26 de outubro de 2017

"Ainda há muito o preconceito que só os rapazes é que têm futuro no ciclismo"

(Fotografia: João Fonseca/Federação Portuguesa de Ciclismo)
É apelidada como um dos maiores talentos da nova geração do ciclismo feminino. Soraia Silva sorri, mas diz que não se identifica com o rótulo, realçando que "apenas" trabalha todos os dias para atingir os seus objectivos. Aos 18 anos (quase 19) é aposta regular nas selecções de estrada e pista, agora no escalão de sub-23. Estuda enfermagem, quer um dia estar numa grande clássica belga e seguir os passos de Daniela Reis, a primeira portuguesa a chegar ao World Tour. Sabe bem o que é sacrificar-se para fazer o que gosta, mas está disposta a continuar e realizar os seus sonhos. Confessou ainda que a pista foi um amor à primeira vista.

Soraia Silva ainda tem dificuldades em descrever-se como ciclista. Gosta de todo o tipo de terreno, diz ser "multifunções". Provas por etapas ou de um dia, o que quer é correr. Porém, quando foi chamada para competir em pista, nos Europeus e Mundiais, a experiência fez com que nascesse uma paixão. "Logo na primeira prova foi uma satisfação enorme. É uma adrenalina diferente. É um mundo diferente", realçou. "Costumo dar o exemplo que só vivemos verdadeiramente o ciclismo de estrada se formos correr. Nunca estive numa grande clássica, com aquele público fantástico, mas não se vive da mesma forma que na pista. Ali, esteja-se ou não a correr, há sempre aquele ambiente... Nós choramos a ver os outros a correr... A ver o Ivo ou o Rui [Oliveira] a ganhar... Foi uma grande experiência. O ambiente e a equipa, foi tudo extraordinário", acrescentou.

"O meu dia é ir à universidade, treinar, estudar e dormir. Não é fácil! Mas é uma questão de organizar o meu tempo e saber geri-lo"

Apaixonou-se pela pista, mas não perdeu o amor pela estrada, onde já foi conquistando vitórias com a camisola da Bairrada. É de Cantanhede, mas foi para Coimbra devido aos estudos. "O meu dia é ir à universidade, treinar, estudar e dormir." Faz a descrição não com o peso de um sacrifício, mas com a convicção de que é possível conciliar todos os aspectos da sua vida. "Não é fácil! Mas é uma questão de organizar o meu tempo e saber geri-lo", frisou. Não fala em prioridades, preferindo garantir que consegue conjugar os estudos com a vida de atleta.

Soraia Silva treina para seguir os passos de Daniela Reis e recordou um exemplo de como se sacrifica: "No ano passado houve muitas provas em Espanha. Nós vínhamos no domingo à noite ou segunda-feira de manhã e à tarde tinha uma frequência. Quase não estudei. Mas faz-se tudo!"

Espera ter a oportunidade de sair de Portugal. Uma boa oportunidade. Fazer carreira no país "é quase impossível". "O nosso ciclismo feminino evoluiu nos últimos anos, mas ainda não se pode fazer carreira aqui", afirmou. E não é fácil ser ciclista e mulher em Portugal: "Ainda há muito o preconceito que só os rapazes é que têm futuro no ciclismo. É para muita gente estranho ver uma rapariga equipar-se todos os dias e dar uma volta de bicicleta, mas são mentalidades que mudam com o tempo. Espero que isso aconteça. Nós trabalhamos como os rapazes."

Soraia Silva poderá ser uma das jovens que vai abrindo caminho para que o ciclismo feminino vá ganhando maior expressão. Porém, apesar de ficar "agradada" por a considerarem um dos grandes talentos, Soraia quer concentrar-se no que tem de fazer para que possa chegar às grandes competições internacionais. "Tenho um sonho de fazer uma daquelas clássicas belgas." E o Giro (principal prova por etapas das senhoras)? "Eu aceito tudo!"



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