11 de março de 2021

Atitude muito pouco de Wolfpack

© Tim de Waele/Getty Images/DeceuninckQuickStep
Estava ali à vista. Naqueles momentos que a meta parece estar tão perto, mas, ao mesmo tempo, a sensação que falta uma eternidade para lá chegar. João Almeida deu tudo. Poderia estar naqueles metros finais o caminho para a sua primeira vitória como ciclista do World Tour. Ficou sozinho, os "companheiros de fuga" não tiveram pernas. Almeida não desistiu apesar da perseguição feroz do que restava do pelotão. Geraint Thomas, Mathieu van der Poel, Wout van Aert, Julian Alaphilippe... que perseguidores de luxo. Bom, Alaphilippe não. Afinal é colega de equipa de Almeida. Pois...

O que se viu no final da segunda etapa do Tirreno-Adriatico foi uma exibição muito pouco de Wolfpack. Sim, esteve lá a garra, a táctica e a execução final para selar mais uma vitória em 2021. E já são 10. Porém, atacar um colega de equipa que está a dar tudo o que tem e não tem para ganhar, é simplesmente desleal. Vê-se pouco no ciclismo (felizmente), mais inesperado é ver-se numa Deceuninck-QuickStep que se auto-intitula de Wolfpack (alcateia) para dar ênfase à sua forma de estar na modalidade, sempre em prol do colectivo, em que todos (ou quase) acabam por ter a sua oportunidade para brilhar e todos ajudam para que o faça.

Claro que há estatutos. E Julian Alaphilippe tem um muito, muito alto. Não só na equipa, como no pelotão em geral. E vestir a camisola de campeão do mundo é apenas um dos feitos que ajudaram a cimentar o francês como um dos ciclistas mais respeitados. Contudo, um verdadeiro campeão também sabe respeitar quem num dia, em vários dias, pode estar ao seu lado a trabalhar para que Alaphilippe possa vencer.

O ataque de Geraint Thomas (Ineos Grenadiers) tinha encurtado em muito a já escassa vantagem de João Almeida. Para trás tinha ficado Pavel Sivakov e só depois Thomas, seu colega de equipa, atacou... Se Alaphilippe não tivesse acelerado, talvez Almeida tivesse sido igualmente ultrapassado. Não se apresentava fácil a missão, mesmo com a meta ali tão perto. Se, se, se... A história não se escreve de "ses". Alaphilippe, como colega, como até líder, deveria ter respeitado o português e esperado que outro ciclista acelerasse primeiro.

Claro que na sua mente esteve, provavelmente, o receio de voltar a perder para Mathieu van der Poel, como aconteceu na Strade Bianche. E quase assim foi. Se não tem arrancado naquele momento, Alaphilippe teria tido dificuldade em bater o holandês da Alpecin-Fenix. Viu a oportunidade de conquistar mais uma vitória e não hesitou. Desportivamente nada a dizer. Cumpriu. Mas a que custo?

João Almeida nada tem com que se preocupar. Está a crescer como ciclista. A fazer  seu caminho.. Fez o que lhe competia. Infelizmente ficou sem "companheiros de fuga" um pouco cedo e fazer o que acabou por ser um autêntico sprint a subir, durante mais de 1500 metros para fugir aos perseguidores, não é fácil. Grande exibição, grande atitude. A vitória há-de chegar.

Numa altura em que se fala que a UAE Team Emirates estará a tentar contratar o ciclista para 2022 - está em final de contrato com a Deceuninck-QuickStep - sentir o respeito de todos, principalmente de alguém como Alaphilippe é importante. João Almeida já tem o seu estatuto, mas, naturalmente, ainda não está ao nível de Alaphilippe.

Já na Volta a Itália, que revelou todo o talento e potencial de Almeida ao mais alto nível do ciclismo, Fausto Masnada não tinha sido um corredor com atitude de Wolfpack. Tinha acabado de chegar à equipa, é italiano... mas não lhe ficou bem não ajudar mais. Esta atitude de Alaphilippe, ainda assim, custa mais a digerir.

A João Almeida resta continuar o seu trabalho e espera-se que possa também ele contribuir para o elevado número de triunfos que, ano após ano, a Deceuninck-QuickStep alcança. Com as exibições que tem feito, já ninguém o perde de vista e a continuar assim, poderá ver-se na situação bem agradável de poder escolher o que pretende para 2022 e adiante, seja na equipa belga, ou não. E este Tirreno-Adriatico ainda não acabou. Está na luta.

Classificações completas, via ProCyclingStats.

Veja o vídeo dos metros finais da segunda etapa da prova italiana (Camaiore-Chiusdino, 202 quilómetros).

»»A afirmação de Pedersen no pós-título mundial««

»»Corridas em Portugal só em Abril. Ciclistas desiludidos com adiamentos««

Sem comentários:

Enviar um comentário