29 de março de 2016

A pergunta que se impõe... ou talvez não

Foto: Twitter @TeamWantyGobert
As tragédias são muitas vezes impulsionadoras de mudanças no desporto. A morte de Ayrton Senna deu origem a várias alterações nos monolugares de Fórmula 1 e não só, a morte de futebolistas em campo fez com que agora exista, em alguns países, desfibrilhadores nos estádios. No ciclismo, a morte de Andrei Kivilev no Paris-Nice, em 2003, fez com que os capacetes passassem a ser obrigatórios. Antoine Demoitié era um nome até este domingo, 27 de março, relativamente desconhecido. Agora vê-se envolvido numa polémica que tem marcado os últimos anos no ciclismo: ciclistas e os incidentes com motos e carros nas corridas.

Demoitié participava na Gent-Wevelgem quando caiu juntamente com vários ciclistas. O diretor desportivo da equipa do belga, a Wanty-Groupe Gobert, explicou numa conferência de imprensa os momentos que se seguiram, ao que o próprio referiu como sendo uma queda como tantas outras que acontecem nas corridas. Hilaire Van der Schueren disse que o condutor da moto da organização tentou travar, mas não conseguiu parar a tempo. A moto caiu sobre a cabeça e pescoço do ciclista. Demoitié recebeu ajuda médica imediata, apesar de Van der Schueren admitir que percebeu que a situação era grave e ficou ainda mais ciente que a situação de Demoitié era dramática quando a organização pediu os contactos da família. A morte do ciclista de belga, de 25 anos - e que tinha feito a sua primeira prova do World Tour no E3 Harelbeke na sexta-feira -, foi confirmada pouco depois da meia-noite (hora local, menos uma em Lisboa).


Inevitavelmente a pergunta que se impunha foi feita na conferência desta segunda-feira: "Há demasiadas motos no pelotão?" Ou seja, seria esta a tragédia que há muito se temia depois de tantos acidentes nos últimos meses, como o de Stig Broeckx já este ano? "Não queremos discutir isso e não é o momento certo para discutir isso. Foi um terrível acidente, mas foi um acidente. Não o culpamos [ao condutor da moto] e não nos compete a nós culpá-lo", respondeu o assessor da equipa José Been.

Acidente é a palavra chave. Naturalmente que os outros incidentes que aconteceram não passaram também de acidentes. Mas é necessário entender que se tem falado de conduções perigosas, acelerações em momentos errados, o forçar passagem e colocar a integridade física do ciclista em perigo. No caso de Demoitié, as testemunhas apontam que o condutor da moto não conseguiu travar.  Estaria a ir rápido de mais, demasiado próximo... as dúvidas são muitas e aguardam-se respostas que uma investigação certamente dará. E são certamente aguardadas por ciclistas, directores desportivos e todos com ligação a esta modalidade.

Para já, tanto a UCI como a Associação de Ciclistas Profissionais também estão a reagir com cautela, salientando a importância de manter a segurança dos ciclistas, mas também referindo a necessidade de investigar o que aconteceu.

A pergunta impunha-se, mas talvez esta tragédia não passe disso mesmo: de um trágico acidente. No entanto, não significa que não venha a contribuir para possíveis mudanças que há muito se exigem no pelotão internacional. Mas a resposta da equipa à questão dos motos/carros e incidentes com ciclistas foi a ideal para evitar alimentar polémicas à custa da memória de Demoitié. Mas mesmo sendo um acidente, será um que não deixará de ser sempre referido até que as mudanças sejam feitas. E ficará sempre a sensação que é preciso uma tragédia como uma morte para que as alterações apareçam (se aparecerem).

Porém, agora é o momento de luto e a equipa já confirmou que estará na Volta a Flandres com o objectivo de concretizar a melhor homenagem para Demoitié: uma vitória. #RideForAntoine

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