16 de janeiro de 2017

O que esperar dos portugueses no World Tour

A lista vai aumentando. Portugal está cada vez mais na rota dos melhores olheiros mundiais e os ciclistas portugueses vão tendo oportunidades para se mostrarem ao mais alto nível. A maior referência dos últimos anos, Sérgio Paulinho, saiu, assim como Mário Costa, que optou por terminar a carreira, depois de ter estado ao lado do irmão, Rui Costa, na Lampre-Merida. Porém, em 2017 entram quatro novos ciclistas. José Gonçalves era um corredor que há muito se esperava que chegasse ao World Tour, o trabalho de José Mendes na Bora-Argon 18 foi recompensado com um contrato, numa altura em que a equipa resolveu subir de escalão. E depois teremos dois jovens de grande talento: Ruben Guerreiro e Nuno Bico.

O que podemos esperar dos oito portugueses que este ano estarão no World Tour?

André Cardoso (32 anos, Trek-Segafredo)
(Fotografia: Trek-Segafredo)
Depois de três anos na estrutura da Cannondale, o ciclista de Gondomar optou por um novo desafio. André Cardoso tornou-se numa peça importante na equipa americana, sendo um homem de confiança para os líderes da equipa, evoluindo ao lado de nomes como Rigoberto Uran, Ryder Hesjedal e Daniel Martin. No entanto, o ciclista português entendeu que estava na altura de mudar e provavelmente escolheu um excelente momento. 

Enquanto a Cannondale luta para conseguir alguma estabilidade, faltando à equipa resultados em provas importantes, André Cardoso assinou por uma equipa com uma confiança e bolsa renovada. A também americana Trek-Segafredo reforçou-se com grandes nomes como Alberto Contador e John Degenkolb.

André Cardoso deverá tornar-se num dos homens de trabalho do espanhol e as características do português poderão ser de grande importância para um Contador 100% concentrado em ganhar a Volta a França. Para Cardoso, um gregário por excelência, será o reconhecimento da sua qualidade e a oportunidade de estar ao lado de um dos melhores ciclistas do mundo. No entanto, sendo esse gregário de luxo, será difícil ver André Cardoso ter muitas oportunidades para mostrar que também ele pode conquistar uma vitória, já muito merecida, no World Tour. Os dois top 20 na Vuelta e um no Giro comprovam que é um ciclista que poderia ir mais longe. Mas o seu papel, de salientar novamente que será de grande importância, será estar ao lado do líder.

José Gonçalves (27 anos, Katusha-Alpecin)
(Fotografia: Katusha-Alpecin)
É caso para dizer: até que enfim! Há algum tempo que esta entrada no World Tour por parte de José Gonçalves era aguardada. O ciclista esperou pelo momento que considerou ser o ideal. Depois de dois bons anos na francesa La Pomme Marseille e dois ainda melhores na Caja Rural (aquela Vuelta de 2015 será difícil de esquecer, na qual tanto lutou por uma etapa), o gémeo resolveu finalmente dar o salto, aproveitando o convite da Katusha-Alpecin, que agora tem como director José Azevedo.

O José Gonçalves de ataque, sempre a querer mostrar-se e lutar por uma vitória, poderá agora tornar-se num José Gonçalves mais trabalhador em prol de um líder. No entanto, o próprio admitiu, numa conversa com o Volta ao Ciclismo, que espera ter oportunidades na Katusha. Com apenas um ano de contrato, o ciclista português sabe que não há margem para erros se quiser manter-se no World Tour.

Uma coisa é certa: José Gonçalves é um lutador que não vira a cara a um desafio. Poderá não ter a liberdade que teve nas equipas por onde passou no passado, mas seria muito estranho se não o víssemos ao ataque, sempre que surgir uma oportunidade para tal... e tiver autorização.

José Mendes (31 anos, Bora-Hansgrohe)
(Fotografia: Bora-Hansgrohe)
Dificilmente 2017 poderia começar mais perfeito. Foram quatro anos de trabalho na estrutura Profissional Continental alemã, que no ano passado tinha o nome de Bora-Argon 18, que foram recompensados, justamente, com a subida com a equipa ao escalão máximo do ciclismo. E mais: José Mendes chega a este ponto alto da carreira vestindo a camisola de campeão nacional, de que tanto se orgulha. Mas os pontos positivos continuam. A agora Bora-Hansgrohe é desde já uma equipa muito popular, pois afinal conta com a grande estrela do ciclismo Peter Sagan e com um grupo de ciclistas de grande qualidade.

Na Volta a Espanha de 2016 José Mendes teve a oportunidade de liderar a equipa. Agora sabe que será mais difícil ter esse papel com a entrada de Rafal Majka e o regresso de Leopold König. No entanto, ao português espera um papel importante de apoio aos líderes. Precisamente por ser um ciclista muito regular e de confiança (cumpre à risca o que lhe é pedido), a equipa conta com ele para estar nos grandes momentos, quando os líderes mais precisarem.

O ciclista de Guimarães mostrou-se desde cedo entusiasmado por competir ao lado de algumas das principais figuras da actualidade no ciclismo, não se importando perder algum do estatuto que tinha até agora na equipa. Os objectivos são outros, mas nem por isso menos ambiciosos. Um deles é estar na Volta a Itália.

Nelson Oliveira (27 anos, Movistar)
(Fotografia: Movistar)
A expectativa para ver até onde pode ir Nelson Oliveira é grande. No ano passado foi notória a evolução do ciclista, principalmente no contra-relógio, a sua especialidade. Mas logo no primeiro ano na Movistar, Nelson Oliveira ganhou a confiança de Eusebio Unzué, com o director desportivo a colocá-lo na equipa na Volta a França, no apoio a Nairo Quintana. Foi dos poucos que pode dizer que cumpriu o seu trabalho como lhe foi pedido e ainda subiu ao pódio no contra-relógio.

Além dessa especialidade, Nelson Oliveira deverá ter novamente a oportunidade para se mostrar nas clássicas. Em 2016 caiu no Paris-Roubaix e acabou por ter de parar umas semanas. Porém, o ciclista português quer estar na luta por bons resultados nas provas de um dia e será de esperar vê-lo em boa forma em Março e Abril.

Ainda tem muita margem de progressão, pelo que a Movistar certamente que quererá explorar e trabalhar todas as qualidades de Nelson Oliveira, até porque perdeu alguns ciclistas importantes, o que abriu "vagas" para que o português assuma cada vez mais um papel de maior relevância na equipa espanhola.

Nuno Bico (22 anos, Movistar)
(Fotografia: Movistar)
Foi preciso esperar quase até ao final do ano para conhecer o destino de Nuno Bico. Mas a notícia não podia ter sido melhor: aos 22 anos chega ao World Tour e na Movistar, uma das equipas mais fortes do pelotão internacional. Um contrato mais do que merecido para um jovem de grande potencial e que em 2016 evoluiu na Klein Constantia, equipa de sub-23 da Etixx-QuickStep, que entretanto foi extinta. Não "subiu" à equipa belga, mas estará ao lado de Nelson Oliveira, o que também poderá ser muito importante para sua adaptação ao mais alto nível do ciclismo.

Nuno Bico tem tudo para ser uma aposta de futuro na Movistar e, por isso, é possível que não se veja muito do português em grandes corridas. O seu calendário apresenta para já a participação em troféus espanhóis. Eusebio Unzué claramente quer ter calma com Nuno Bico. Este primeiro ano será mais de aprendizagem, mas se tudo correr bem é possível que vá aos poucos sendo chamado para competições mais importantes.

Sendo um jovem com grande potencial principalmente para corridas de um dia, a Movistar terá esperança em formar um ciclista para essas provas (Valverde vai durando, mas eventualmente irá retirar-se). Porém,  Nuno Bico também já demonstrou potencial para corridas por etapas. Vamos ver como evolui um ciclista que promete.

Ruben Guerreiro (22 anos, Trek-Segafredo)
(Fotografia: Trek-Segafredo)
É considerado por alguns meios de comunicação da especialidade como um dos jovens a seguir em 2017. O campeão nacional de sub-23 aproveitou muito bem os dois anos que esteve na Axeon Hagens Berman, sob o comando de um Axel Merckx que tem um toque de Midas no que diz respeito em escolher jovens com talento e ajudá-los a chegar ao World Tour. No final da época teve um problema físico e perante o passo importante que se preparava para dar, houve grande preocupação em garantir que o ciclista recuperasse a 100%, não tendo ido aos Mundiais, por exemplo.

Ao contrário de Nuno Bico, Ruben Guerreiro vai ser desde logo aposta da Trek-Segafredo em provas importantes, a começar desde já pelo Tour Down Under, tendo também no seu calendário o Paris-Nice e a Volta à Califórnia. Estas corridas demonstram que a equipa americana vê o potencial que o ciclista tem para as provas por etapas, ainda que não seja de afastar que se o possa ver numa clássica.

Em conversa com o Volta ao Ciclismo, Axel Merckx afirmou que acredita que trabalhando, Ruben Guerreiro pode vingar no World Tour, tendo ainda muito a evoluir, como por exemplo fisicamente, sendo "um pouco frágil". No entanto, não tens dúvidas: "Ele é um dos maiores talentos que está aí."

Rui Costa (30 anos, UAE Abu Dhabi)
(Fotografia: Facebook de Rui Costa)
2017 poderá marcar uma nova fase na carreira de Rui Costa. Pela primeira vez vai fazer a Volta a Itália, deixando o Tour de ser o principal objectivo no que diz respeito a provas de três semanas. Depois de tanta incerteza quanto ao futuro da equipa, o campeão do mundo de 2013 revelou um discurso confiante, o que deixa também alguma expectativa para as clássicas, nomeadamente a sua preferida, a Liège-Bastogne-Liège que no ano passado Wout Poels "não o deixou" ganhar.

Não se sabe se aparecerá no Giro para lutar pela geral ou por etapas, mas tendo em conta que a equipa continua a ter o mesmo problema dos últimos anos - falta de ciclistas para ajudar de forma eficiente o seu líder durante toda a competição - não seria de estranhar se Rui Costa apostasse mais em tentar conquistar pelo menos uma etapa e inscrever assim o seu nome na 100ª edição da Volta a Itália, algo que a própria equipa deve desejar muito, pois terá também Diego Ulissi com esse objectivo.

Rui Costa está com "fome" de vitórias e com Louis Meintjes a ficar com o lugar de líder para o Tour, não significa que o português esteja em segundo plano, muito pelo contrário, tem uma oportunidade para procurar outras conquistas, já que continua a ser um dos "chefes-de-fila" da agora formação do Médio Oriente.

Tiago Machado (31 anos, Katusha-Alpecin)
(Fotografia: Katusha-Alpecin)
Renovou pela Katusha e irá começar o ano como líder no Tour Down Under. Porém, Tiago Machado irá manter em grande parte da temporada o seu papel de gregário e aguardar pelos momentos em que lhe for dada liberdade. É um ciclista que procura uma vitória no World Tour e mesmo sabendo que terá de trabalhar para um líder, Tiago Machado mantém a ambição de alcançar o objectivo, como ficou claro na última Volta a Espanha em que tentou através de fugas chegar a essa vitória.

A sua passagem pela Katusha, vai agora para a terceira época, tem sido marcada por uma clara conquista de maturidade. Pode ter perdido alguma daquela espontaneidade que o levavam a atacar em várias corridas - nem sempre na melhor altura, mas lá espectáculo sabia dar -, contudo, a sua evolução táctica é notória. Com alguma liberdade poderemos ver aquele Tiago Machado de ataque, mas na equipa agora liderada por José Azevedo, são as qualidades de gregário que mais têm sido exploradas e o português poderá assumir um papel importante talvez ao lado de Ilnur Zakarin.

E o próprio admitiu ao Volta ao Ciclismo um pormenor interessante: as suas melhores temporadas foram sempre quando teve um português ao seu lado. Terá José Gonçalves. Dois homens de ataque. Dois homens para o espectáculo. Só se poderá esperar (e desejar) que a Katusha lhes dê oportunidades para brilharem.

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