7 de junho de 2017

Bahrain-Merida e a mania das grandezas

(Fotografia: Facebook Bahrain-Merida)
Foi uma das novelas de 2016. O xeque Nasser bin Hamad Al Khalifa queria constituir uma equipa de ciclismo profissional e entrar directamente no World Tour. Seduziu Vincenzo Nibali com os petrodólares e a promessa de que seria o líder indiscutível e não demorou muito a fazer propostas que ciclistas como Ion Izagirre consideraram ser irrecusáveis, mesmo que isso significasse ir para uma equipa nova, sem rotinas, deixando para trás a segurança de uma estrutura como a Movistar, no caso do espanhol. Uma coisa era certa, dinheiro não era problema. O problema foi (e é) que nem todos vêem a questão monetária como a mais importante e a Bahrain-Merida não apresentou um conjunto tão forte como seria de esperar dado o poderio financeiro. Mas estamos a falar de uma espécie de ano zero em 2017. O primeiro e principal objectivo já foi falhado: a vitória no Giro com Nibali. É provável que o italiano aposte agora na Vuelta, mas os responsáveis parecem já estar a começar a pensar no futuro e em construir a super equipa que os petrodólares possam comprar.

Brent Copeland - que foi uma das grandes contratações, mas para director da equipa - sabe que precisa de um plantel melhor. Afinal ter Franco Pellizotti como o melhor apoio de Nibali na Volta a Itália - e atenção que foi mesmo uma excelente exibição do veterano ciclista - é excelente para o ciclista e mais um exemplo de como a idade nem sempre pesa assim tanto nas pernas. Porém, o facto de ter 39 anos demonstra que a Bahrain-Merida precisa de repensar a sua política de contratações. Uma parte do plantel foi escolhida a pedido de Nibali, mas para 2018 já poderá não ser bem assim.

Mikel Landa e Gorka Izagirre são dois dos nomes que estarão no topo da lista de reforços para o próximo ano. No caso de Landa torna-se óbvio que a amizade entre o xeque e Nibali foi muito bonita para começar a equipa, mas agora é altura de pensar em mais opções de liderança e em mais opções de vitórias nas corridas por etapas. O ciclista da Sky estará a pensar em sair depois de dois anos em que não conseguiu afirmar-se entre Chris Froome e companhia. Entre azares e falta de confiança, pouco correu bem a Mikel Landa, que até já terá um pré-acordo com a sua antiga formação, a Astana, mas isso não desmoraliza a Bahrain-Merida. Segundo o jornal Marca, Landa é mesmo o alvo prioritário.

Financeiramente a Astana é também uma equipa poderosa, pelo que um bom cheque poderá não chegar para atrair Landa. Porém, a formação cazaque atravessa uma crise de resultados e não tem atraído grandes nomes do ciclismo, sendo também uma equipa que vive eternamente sob suspeita devido ao passado do seu director Alexander Vinokourov e a um ou outro caso de doping nos últimos anos. À Bahrain-Merida restará apresentar um projecto com futuro e com um forte suporte em ciclistas de qualidade para apoiar Mikel Landa. E claro que um ordenado bem interessante ajudará sempre, mesmo não sendo decisivo neste caso.

Já Gorka Izagirre será um caso fechado, segundo a Marca. Se assim for, o espanhol irá juntar-se ao irmão mais novo, que deverá ser o líder da equipa na Volta a França. Gorka é um dos principais homens de trabalho de Quintana e Valverde, tendo ganho uma etapa no Giro100. É claramente uma contratação de qualidade e que comprova como a Bahrain-Merida quer subir de nível competitivo e aproximar-se das principais formações do World Tour.

Nibali não perdeu crédito por não ter vencido o Giro. O terceiro lugar até foi descrito como uma boa classificação, tanto pelo ciclista, como pelo próprio xeque. Não é uma afirmação que seja completamente convincente, mas dado o que aconteceu com Tom Dumoulin que foi simplesmente superior a todos, o pódio não foi de facto um mau resultado. Ainda assim, certamente soube a pouco para quem queria a sua terceira Volta a Itália na 100ª edição. Além disso, o italiano não se mostrou no seu melhor. A amizade com Nasser bin Hamad Al Khalifa deverá render a Nibali uma renovação de contrato pelo menos por mais um ano e a oportunidade de lutar pela Volta a França em 2018, como o italiano já revelou ser o seu desejo. Assim percebe-se ainda melhor a pretensão de desviar Landa da Astana, pois o espanhol tem como principal ambição (para já) conquistar o Giro, corrida que diz ser a sua preferida entre as provas de três semanas.

Mas a tal lista tem pelo menos mais um nome muito interessante: Davide Formolo. O italiano de 24 anos é uma das estrelas em ascensão e com o futuro da Cannondale-Drapac a ser uma enorme incógnita, ao que se junta o facto de terminar o contrato este ano, Formolo poderá ser tentado em resolver rapidamente a sua situação. Financeiramente não há dúvidas que a actual formação americana não tem capacidade para contrariar uma eventual oferta da equipa do Médio Oriente.

Qualquer contratação que já esteja ou venha a ser negociada só pode ser publicamente anunciada a partir de 1 de Agosto (pode ver aqui quem está em final de contrato). Porém, as renovações já estão a acontecer e sem surpresa, Sonny Colbrelli foi o primeiro. O sprinter italiano assinou até 2019 e bem merece ter alguma segurança. Soma duas vitórias, uma no Paris-Nice e outra na clássica belga De Brabantse Pijl-La Flèche Brabançonne. Além dos triunfos, esteve na disputa de outras corridas. Uma estreia positiva ao mais alto nível aos 27 anos, depois de ter evoluído na Bardiani-CSF.

Colbrelli destacou como considera que a equipa é a ideal para o levar até ao topo do ciclismo, admitindo que não pensou duas vezes em renovar o contrato. Já o director Brent Copeland salientou como Colbrelli foi dos primeiros a acreditar no projecto do Médio Oriente, sendo agora dos primeiros a renovar: "O Sonny é um elemento muito importante para a equipa. Vimos como melhorou e como está mais confiante. Está a aprender em lidar com o papel de um verdadeiro líder e acreditamos que tem ainda muito espaço para desenvolver [as suas capacidades]."

Sonny Colbrelli é de facto um ciclista importante para a equipa, tendo tudo para ser sinónimos de grandes vitórias num futuro próximo. A Bahrain-Merida parece estar numa fase ascendente, não tendo receio de mostrar como tem a mania das grandezas e que a quer transformar em momentos de glória. A dúvida que persiste sempre com projectos megalómanos dependentes de petrodólares, ou de outro tipo de multimilionários que resolvem entrar no ciclismo, é o que acontece quando alguém decide que já chega?

Vejamos o que aconteceu no Qatar, numa perspectiva de um pouco diferente. Tanto gastaram na sua volta, conseguiram organizar uns Mundiais e até a Volta ao Qatar subiu para a categoria World Tour. Porém, foi cancelada por falta de dinheiro e entretanto surgiram notícias que muitos dos trabalhadores nos Mundiais não receberam o salário devido.

E este é um exemplo da mesma zona do globo, porque se formos até à Rússia, Oleg Tinkov também sempre teve a mania das grandezas e de um dia para o outro fartou-se e bateu com a porta. Os ciclistas que até tinham mais anos de contrato e que pensariam estar seguros, tiveram de inesperadamente procurar outras equipas.

Vamos ver se este ano zero da Bahrain-Merida servirá de facto para impulsionar uma equipa forte e com futuro, ou se viverá e morrerá à custa da vontade do seu xeque.

»»O lado ensombrado da Bahrain-Merida««

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