Para alguns ciclistas todos os quilómetros feitos em 2019 serão ainda mais importantes do que o normal. Há quem venha de uma má temporada, há quem já some épocas abaixo do exigido. Numa modalidade com tanto talento sempre a aparecer, quando os resultados começam diminuir, o futuro poderá ser insensível a currículos ganhadores. A idade vai passando nuns, noutros o peso do dinheiro aumenta ainda mais a pressão para que apresente resultados (Marcel Kittel à cabeça, neste caso).
Aqui ficam cinco ciclistas que estão proibidos de falhar em 2019.
Marcel Kittel (30 anos, Katusha-Alpecin)
É inevitável o alemão surgir em primeiro lugar. A Katusha-Alpecin abriu os cordões à bolsa para contratar um ciclista que acreditava ser garantia de vitórias. Foram apenas duas no Tirreno-Adriatico e o resto de 2018 foi passado a dizer que era na próxima corrida que o sprinter iria aparecer ao seu melhor. Até fez exames médicos para tentar perceber se havia algum problema de saúde, como aconteceu no passado. Nada. Kittel acabou a época a dizer que nunca tinha feito uma recuperação completa da aparatosa queda no Tour, em 2017.
O ciclista está obrigado a render as vitórias esperadas. Certamente mais do que duas. Acabaram-se as justificações de estar em adaptação à nova equipa ou de qualquer outro problema. Não será a primeira vez que o alemão terá de recuperar animicamente de um mau ano, mas com novos sprinters a aparecerem em força e a ganhar, Kittel tem um estatuto a defender no pelotão e só o poderá fazer se recomeçar a vencer. De referir que está no último ano de contrato.
Fabio Aru (28 anos, UAE Team Emirates)
2018 foi tão mau, que o italiano nem tentou justificar em desculpas. Assumiu a época que teve para esquecer, só querendo retomar o caminho que lhe parecia destinado quando fez pódio no Giro e venceu depois a Vuelta em 2015. Dizer que Aru já teve a sua melhor fase poderá ser um enorme exagero, tendo em conta a sua idade e como cada vez mais se vê os chamados voltistas (e não só) atingirem o auge já depois dos 30, o melhor Aru pode aparecer a qualquer momento.
Mesmo na Astana Aru estava por vezes em baixo rendimento, apesar do bom Tour de 2017. Parte da corrida, pelo menos. Na mudança para a UAE Team Emirates, basicamente tudo o que poderia correr mal, correu. Numa equipa que está a demonstrar ter um poderio financeiro crescente para contratar quem quer - a chegada de Fernando Gaviria é mais uma prova disso mesmo - Aru não se pode encostar ao facto de ter contrato até 2020. A equipa exige vitórias e um pódio numa grande volta tem de ser o objectivo. Para quem quis sair da Astana à procura de um contrato milionário, não há mais tempo para recuperar de mais falhas.
Tejay van Garderen (30 anos, EF Education First)
O americano já anda há algum tempo com este tipo de pressão. Com o final da BMC, conseguiu encontrar um porto de abrigo noutra equipa da casa, mas o facto de só ter recebido proposta para um ano de contrato, demonstra que a desconfiança é grande quanto ao que Van Garderen ainda poderá render.
Rigoberto Uran é o líder nas grandes voltas e o colombiano Daniel Martínez é a estrela em ascensão na EF Education First. Tejay van Garderen dificilmente escapará a um papel de gregário em certas provas, mas não foi contratado apenas para tal. Terá oportunidades e se não as agarrar, o americano que se acreditou vir a ser a referência desejada no ciclismo de um país a tentar recuperar a confiança perdida após o caso Lance Armstrong, pode estar perante o desafio que determinará se ainda tem espaço no World Tour para ser líder, ou se terá mesmo de render-se a um papel secundário.
Nairo Quintana (28 anos, Movistar)
O entusiasmo pelo pequeno colombiano resfriou já praticamente por completo. Há quatro/cinco anos, olhava-se para Quintana e via-se um ciclista que tinha tudo para ser um dos melhores voltistas da história, conquistando várias das três grandes. Tem o Giro e a Vuelta e as últimas duas temporadas ficaram marcadas por falhanços completos. Primeiro a tentativa da dobradinha Giro/Tour, que em nada terá ajudado na relação com o director da Movistar, Eusebio Unzué. No ano passado o Tour ficou muito aquém das expectativas, ao que se pode juntar um Mikel Landa, que também não pode estar muito tranquilo em 2019, já que não esteve ao nível desejado na época passada.
Qualquer coisa abaixo do pódio na Volta a França não será suficiente bom para Quintana em 2019 e terá de estar pelo menos na luta pela vitória. E ganhar a Vuelta terá de ser também um objectivo. Não faltam pretendentes a receber o colombiano, caso decida deixar a Movistar no final do contrato, mas mesmo para ter poder de negociação, Quintana terá de ser aquele ciclista de há quatro anos. O que entusiasmou tudo e todos. O que não ficava sempre à espera para ver o que os outros iam fazer, antes de também ele agir. Começou 2019 a mudar de treinador, num primeiro passo rumo às alterações que têm de ser feitas.
Mark Cavendish (33 anos, Dimension Data)
Já não se espera que o britânico volte a ser o sprinter implacável de outros tempos. Este pensamento não é novo e Cavendish provou a todos como estavam errados em dá-lo como ciclista acabado em 2016. Porém, tem sido um apagão quase total desde então, também muito por culpa do problema de saúde. A mononucleose já por duas vezes que o obrigou a ficar grande parte da época fora de acção, limitando-o quando compete.
A Dimension Data deu-lhe mais uma oportunidade ao renovar-lhe o contrato por uma temporada, muito também por respeito a um ciclista que foi tão importante quando a equipa subiu ao World Tour. Mas não será possível manter um corredor, com um salário alto, que é um líder que não ganha e quando essa é a sua principal função. Cavendish começou a época na Volta a San Juan, que decorre até domingo, sendo oitavo no seu primeiro sprint do ano, ganho por Fernando Gaviria, a referência da nova geração. 2019 será decisivo para se perceber se Cavendish ainda tem o que é preciso para conquistar algumas vitórias frente aos rivais, ou se o seu papel no ciclismo terá de mudar. Isto para não se falar tão cedo na época de uma possível retirada se não conseguir atingir o nível necessário.
Outros nomes
Realçou-se cinco ciclistas, mas estes não estão sós na pressão de terem de fazer bem mais e melhor. Já se referiu Mikel Landa, que pode não estar tão no centro da atenção como Quintana, mas também terá de apresentar mais resultados. Entre os voltistas, Louis Meintjes (Dimension Data) teve uma época idêntica a Aru, ou seja, nada correu bem. O regresso à equipa que o lançou, não correu bem, agora é preciso ser pelo menos aquele corredor a quem era quase natural fechar um top dez.
Matteo Trentin até foi campeão europeu, num título ainda longe de ser visto como uma grande conquista. Foi importante para o ciclista que não estava a ter um bom primeiro ano na Mitchelton-Scott, mas o italiano é o primeiro a dizer que 2019 tem de ser bem melhor.
Depois de vencer a etapa de Roubaix no Tour, um local tão simbólico para John Degenkolb, que já venceu o monumento francês, esperou-se que fosse o tónico que o alemão precisava para regressar ao topo. Na restante temporada mostrou um ciclista mais confiante, pelo que depois de ano e meio longe do que a Trek-Segafredo esperava dele, chegou o momento de estar na discussão das corridas, com destaque para as clássicas do pavé.
Há ainda Tony Martin. A passagem pela Katusha-Alpecin foi para esquecer. Aos 33 anos mudou-se para a Jumbo-Visma para tentar recuperar algum do prestígio perdido. Se apresentar-se bem melhor do que nas últimas temporadas, a equipa ganhará um homem importante no sonho de lutar por uma grande volta.
Para terminar, Rui Costa. A lesão no joelho estragou-lhe grande parte da temporada. A renovação foi anunciada já tarde e de apenas um ano. O português, de 32 anos, tem um 2019 para demonstrar que tem lugar numa equipa que agora junta a ambição ao dinheiro para contratar os melhores. Para já, o ciclista quererá ter uma temporada sem azares e assim poder demonstrar a forma dos Mundiais de Innsbruck.