19 de junho de 2017

Ou vão aos Nacionais ou ficam de fora dos Europeus e Mundiais

José Mendes é o actual campeão nacional de estrada
(Fotografia: Stiehl Photography/Bora-Hansgrohe)
O aviso muito sério foi feito pela Federação Italiana de Ciclismo. A regra é clara e o organismo resolveu há uns dias relembrar as principais estrelas da modalidade transalpina que os Nacionais são importantes e que devem marcar presença, sob pena de ficar de fora das convocatórias para os Europeus e para os Mundiais. Esta mesma norma aplica-se também na Bélgica e em França e em Espanha a federação pondera adoptá-la em 2018. E em Portugal, é uma regra a implementar?

Com os Nacionais a realizarem-se a uma semana do arranque da Volta a França, alguns ciclistas preferem resguardar-se e não arriscar algum incidente que os possa prejudicar. Aconteceu o ano passado com Rui Costa. Campeão em título, optou por não ir a Braga e concentrar-se no Tour. "Poderemos no futuro vir a ponderar essa regra, mas até agora não sentimos essa necessidade porque a maior parte dos nossos grandes ciclistas vêm ao campeonato", salientou Delmino Pereira ao Volta ao Ciclismo. O presidente da Federação Portuguesa de Ciclismo (FPC) reforça a importância dos corredores com estatuto internacional de darem também eles "o seu contributo a um título nacional transversal a todas as categorias e vertentes" da modalidade.

O aumento de ciclistas a competir no estrangeiro, inclusivamente há cada vez mais portugueses em formações do World Tour, faz com que a federação esteja atenta ao que possa acontecer nos Nacionais. "Se essa situação se acentuar, nós poderemos vir a ponderar colocar uma regra como essa", afirmou o dirigente. "O título de campeão nacional também é importante para os atletas. Dá pontuação internacional, para o ranking da UCI e é um título de prestígio", referiu.

Porém, Delmino Pereira realça um pormenor nem sempre fácil de controlar: "Algumas equipas internacionais não estimulam muito os seus ciclistas a irem às provas por causa da mudança de camisola, por causa da questão da imagem." O presidente da FPC deu o exemplo do que acontece com a Movistar, pois o campeão espanhol, que nos últimos anos tem sido muitas vezes um ciclista desta formação, acaba por ter uma camisola na qual pouco se vê as cores da bandeira, mantendo-se o destaque para o patrocinador. O mesmo já não acontece com a Bélgica ou a França, cujos ciclistas vestem-se com as cores da bandeira, sendo equipamentos personalizados em detrimento das cores das equipas que o ciclista representa.

Há ainda o caso da Bora-Hansgrohe. A equipa alemã que este ano subiu para o principal escalão, contratou dois campeões nacionais - Rafal Majka (Polónia) e Juraj Sagan (Eslováquia) - e o campeão do Mundo e da Europa, Peter Sagan. No seu plantel manteve José Mendes, o campeão português. A formação tenta tirar partido deste factor a nível de marketing, além de ter camisolas que destacam o título nacional, mas em que se vê bem os nomes dos patrocinadores.

"Esta forma de interpretar não é igual em todas as equipas", frisou Delmino Pereira, que acrescentou que as equipas portuguesas não têm qualquer problema em ter um campeão nacional. "Nós até facilitámos o regulamento da camisola, que foi aprovado há um mês. Tornámos a camisola mais simples, ou seja, as faixas diminuíram de dez para oito centímetros, deixou de ter qualquer aplicação a nível de golas ou mangas. Fizemos essa diminuição da faixa de forma a libertar espaço para a aplicação dos interesses dos patrocinadores", explicou o dirigente. Além disto, já não há o calção associado à camisola, tudo, segundo o dirigente, para que o equipamento de um campeão nacional "não seja um problema para as marcas". "Interessa-nos que as marcas digam 'ok, vai lá disputar o campeonato e espero que ganhes'", frisou.

Delmino Pereira não esquece que quem paga os salários são as marcas pelo que afirmou ter a noção da necessidade de perceber o interesse publicitário que existe nos equipamentos. No entanto, realçou o prestígio que é ver a camisola de campeão português no Tour - como aconteceu com Rui Costa -, no Giro e na Vuelta (nestas duas corridas por intermédio de José Mendes). E claro, há que não deixar de parte Nelson Oliveira, também já conta com um título de estrada, mas tem sido dominador no contra-relógio, com quatro conquistas.

A proximidade com o Tour é um dos problemas, como já foi referido, mas mudar a calendarização dos Nacionais não está nos planos. "É uma regra do calendário europeu. Já sabemos que no último fim-de-semana de Junho, uma semana antes da Volta a França temos os Campeonatos Nacionais. Não vejo necessidade de mudar", disse. Na Austrália e também em alguns países do continente americano, estas corridas acontecem no início do ano, mas tal também se prende com o factor meteorológico.

Os Nacionais em Portugal vão realizar-se de 23 a 25 de Junho (de sexta a domingo), com as provas de contra-relógio a estarem agendadas para Santa Maria da Feira, enquanto as corridas em linha vão disputar-se em Gondomar, Cidade Europeia do Desporto. Para se assistir terá de se o fazer no local. "Falta a transmissão televisiva, mas temos essa ambição. É a oportunidade para se ter uma corrida com os grandes nomes nacionais", disse Delmino Pereira que recordou as diferentes realidades de outros países. "Há campeonatos que são autênticos acontecimentos nacionais. Na Bélgica é transmitido em directo e há uma luta para os transmitir. Em França é igual. Essa regra [de obrigar os ciclistas a estarem presentes se quiserem ir aos Europeus e Mundiais] acabou por valorizar os campeonatos. Tem que haver um respeito pelo trabalho das federações. Os principais ciclistas de hoje também precisaram no passado do dinamismo das federações", referiu.

Ainda a propósito das transmissões, se para já não haverá para os Nacionais de estrada, já nos Europeus de pista de sub-23 e juniores, que se vão realizar em Anadia entre 18 e 23 de Julho, a federação irá proporcionar o live streaming: "Vamos fazer uma aposta. Serão mais de 30 países presentes, com algumas potências de ciclismo que têm redes de distribuição de informação. Libertando esse sinal, estou convencido que vamos chegar a muitas pessoas lá fora." Além desta forma de transmissão, decorrem também negociações com um canal de cabo.

O ambiente fechado do ciclismo de pista facilita o live streaming, pois a logística de uma prova de estrada é diferente e mais dispendiosa. Porém, o ciclismo em Portugal tem vindo a aumentar o interesse a nível televisivo. Ainda este ano a Volta ao Algarve voltou a ser transmitida, com uma aposta da TVI24 e com o Eurosport a integrar a prova portuguesa na sua extensa programação da modalidade. A RTP também tem alargado a sua cobertura, ainda que com provas estrangeiras.

Os ciclistas portugueses estão cada vez mais a competir entre os melhores do mundo. Além do World Tour, temos também corredores em equipas do segundo escalão e também em Continentais estrangeiras, ainda que esta seja também a categoria das formações portuguesas. Muitos dos corredores não têm apenas passagens, são ciclistas com papéis importantes nas formações. Talvez por isso se possa esperar que mais cedo ou mais tarde os Nacionais sejam transmitidos em directo, pois será a oportunidade de os ver todos juntos a disputar um título. Com ou sem transmissão televisiva, pode sempre ir para a estrada apoiar os ciclistas. Veja aqui o percurso da prova de contra-relógio e neste link os das corridas de estrada.


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