Imagem do programa francês que alegadamente
identifica a utilização de motores
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O doping mecânico entrou este ano definitivamente no léxico do ciclismo. Em 2010 começaram os primeiros rumores depois de Fabian Cancellara fazer um impressionante arranque no Paris-Roubaix, que deixou Tom Boonen e todos os outros para trás. O suíço nunca se livrou das suspeitas, mas os rumores não passavam disso mesmo. O ciclismo tinha outras preocupações com o outro doping.
A UCI foi fazendo as inspecções às bicicletas. Picando o ponto. Rumor aqui, rumor ali, alguém a dizer que vendeu motores a profissionais, uma acusação de vez em quando - como quando Contador trocou durante uma etapa do Giro de bicicleta e falou-se que uma teria o tal motor - e em 2016 é descoberto o primeiro caso.
Nos mundiais de ciclocross, a belga Femke Van den Driessche, de 19 anos, foi apanhada com um motor na sua bicicleta. Desmentiu, depois disse que era de um amigo e não a sua bicicleta... A partir daquele momento acabaram-se os rumores. Os motores tornaram-se uma realidade e um novo pesadelo para a UCI.
Os ciclistas começam a apelar a mais inspecções de bicicletas. A UCI aceita o repto. Bradley Wiggins deita achas para a fogueira ao dizer que acredita que os motores são há muito utilizados no pelotão internacional. Driessche arriscava seis meses de suspensão e entre 18 mil e 180 mil euros de multa. Ridículo? Parece ser o único consenso: o crime quase compensa. Pede-se uma sanção mais dura.
A UCI reage e ameaça com uma suspensão vitalícia. Driessche resolve terminar a carreira, evitando o "julgamento". Primeiro problema resolvido, podia-se dizer. Mas não. O problema apenas estava a começar. Com a prova que os motores são uma realidade no ciclismo profissional, a UCI aumenta então as inspecções. Os meios ainda são poucos e uma tecnologia maior e portátil - como recorrer aos raios-X por exemplo - é cara.
Enquanto se procuram formas para caçar infractores, Eddy Merckx, por exemplo, pede mão pesada para quem for apanhado e outros ex-ciclistas vão fazendo pressão sobre a UCI.
Há uns dias, um programa de televisão francês, Stade 2, e o jornal italiano Corriere della Sera, anunciam que através da utilização de um detector de calor foi possível verificar que foram utilizados motores em duas provas, uma delas a Strade Bianchi. Não foram adiantados nomes, apenas imagens dos alegados motores nas bicicletas. Acabaram-se os rumores, agora é mesmo a fase da suspeição.
O ciclismo tem tido uma capacidade fantástica de recuperar de escândalos que colocaram em causa a modalidade. Nos anos 90, o caso Festina foi um rude golpe. Quando parecia existir uma referência que tinha ajudado a recuperar o prestígio da modalidade, afinal Lance Armstrong era apenas o exemplo de tudo o que estava de mal. Muito mal. O doping tem dado duros golpes. O ciclismo lá vai recuperando.
Agora é o doping mecânico que exige medidas. Não é possível varrer para debaixo do tapete como tanto tempo se fez no passado com o doping sistemático no pelotão. A UCI está praticamente obrigada a agir e não apenas a reagir, pois não se pode esperar apenas que alguém se meta numa cruzada para descobrir a verdade como foi no caso Armstrong. Ainda mais porque numa altura em que se obteve a prova dos motores, também já surgiram notícias da utilização de rodas electromagnéticas.
Aqueles que procuram meios ilegais para obter maior rendimento irão sempre existir. Depende dos organismos responsáveis garantir que são apanhados e castigados de forma a que passe a mensagem que não compensa e principalmente que passe a mensagem que se pode apostar na modalidade, que essas pessoas são a excepção e não a regra. Afinal, do que será do ciclismo se os patrocinadores perderem a confiança? O que acontecerá se os adeptos não acreditarem nos ciclistas?...
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