozzovivo fora dos três primeiros (foi quinto, a 8:03), a Bahrain-Merida sai do Giro com nota mais.

Androni-Sidermec-Botecchia: Depois de ficar sem convites para o Giro, a equipa resolveu a questão ganhando a Taça de Itália e garantindo assim a presença. E ainda bem. É de facto uma equipa que anima etapas, sempre ao ataque. Pode não ter conseguido a vitória, mas não passou de todo despercebida e foi a melhor entre as Profissionais Continentais.

Dimension Data: A difícil temporada que está a ter poderia ter recebido uma dose de motivação se o jovem Ben O'Connor tem conseguido terminar a corrida no top 15. No entanto, caiu e abandonou. O Giro foi assim uma desilusão. Louis Meintjes começou mal, foi piorando, melhorou ligeiramente... e abandonou. Igor Anton ainda tentou repetir a vitória no Zoncolan, mas não conseguiu e... abandonou. Esta equipa precisa urgentemente de bons resultados. O seu melhor ciclista foi Ben King a mais de duas horas do vencedor.

BMC: Rohan Dennis até esteve bem melhor do que se esperava. Por momentos sonhou com o top dez. Foi 17º, a 56:07. Este australiano demonstrou novamente que está longe de ser um voltista que possa lutar por vitórias. Aposta perdida e só não se pode dizer que o Giro foi também perdido porque Dennis venceu o contra-relógio e andou de rosa. Mas para uma das melhores equipas do pelotão internacional, soube a muito pouco.

Katusha-Alpecin: Numa perspectiva nacional, José Gonçalves esteve muito, muito bem. Apareceu diferente do esperado. Ganhar uma etapa era um objectivo, mas depois do excelente arranque (quarto no contra-relógio inaugural), o português foi extremamente regular, sem quebras grandes e isso valeu-lhe um excelente 14º lugar, a 34:29. Contudo, na perspectiva da equipa, é pouco. Ver Tony Martin fazer um dos melhores contra-relógios desde que assinou pela estrutura não chega, já que não ganhou. Alguns ciclistas entraram numa ou outra fuga, mas sem resultados. José Gonçalves salvou a honra da Katusha-Alpecin, que é mais uma equipa a precisar desesperadamente de resultados.

EF Education First-Drapa p/b Cannondale: Michael Woods falhou no objectivo do top dez, Sacha Modolo falhou nos sprints, Hugh Carthy continua sem confirmar expectativas... Giro negativo para a equipa americana.

Trek-Segafredo: Também pouco se pode dizer da outra estrutura dos Estados Unidos. Nem Gianluca Brambilla, nem Jarlison Pantano (uma das grandes desilusões)... Nada correu bem e não surpreende que esta seja uma das equipas que está mais atenta ao que se passa no mercado na procura de reforços, com um líder para as três voltas à cabeça. E bem precisa.

(Fotografia: Giro d'Italia)
Quick-Step Floors: Cinco vitórias de etapas (quatro por Elia Viviani e outra por Max Schachmann), a classificação dos pontos... Este ano não houve a da juventude como em 2017 - Bob Jungels vai desta feita ao Tour -, mas sendo a aposta principal no seu sprinter, só se pode dizer uma coisa: que equipa fenomenal! Perder para Sam Bennett em Roma, na etapa final, não terá deixado Viviani muito satisfeito, contudo, a senda continua. A Quick-Step Floors vai com 36 vitórias em 2018.

Israel Cycling Academy: Não deixa de ser uma desilusão. A equipa israelita reforçou-se a pensar no mais que provável convite para o Giro, já que o início seria no seu país. Ben Hermans ficou muito aquém do que pode fazer, enquanto Ruben Plaza apostou tudo numa etapa, mas foi segundo. Kristian Sbaragli nem se viu nos sprints e Guillaume Boivin acabou por ser dos que mais se viu, ao estar nas fugas nos primeiros dias. O letão Krists Neilands, vencedor da juventude na Volta a Portugal, também pouco se viu. Fica para história Guy Sagiv, o primeiro israelita a terminar uma grande volta. 

Lotto Fix ALL: Tim Wellens começou bem, ganhou uma etapa, avisou que não queria lutar pelo top dez (tem potencial para ambicionar mais, mas é a sua escolha), mas acabou por abandonar e a equipa desapareceu. No entanto, missão foi cumprida com a vitória de Wellens e Adam Hansen terminou a 20ª grande volta consecutiva.

Bardiani-CSF: Tinha muito a provar depois de há um ano ter visto dois ciclistas serem excluídos por doping no dia antes do Giro100. Recebeu novamente o convite este ano, o que não deixou de ser surpreendente. Mas há que referir que os seus corredores mostraram merecê-lo. Enrico Barbin começou por andar nas fugas e vestido com a camisola da montanha. Quando vieram as principais etapas apareceu a futura estrela italiana (pelo menos assim promete): Giulio Ciccone. Não conseguiu a etapa, nem a classificação da montanha (foi segundo), mas bem tentou.

Wilier Triestina-Selle Italia: Ter Filippo Pozzato e uns patrocinadores fortes, ajuda a que esta equipa não falhe os Giros. Mas se já com a sua estrela a equipa pouco faz para merecer os convites, sem ela... Pozzato anunciou que não iria ao Giro pouco antes do início, devido a um problema de saúde do pai. Sobrou Jakub Mareczko. O sprinter cumpriu, estando nas disputas. Fez mais um segundo lugar, mas foi para casa na etapa nove. É uma equipa que pouco ou nada traz de mais valia à corrida.



As classificações finais via ProCyclingStats.


»»A vitória mais bonita e brutal««

»»A batalha mais esperada afinal vai mesmo acontecer««

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