O Paris-Nice é uma das provas de uma semana que gera mais interesse, já que normalmente junta alguns dos grandes "voltistas". Não foi bem assim este ano. Dos três principais favoritos à vitória na Volta a França, só Alberto Contador esteve presente, com Chris Froome e Nairo Quintana a optaram por manterem-se longe da competição. Mas ainda assim, a prova francesa já permitiu tirar algumas ilações, seja de ciclistas a apontar ao Giro ou ao Tour. Já os que poderão aparecer nas clássicas, pouco se viu, com a excepção de Geraint Thomas que parte para esta fase da época extremamente motivado.
Alberto Contador em forma
O espanhol da Tinkoff tem sido do trio de favoritos ao Tour o que mais se tem mostrado neste início de temporada. Depois do pódio na Volta ao Algarve, Contador mostrou que estava no Paris-Nice para ganhar. E que exibição que fez quando chegaram as etapas decisivas no fim-de-semana. Atacou, contra-atacou e atacou mais um pouco. Reforma? Cada vez mais se deseja que não. Na última etapa, atacou a 50 quilómetros do fim, foi apanhado por Thomas e a Sky, voltou a fugir e por quatro segundos viu fugir a vitória na geral.
Além de Contador, também a Tinkoff parece estar mais ao nível do que o espanhol precisa, ao contrário do que aconteceu no ano passado, principalmente no Giro. Rafal Majka é um braço direito de luxo, ainda que na última etapa lhe tenha faltado as forças. Mas estamos apenas em Março. A contratação de Yuri Trofimov (ex-Katusha) pode ter parecido estranho, mas o russo acabou de mostrar que poderá ser muito importante nas montanhas.
Contador vai continuar a competir, com participações confirmadas na Volta a Catalunha e ao País Basco, antes de entrar num modo mais "discreto" na preparação rumo ao Tour.
A confirmação de Geraint Thomas e Sergio Henao
E vão duas provas de uma semana para o britânico. Sofreu (e muito) na última etapa, mas mostrou frieza durante a última descida, como no pormenor de ter um prato maior na bicicleta, já a pensar precisamente de ter de recuperar terreno para Contador após a subida. Poderá Thomas ser um ciclista para três semanas? O britânico da Sky será certamente um homem muito importante para ajudar um líder, neste caso Froome - ainda que não seja um Richie Porte, mas em 2015 já mostrou ser um gregário de luxo -, mas permanecem muitas dúvidas se terá capacidade para liderar numa grande volta. O próprio ciclista estará mais concentrado neste tipo de provas, de uma semana, e nas próprias clássicas. Será um ciclista a ter em conta para a Volta a Flandres e Liège-Bastogne-Liège.
Mas se há alguém que Thomas bem pode agradecer o triunfo é a Sergio Henao. O colombiano está claramente de volta ao seu melhor e quando o seu líder sofreu, Henao só faltou puxar com uma corda o britânico. E depois ainda teve aquele excelente trabalho de sacrifício na descide rumo a Nice. Sem Henao, Thomas dificilmente teria ganho o Paris-Nice.
Se Thomas será um braço direito muito importante para Froome, não será um Richie Porte. Poderá a Sky abdicar de Henao? O colombiano está escalado para o Giro, mas a continuar assim, será uma loucura deixá-lo de fora do Tour.
A inteligência de Rui Costa
Mais um top dez para o português. Equipa nem vê-la, praticamente, mas Rui Costa mostrou mais uma vez porque é um dos ciclistas mais inteligentes tacticamente no pelotão. Por sua conta para conseguir um bom resultado - de recordar que em 2015 foi quarto classificado, com o mesmo tempo que o segundo - Rui Costa manteve a calma quando tinha razões para entrar em pânico (quando o vento e a Sky provocou um corte no pelotão), nas subidas não entrou em loucuras e tentou ir com os melhores, manteve o seu ritmo quando Contador dava uns valentes "safanões" no grupo, acabou entre os melhores. Não foi o Rui Costa de 2015, mas o português vai mostrando que o nível de forma está a melhorar. Que venham as clássicas.
Richie Porte, o líder que a BMC procura?
Esta é uma corrida que o australiano muito gosta. Duas vitórias comprovam isso. Este ano quis mostrar que não foi só por estar numa super equipa como a Sky que conseguia ganhar. Porte esteve a bom nível no Paris- Nice. Bem no contra-relógio, mostrou-se forte nas subidas e discutiu a vitória até final. Ainda assim, é difícil ver em Porte um líder indiscutível na BMC. Irá à Volta a França, mas Tejay Van Garderen será o número um e Porte acabará com a função que tinha na Sky, o que poderá ser muito importante para o norte-americano. A BMC ganha certamente um plano B mais forte, caso Van Garderen volte a ter algum azar, ou não esteja no seu melhor.
Terá a Orica encontrado o seu voltista?
Sim... e não. Aos 23 anos Simon Yates não só revela ter um enorme potencial, como já o vai mostrando com bons resultados. Sétimo no Paris-Nice, Yates é claramente o ciclista que a Orica procura para as grandes voltas. No entanto, será difícil imaginar Yates alcançar algo de extraordinário na equipa australiana. Apesar das contratações de Rúben Plaza e Amets Txurruka, a Orica continua a ser uma equipa de clássicas e sprints. Não será surpresa ver Yates, mais cedo ou mais tarde, procurar outras equipas, a não ser que a Orica faça uma aposta mais forte em ciclistas, a pensar realmente em vencer uma grande volta. É um conhecido objectivo, mas veremos se o farão a tempo de segurar Yates.
Zakarin, o substituto de Rodríguez
O jovem russo foi uma das figuras do Paris-Nice: venceu uma etapa e ficou em quarto lugar. Já no ano passado Ilnur Zakarin tinha deixado indicações que a Katusha tinha o seu próximo ciclista para apostar nas grandes voltas. Venceu a Volta à Romandia e uma etapa no Giro, onde irá estar novamente este ano. Zakarin mostra grande potencial para as montanhas e de acompanhar os melhores. É de esperar que a Rússia volte a ter um ciclista a ter em conta para as grandes voltas, pelo menos, por agora, para lutar por um top dez, mas a Katusha certamente que terá planos ambiciosos para Zakarin, numa altura em que Rodríguez se aproxima do final da carreira.
Tom Dumoulin discreto
Para quem prepara o Giro, o holandês da Giant está ainda longe do seu melhor. Esteve bem no contra-relógio, mas falhou nas montanhas, passando de candidato ao pódio para fora do top dez. Porém, não se poderá dizer que o que aconteceu na Vuelta foi obra do acaso. Dumoulin não é ciclista de "explosões" (ao estilo Contador ou Aru), gosta de encontrar o seu ritmo e claro que tem no contra-relógio um ponte muito forte. Tem potencial, mas sofre do síndrome "falta de equipa". A Giant pensa mais em sprints e clássicas e claro que não ajuda ter perdido parte da equipa num atropelamento na pré-época. Ainda há tempo para Dumoulin apurar a forma para o Giro, mas dificilmente este holandês ficará na Giant por muito tempo se realmente quiser lutar pela geral de uma grande volta.
Tony Galopin para o Tour
Este ciclista francês vai impressionando pela forma como tem melhorado as suas características de trepador. Galopin aponta claramente a conseguir mais no Tour do que estar com a camisola amarela ou vencer uma etapa. Este ano no Paris-Nice não esteve na luta pela vitória, mas com mais ou menos sofrimento manteve-se com os melhores (algumas vezes ao lado de Rui Costa). Fica a ideia que o ciclista da Lotto Soudal quer piscar o olho a um possível top dez no Tour. Ainda terá que evoluir mais, mas as perspectivas são animadoras e está claramente a subir cada vez melhor.
O que esperar de Michael Matthews
Ainda não tinha competido este ano, mas meteu todos a falar dele num instante. Venceu o contra-relógio e mais uma etapa. Andou de amarelo até que as montanhas acabaram com o seu momento no Paris-Nice. Matthews é visto como um sprinter, mas demonstra ter qualidade para ser também um ciclista para as clássicas, não esquecendo que consegue ainda ultrapassar algumas subidas mais difíceis. Estará na Milano-San Remo e na Amstel Gold Race, mas o australiano poderá no futuro aparecer noutras provas de um dia como candidato às vitórias. Será aposta para o Tour e certamente que quererá discutir a camisola verde com Peter Sagan.
A neve prejudicou os melhores
A anulação da etapa que traria as primeiras dificuldades para os favoritos poderá ter tirado alguma da emoção à prova. Mas o destaque vai para o facto de a organização ter tido em conta que não havia condições, colocando em prática o protocolo do tempo extremo. Ainda houve quem colocasse a questão se não poderia ter existido um percurso alternativo, ou se a etapa até não deveria ter sido cancelada mais cedo. Esta regra ainda tem algumas arestas a limar, mas a julgar pelo o que se passou no fim-de-semana, emoção não faltou neste Paris-Nice, muito graças a um espectacular Alberto Contador.
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