27 de setembro de 2018

O novo Merckx? Não. É o novo Remco Evenepoel, um nome a não esquecer

(Fotografia: © BettiniPhoto/Facebook Mundiais de Innsbruck-Tirol)
Se nasceu uma estrela, então não nasceu o novo Eddy Merckx. Nasceu Remco Evenepoel, um belga que transformou uma corrida de juniores numa emocionante prova, que deixou a elite fascinada com um jovem de 18 anos, que não esperou para vestir as cores da Quick-Step Floors para mostrar o que se irá ver a partir de 2019. Cair, ficar a dois minutos ou mais da frente da corrida, recuperar num autêntico contra-relógio e ainda ir ganhar com quase minuto e meio de vantagem, não é para qualquer um, mesmo que se esteja a falar de um júnior. E o melhor é que nem foi por acaso (nem uma total surpresa) que fez esta tremenda exibição. Até já era expectável algo do género, tendo em conta os resultados de um ciclista cujo o nome é melhor memorizar desde já.

Estamos a falar de um corredor que está num nível tão acima a muitos do seu escalão, que basicamente ganhou todas as corridas internacionais em que participou em 2018. Em termos de camisolas, ficou com as de campeão belga de contra-relógio e fundo, com as de campeão europeu de contra-relógio e fundo e, para não destoar, ficou agora com as de campeão mundial de contra-relógio e fundo. Não é o típico belga para as clássicas - ainda que também some vitórias neste tipo de provas - e foi peremptório em afirmar que quer ganhar as três grandes voltas.

Quando um ciclista com potencial aparece assim na Bélgica, a tendência é apelidá-lo de novo Merckx. Remco não é o primeiro e não será certamente o último. Tem apenas 18 anos, mas uma personalidade bem forte. "Não me chamem de novo Merckx. Eu sou o novo eu", disse depois de ser campeão mundial de contra-relógio, com autoridade (deixou o australiano Luke Plapp a 1:24 minutos). Agora também já tem o título de estrada, pelo que o nome de Merckx vai certamente surgir mais umas vezes quando se falar deste jovem, mas Evenepoel conseguiu que já se começasse a falar do Remco, do talento que é e de como a Bélgica poderá estar perante o próximo grande voltista.

E já lá vai um tempo desde que o país tem um ciclista que com esta idade estivesse a ser apontado às provas por etapas e não às clássicas. Axel Merckx, o filho do "Canibal", conversou com Evenepoel para o levar para a sua Hagens Berman Axeon, mas este é um ciclista que não vai esperar para dar o passo para o World Tour. A Quick-Step Floors não deixou.

Ainda há uns dias aqui se falou sobre como vários jovens preferem evoluir em equipas de sub-23, algumas do escalão Profissional Continental, antes de partirem para a aventura do nível máximo do ciclismo. Mas há ciclistas que é impossível esperar. Remco tem ainda um caminho a percorrer antes de estar lado a lado com os melhores do mundo na elite, a disputar as grandes vitórias. Irá para uma equipa que trabalhará com Remco, na sua evolução, tendo como colegas alguns dos melhores "professores" que se poderia pedir. Philippe Gilbert, por exemplo, foi um dos que reagiu à vitória do jovem compatriota nas redes sociais e poderá ter uma palavra importante no desenvolvimento deste ciclista.

Dificilmente as expectativas poderiam ter ficado mais altas para Remco Evenepoel, mas há que gozar o momento que está a viver e depois resfriar os ânimos, ter os pés bem assentes na terra, para que possa de facto tornar-se no ciclista que demonstra ter o potencial para ser.

Um futebolista, internacional belga nas camadas jovens, que passou pelas escolas do Anderlecht e chegou a viajar até à Holanda para treinar na formação do PSV. O futebol não o preencheu como desportista e no ano passado fez a passagem total para o ciclismo. Chegou tarde, mas mais do que a tempo para se tornar num corredor de enorme futuro. Agora é esperar e ir aproveitando todo o espectáculo que possa dar. Sim, este ciclista é para o espectáculo e para ganhar.

A Quick-Step Floors até pode ser uma equipa mais dada às clássicas, mas se já tem ciclistas que estão a pedir uma adaptação às corridas de três semanas se não os quiser perder (Enric Mas foi terceiro na Vuelta e Bob Jungels também começa a pedir mais apoio), Remco poderá ser o corredor que dará de vez à equipa belga a motivação para se tornar numa equipa também para as grandes voltas. E para a geral, não "apenas" para as etapas.

Na elite não se espera que mantenha o ritmo de vitórias, mas se continuar a somar muitos e grandes triunfos, poderá não ser apelidado de novo Merckx - se for respeitado o seu desejo de não o tratarem assim -, mas será quase impossível escapar ser tratado como o novo "Canibal", ou seja, herdará pelo menos a alcunha.

Quedas e muita emoção


O seleccionador José Poeira com Guilherme Mota
(Fotografia: Federação Portuguesa de Ciclismo)
As quedas foram muitas e terão sido poucos os ciclistas que conseguiram escapar incólumes. Os portugueses Guilherme Mota e Afonso Silva foram apanhados em confusões, mas o primeiro conseguiu um excelente resultado: 16º lugar, a 6:41 de Evenepoel. Afonso ficou a 19 minutos, na 79ª posição, tendo ficado "cortado" numa das muitas quedas, o que o impediu de alcançar um resultado melhor.

Foi uma corrida feita a grande velocidade, com tantos incidentes a obrigar a constantes recuperações. Não havia tempo para respirar, com algo sempre a acontecer. "A primeira parte da corrida, até à primeira subida, foi muito rápida. Houve duas quedas e em ambas as ocasiões tive de recolar ao pelotão e é um pelotão de loucos. Nessa parte da corrida, a rolar a alta velocidade, não me ia a sentir nada bem, porque sou muito leve. Depois entrámos nas três subidas do dia. Aí senti-me espectacular. Tive pena de não estar no máximo, devido ao sofrimento inicial, porque acho que poderia fazer um lugar ainda melhor", afirmou Mota, citado pela Federação Portuguesa de Ciclismo.

Foi uma experiência internacional de fogo para ambos os jovens portugueses e para todos os restantes. Que o diga Karel Vacek, o checo que tanto se esperava ver no pódio, mas que um problema físico o atirou para fora da discussão. O alemão Marius Mayrhofer não teve andamento para Remco. Ninguém teve. Mas Mayrhofer mereceu a prata, ele que para o ano estará na equipa de formação da Sunweb. Já o bronze ficou para um italiano. Alessandro Fancellu salvou a honra daquele país, que conseguiu ter quatro ciclistas na frente, sem que nunca trabalhassem em equipa. Que forma estranha de encarar a corrida, com os italianos a atacarem-se uns aos outros (resultados completos neste link).

Áustria conseguiu um título

O país anfitrião podia não ter grandes favoritos às vitórias, mas do BTT chegou uma campeã do mundo, há poucos dias, para conquistar mais um título, agora na estrada. E foi apenas a sua segunda corrida de estrada! Laura Stigger vive a cerca de 50 quilómetros da zona onde se estão a disputar os Mundiais, em Innsbruck. Apesar do BTT ser a sua principal escolha, por agora, Stigger aproveitou a proximidade para treinar no percurso determinado para a corrida de juniores femininos. Conhecia bem as subidas e apesar de não ter muita prática na vertente, esse conhecimento foi determinante, pois reservou as forças necessárias para ganhar o sprint final, frente a três adversárias. A francesa Marie le Net e a canadiana Simone Boilard fecharam o pódio (resultados completos neste link).

Dois títulos mundiais num curto espaço de tempo, com Stigger a admitir que, por enquanto, o BTT será a sua escolha, mas depois de uma conquista como esta, a estrada poderá começar a chamá-la.

Esta sexta-feira, os sub-23 regressam à acção para a corrida de fundo. É uma prova só para os homens (não há este escalão na vertente feminina), com Portugal a contar com quatro ciclistas: André Carvalho, Gonçalo Carvalho, João Almeida e Tiago Antunes. A corrida começa às 11:10 (hora portuguesa), com transmissão no Eurosport (pode ler mais no link em baixo).

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