21 de novembro de 2016

Tinkoff. No ano do adeus “esqueceram-se” do que é ser uma equipa. Salvou-se o inevitável Peter Sagan

(Fotografia: Facebook Tinkoff)
A equipa que não era mais do que um brinquedo para quem tem dinheiro acabou por ser vítima também dos caprichos de um dono que achava que estava no ciclismo para ser rei e senhor da modalidade. Amuado como qualquer criança, Oleg Tinkov fartou-se de ver a UCI, ASO e outros responsáveis ignorar as suas ideias e anunciou que ia abandonar o ciclismo. Talvez se se tivesse mantido pelas que até fazem sentido – como as equipas terem direito a uma fatia dos direitos televisivos – e não andar querer fazer do ciclismo um desporto com bancadas pagas para os adeptos e Tinkov poderia ter sido levado mais a sério. A sua excentricidade acabou também por se ressentir dentro da própria equipa que este ano foi tudo menos… uma equipa. Alberto Contador e Peter Sagan estiveram basicamente por sua conta, mas se o eslovaco tem capacidade para se “desenrascar” e teve um ano sensacional, já o espanhol enfrentava uma missão impossível, pois fazer frente a Froome e uma Sky ou Quintana e a uma Movistar sozinho…

O anúncio de Tinkov surpreendeu e fomentou ainda mais a divisão na equipa. Começou a ser cada um por si para assim garantir um contrato para 2017. O que Roman Kreuziger fez a Alberto Contador no Tour (deixou-o deliberadamente para trás quando o espanhol estava em dificuldades, indo à procura de conseguir ele próprio um bom resultado) foi a prova visível que esta Tinkoff não tinha futuro, com um magnata a liderar como se tudo fosse um divertimento e como se tudo se resolvesse com umas declarações polémicas e com umas asneiras pelo meio, que na mente de Tinkov tinham piada.

Alberto Contador esteve muito bem no início de temporada. Apareceu forte logo na Volta ao Algarve e venceu no Alto do Malhão. Quando chegou a provas do World Tour normalmente vistas como preparação para Tour, o espanhol somou vitórias de etapas, pódios, venceu a Volta ao País Basco, mas de que vale se quando chega ao momento que tanto se preparou e se é vítima de mais uma queda estúpida e de um abandono daqueles que eram suposto ser os seus braços-direitos. Na Vuelta até esteve melhor e ainda tentou o pódio, mas acabou empurrado para o quarto lugar após mais uma grande exibição de Johan Esteban Chaves, que esse sim, teve uma equipa a ajudá-lo a atacar um objectivo.

  • 2º lugar no ranking World Tour com 1361 pontos
  • 34 vitórias (13 no World Tour, incluindo três no Tour por Peter Sagan)
  • Peter Sagan foi o ciclista com mais vitórias: 15 (9 no World Tour)


Portanto, a época da Tinkoff resume-se a Peter Sagan, que apesar de todos os problemas internos acabou por ter um 2016 memorável. Não foi um início fácil. Primeiro vieram os habituais segundos lugares, mas depois de vencer a Gent-Wevelgem partiu para uma época de grandes vitórias a começar pelo seu primeiro monumento, a Volta a Flandres. Seguiram-se triunfos em etapas na Volta à Califórnia, Volta à Suíça, até que chegou ao Tour, onde quebrou o enguiço de dois anos sem vitórias. Foram três etapas, a habitual classificação por pontos (e aí vão cinco) e ainda uns dias de camisola amarela. Foi o primeiro campeão da Europa de elite e ainda comprovou que afinal pode muito bem vencer os melhores sprinters, sagrando-se novamente campeão do mundo, em Doha.

Muito se fala da maldição da camisola do arco-íris. Peter Sagan ou acabou com ela ou simplesmente comprovou que não é mais do que um tema de conversa quando se quer justificar épocas menos boas. O eslovaco é simplesmente fenomenal, até viu o irmão sagrar-se campeão do seu país, tendo Peter sido segundo. Uma figura incontornável do ciclismo que até se treme em pensar o que poderá alcançar se na Bora-Hansgrohe encontrar realmente um grupo que o ajude a fazer parte do trabalho que na Tinkoff se via obrigado a fazer, como controlar corridas ou liderar perseguições.

Sagan foi o principal responsável pela classificação da equipa no ranking World Tour. Ainda assim Tinkov, talvez frustrado por não ter vencido nenhuma grande volta, terminou o ano a atacar Alberto Contador quando este resolveu não competir na Lombardia, último monumento do ano, por motivos físicos. Tinkov considerou que o espanhol retirou a oportunidade da sua equipa se despedir como número um do ranking mundial.

De referir ainda Rafal Majka. O polaco quase parecia um ciclista à parte. Manteve-se concentrado nos seus objectivos pessoais. Foi quinto no Giro, venceu a classificação da montanha no Tour e foi medalha de bronze nos Jogos Olímpicos. Também vai para a Bora-Hansgrohe e é dos ciclistas que mais se expectativa tem para saber do que é capaz como líder com uma equipa a apoiá-lo.

Quanto a Sérgio Paulinho, o português foi mais uma vítima de toda esta confusão que se viveu na Tinkoff. Há tantos anos que era um dos homens de confiança de Alberto Contador, mas não foi convocado para a Volta a França e chegou mesmo a criticar os ciclistas escolhidos. E o tempo deu-lhe razão. Foi à Vuelta, cumpriu, mas o ingrato trabalho de gregário fez com que chegasse ao final da temporada sem convites para continuar no World Tour. E claro que não ajudou Contador lhe ter prometido que o levaria com ele fosse para uma equipa criada pelo espanhol ou para outra e não ter cumprido. O espanhol assinou pela Trek-Segafredo e não mais contactou o português.

Sérgio Paulinho demonstrou nos Europeus que apesar dos 36 anos continua a ser um ciclista de grande valor. Porém, Contador parece ter-lhe virado as costas. O ciclismo tem tendência a esquecer os “gregários” quando chega a altura de contratar e o português vai regressar a Portugal e assumir um papel de liderança na Efapel do amigo Américo Silva. Perde o World Tour um grande homem de trabalho, ganhámos nós, adeptos em Portugal, que podemos ver o medalha de prata dos Jogos Olímpicos de 2004 novamente nas nossas estradas.



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