7 de novembro de 2020

Um último susto, uma ajuda da Movistar e uma vitória com todo o mérito para Roglic

© Unipublic/Charly López/La Vuelta
Richard Carapaz esperou até ao últimos momentos para dar alguma emoção à última etapa de montanha da Vuelta. Já dentro dos cinco quilómetros final atacou, depois de Hugh Carthy ter aberto as hostilidades. Foi um derradeiro susto para Primoz Roglic, um vencedor pela segunda vez consecutiva da Vuelta, mas que teve uma ajuda preciosa na recta final da tirada que terminou no Alto de la Covatilla. Não, não foi Sepp Kuss, o seu fiel escudeiro da Jumbo-Visma. Foi mesmo uma Movistar que assim ajustou algumas contas com uma saída muito pouco amigável de Carapaz da equipa espanhol em 2019.

Roglic tem todo o mérito nesta vitória. Isso ninguém lhe pode tirar. Veio à Vuelta depois de uma enorme desilusão no Tour. Parecia ter o triunfo garantido e tudo se desmoronou no contra-relógio decisivo em La Planche des Belles Filles. Em Espanha passou todos os testes que enfrentou. Mentalmente foi um ciclista decidido a mostrar que a derrota no Tour frente a Tadej Pogacar não iria definir o resto da sua carreira.

É um vencedor e quando se perde, a melhor forma de reagir é regressar às vitórias. Já tinha conquistado o seu primeiro monumento, a Liège-Bastogne-Liège, mas era uma reacção numa prova de três semanas que precisava. Roglic está bem vivo e contem com ele para lutar pela Volta a França em 2021, agora como um duplo vencedor de duas Vueltas. Curiosamente, dois triunfos em outras quantas presenças. Não compensa o que aconteceu em França, mas foi mais uma vez uma mostra do carácter excepcional deste ciclista.

Só um casaco - justificou a perda da liderança na sexta etapa com problemas em vestir um casaco - e o Angliru fizeram tremer Roglic. As subidas com pendentes muito íngremes não são uma especialidade sua. Onde compensa? Nas bonificações. É um ciclista que faz questão de amealhar o maior número de segundos bónus, para tentar compensar o que possa perder na estrada. Na Vuelta foi uma táctica decisiva.

Em La Covatilla, Roglic tremeu mais um pouco. Um último susto, que fez pensar por alguns minutos que também nesta grande volta poderia haver uma mudança de líder mesmo no fim. Mas eis que surgiu a Movistar. Foi mais uma etapa ao ataque da equipa espanhola e mais uma em que não tirou dividendos de tanto trabalho. Enric Mas ficou na quinta posição que já ocupava e Marc Soler não discutiu a etapa. Restava então um pormenor...

Com Carapaz a ganhar tempo - e chegou a estar a menos de 20 segundos de conquistar a Vuelta -, com Roglic já sem companheiros de equipa e com Carthy (EF Pro Cycling) também a conseguir afastar-se do esloveno, Mas e Soler entraram ao trabalho. Os dois espanhóis deram uma preciosa ajuda a Roglic, minimizando perdas. Depois de cortar a meta, o esloveno apressou-se em agradecer aos dois inesperados parceiros.

O ciclismo não se faz só de companheiros de equipa. Há coisas que não se esquecem e que até levam a dar a mão a rivais. A Movistar não esquece como Carapaz quebrou contrato com a equipa para assinar pela Ineos Grenadiers, em mais um episódio do desentendimento com o empresário Giuseppe Acquadro. E mais. Antes da Vuelta de 2019, Carapaz participou num critérium sem autorização da equipa. Uma queda acabaria por afastá-lo da grande volta espanhola.

Foi um fim de relação que não agradou nada aos responsáveis da Movistar, que perderam assim o ciclista que havia vencido a Volta a Itália e que poderia ser importante no futuro na liderança de uma formação que não iria apostar mais em Nairo Quintana, que também se preparava para perder Mikel Landa e tem Alejandro Valverde quase a terminar a carreira.

Roglic não esquecerá o gesto da Movistar, tal como a Ineos Grenadiers de Carapaz não irá certamente deixar passar em claro. As rivalidades fazem parte do desporto, mas no caso do ciclismo, nem todas nascem na estrada, mas é lá que ganham expressão. Este dia ainda terá repercussões noutras provas...

Numa etapa (Sequeros - Alto de la Covatilla, 178,2 quilómetros) que chegou a parecer que seria uma desilusão, terminou com muito para contar.

David Gaudu venceu a sua segunda etapa na Vuelta
e subiu ao top 10 (© Photo Gomez Sport/La Vuelta)
Luta no top dez

Roglic terminou com 24 segundos de vantagem sobre Carapaz, com Carthy a fechar o pódio, a 47 do esloveno. Daniel Martin (Israel Start-Up Nation), Enric Mas e Wout Poels (Bahrain-McLaren) seguraram as posições seguintes.

A UAE Team Emirates foi uma das equipas que mais animou a etapa, até ao momento Movistar, claro. Atacou cedo e colocou David de la Cruz na frente, com Ivo Oliveira e Rui Costa a terem um papel muito importante na ajuda ao espanhol que conseguiu subir à sétima posição, a 7:35 de Roglic. Rui Costa muito tentou ganhar uma etapa, mas a fechar a Vuelta, mostrou que continua a ser um ciclista com quem podem contar para trabalhar em prol de um companheiro.

David Gaudu (Groupama-FDJ) foi à procura de ganhar a sua segunda etapa e não só conseguiu, como ainda teve o bónus de entrar no top dez (oitavo, a 7:45). A equipa francesa falhou por completo no Tour com Thibaut Pinot, mas foi ao Giro dominar nos sprints com Arnaud Démare e na Vuelta pode muito bem ter confirmado que tem um futuro líder para as três semanas. Gaudu teve liberdade e mostrou que é um corredor que pode ser mais do que um gregário.

Felix Grossschartner (Bora-Hansgrohe) e Alejandro Valverde (Movistar) conseguira a custo ficar no top dez, com Aleksandr Vlasov (Astana) a ser o sacrificado com a entrada de Gaudu. Ainda assim, uma boa estreia em grandes voltas do jovem russo.

Nas restantes classificações, Guillaume Martin (Cofidis) é o vencedor da montanha - já o havia garantido na quinta-feira -, Roglic acumula a geral com a classificação dos pontos, Enric Mas é o melhor na tabela da juventude e a Movistar vence por equipas, como tem sido habitual.

Classificações completas, via ProcyclingStats.

18ª etapa: Hipódromo de la Zarzuela - Madrid, 139,6 quilómetros

Muito se irá falar do que aconteceu na La Covatilla, mas Roglic terá o seu momento para desfrutar da merecida vitória. Foi uma Vuelta com trocas na liderança, muita montanha, com o mau tempo a fazer-se sentir e a dificultar muito a tarefa de todos, fosse qual fosse o objectivo.

Este domingo irá pedalar-se os últimos 139,6 quilómetros não só da corrida, mas da época. Madrid marcará o fim de um ano atípico, mas no qual se conseguiu concluir as três grandes voltas, por si só uma vitória para o ciclismo mundial, mesmo que a Vuelta tenha sido mais curta (18 etapas em vez de 21).

Ainda assim, foi necessário alterar a tirada de consagração, que ganhou cerca de 12 quilómetros. Nada de grave, já que grande parte será feita a um ritmo calmo. A corrida continuará a terminar no Paseo de la Castellana, mas a organização decidiu não passar por localidades como Móstoles, Alcorcón, Leganés e Getafe. A entrada em Madrid não será feita por Villa de Vallecas, mas sim por Barajas e Feria de Madrid. Os ciclistas farão mais quilómetros de auto-estrada. A fase final mantém-se com um circuito de seis voltas entre Castellana e Paseo Recoletos.

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