30 de janeiro de 2020

Kiryienka forçado a antecipar final de carreira

© Filip Bossuyt/Wikimedia Commons
Camisola aberta, ritmo certo, uma locomotiva que arruinava tantos dos adversários dos seus líderes na então Sky. O trabalho de Vasil Kiryienka tornou-se uma referência na equipa que tem dominado a Volta a França, tendo sido muito importante nas vitórias de Chris Froome. Quando a montanha chegava, lá estava ele a colocar aquele ritmo infernal para tantos, que se tornou numa imagem de marca. Era difícil atacar quando o bielorrusso estava na frente do pelotão. Aos 38 anos já preparava a sua retirada, mas queria competir mais uma temporada. Porém, uma anomalia cardíaca antecipou o adeus ao ciclismo de um atleta que também teve os seus momentos de glória, como o título mundial de contra-relógio em 2015. Porém, é inevitável ser lembrado como um como um dos melhores gregários.

A época passada já tinha ficado marcada por algumas semanas de afastamento devido ao problema que agora força a sua reforma. Ainda assim, conquistou mais uma medalha no esforço individual. Ficou com o ouro nos Jogos Europeus que se realizaram no seu país, relegando o português Nelson Oliveira para a segunda posição. Já tinha ficado de fora dos dois últimos Tours, ganhos por Geraint Thomas e Egan Bernal, mas continuava a ser visto pela Ineos como um elemento importante.

"É uma desilusão para o Kiry e para nós como equipa. Ele é verdadeiramente um dos melhores ciclistas de equipa da sua geração. Quando um corredor numa fuga olhava para trás e via o Kiry de camisola aberta na frente do pelotão, a liderar a perseguição, sabia que o seu tempo tinha terminado", salientou Dave Brailsford. O director geral da Ineos acrescentou que, apesar de ser "uma decisão difícil, é obviamente a mais correcta".

Kiryienka reforçou isso mesmo: "É um dia muito triste para mim, mas é a decisão certa, baseada no conselho que me foi dado pela equipa médica. Tive uma carreira maravilhosa e desfrutei todos os minutos com esta equipa. Foi uma viagem incrível e estou tão agradecido por todo o apoio que recebi durante a minha carreira", afirmou o ciclista, em declarações publicadas no comunicado da Ineos.

Como acontece com os gregários, as suas carreiras não podem ser reduzidas apenas a números, pois se escassearam as vitórias, foram muitas e muito importantes aquelas que ajudou outros a alcançar. No entanto, tem algumas a destacar além das já referidas, como as três etapas no Giro (em 2008, 2011 e 2015) e uma na Vuelta (2013), mais uma na Volta ao País Basco, tendo sido campeão nacional de contra-relógio em cinco ocasiões. Ao todo foram 18 triunfos como profissional.

Participou em 20 grandes voltas (sete Giros e outros tantos Tours, mais seis Vueltas). Esteve em três das quatro vitórias de Chris Froome na Volta a França e foi ainda um dos gregários do britânico no Giro que este conquistou em 2018.

Mas a sua capacidade de trabalho despontou antes da sua ida para a Sky. Kiryienka chegou ao World Tour em 2007 pela mão da Tinkoff e dois anos depois mudou-se para a actual Movistar (então Caisse d'Epargne), onde esteve quatro anos. E logo nesse 2009 esteve ao lado de Alejandro Valverde quando o "Bala" venceu a Volta a Espanha.

"Ele tinha uma forma única de manter a parte superior do corpo sólida e gerar uma enorme potência, hora após hora. A única coisa que mudava durante o seu esforço metronómico era o rosto, quando ele procurava as profundezas da energia, dando tudo pela equipa, dia após dia", salientou Brailsford.

Kiryienka pretendia realizar uma última temporada e despedir-se no final de 2020. A saúde obrigou a uma mudança de planos e tornou-se no segundo veterano a ser forçado a terminar a carreira. Por razões bem diferentes, Bernhard Eisel colocou um ponto final ao não encontrar equipa aos 38 anos. A NTT (antiga Dimension Data) não renovou e apesar do desejo de competir mais uma época, Eisel disse adeus. Foi também um ciclista com algumas vitórias importantes, mas destacou-se principalmente no trabalho para os sprinters, tendo sido um fiel companheiro de Mark Cavendish.

»»Ponto final na carreira do ciclista que nunca teve medo de arriscar««

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»»Época de despedida para muitos dos ciclistas mais experientes««

28 de janeiro de 2020

Cofidis é inscrição de última hora e traz Viviani à Volta ao Algarve

(Fotografia: Facebook Team Cofidis)
Forçada a alterar o seu calendário, a Cofidis escolheu a Volta ao Algarve depois de ter sido cancelada a Volta a Omã. Esta inscrição de última hora garantiu assim à única corrida portuguesa do ProSeries mais uma das principais figuras do sprint mundial: Elia Viviani. O italiano confirmou a sua presença, considerando que é uma boa opção para juntar às provas de início de temporada a pensar nos primeiros objectivos da temporada.

O campeão europeu de fundo, quer estar bem nos Mundiais de Pista, para depois apostar em algumas das clássicas da Primavera (Milano-Sanremo no topo das ambições) e no Tirreno-Adriatico, que se realiza antes do monumento italiano. Viviani vai regressar depois ao Giro e, como explicou numa entrevista ao Cyclingnews, a segunda parte da temporada terá o Tour e os Jogos Olímpicos nos planos, sendo que em Tóquio estará novamente na pista. Em 2016, no Rio de Janeiro, conquistou a medalha de ouro no omnium.

A Cofidis torna-se assim a 12ª equipa do World Tour (subiu de escalão em 2020) a estar na Algarvia entre 19 e 23 de Fevereiro, reforçando assim o nome da empresa na corrida. No passado dia 14, o naming da prova do sul do país passou a ser Volta ao Algarve Cofidis. A mudança de calendário da equipa ocorreu devido à morte do Sultão Qaboos bin Said. A organização da Volta a Omã cancelou a corrida devido aos 40 dias de luto no país, que só terminam a 21 de Fevereiro. A prova estava marcada para 11 a 16 do próximo mês.

André Greipel (Israel Start-Up Nation) e Alexander Kristoff (UAE Team Emirates) são dois dos sprinters que poderão lutar com Viviani pelas vitórias na primeira etapa, em Lagos, e na terceira, em Tavira.

Após duas temporadas de enorme sucesso na Deceuninck-QuickStep, o italiano tornou-se num dos reforços da Cofidis, que regressou ao World Tour, uma década depois. A temporada não começou da melhor forma, com Viviani a sofrer uma queda aparatosa na segunda etapa do Tour Down Under. Ficou com alguns ferimentos, mas terminou a corrida australiana. O sprinter continua naquele país, onde fará mais duas corridas, primeiro em Torquay, esta quinta-feira, e depois a Cadel Evans Great Ocean Road Race, no domingo.

Equipas na Volta ao Algarve

WorldTeams (nova designação das equipas World Tour): Astana, Bora-Hansgrohe, CCC,  Cofidis, Deceuninck-QuickStep, Groupama-FDJ, Ineos, Israel Start-Up Nation, Lotto Soudal, Sunweb, Trek-Segafredo e UAE Team Emirates.

ProTeams: Alpecin-Fenix, Caja Rural, Circus-Wanty Gobert, Fundación-Orbea e Uno-X.

Continentais: Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel, Aviludo-Louletano, Efapel, Kelly-InOutBuild-UD Oliveirense, LA Alumínios-LA Sport, Miranda-Mortágua, Rádio Popular-Boavista e W52-FC Porto.


26 de janeiro de 2020

Uma vitória muito bem-vinda num ano importante para Richie Porte

© Tim de Waele/Getty Sport/Trek-Segafredo
Não seria grave não ganhar, mas não fará mal nenhum a Richie Porte começar a época a conquistar o Tour Down Under, a primeira corrida World Tour do ano. Ser o rei de Willunga Hill é algo que Porte gosta bastante e ser batido na "sua" subida não lhe terá agradado (o estreante Matthew Holmes, da Lotto Soudal, foi a surpresa da última etapa). Porém, estando perante um ano importante na sua carreira, vencer a classificação geral foi muito mais relevante do que subir ao pódio "apenas" por ganhar a etapa (até já o tinha feito na terceira).

Fará 35 anos na quinta-feira e já não esperam muito mais temporadas a Porte, principalmente como líder para uma grande volta. A Trek-Segafredo não só prepara a sucessão, como contratou Vincenzo Nibali para partilhar a ribalta. Neste caso há também uma questão de marketing devido ao patrocinador italiano, mas Porte sabe que já não poderá escolher quando é onde quer ser líder. Ficará com o Tour, o que terá sido um alívio, pois Nibali prefere atacar o Giro e pensar nos Jogos Olímpicos. No entanto, já não há margem para mais azares, erros, lesōes por parte do australiano. Richie Porte tem de produzir um resultado no Tour se quiser receber uma renovação de contrato e ambicionar a manter o estatuto mais um ou dois anos, mesmo que mude de equipa. 

Além da Volta a França, não lhe fará mal ganhar outras corridas. É exímio em provas de uma semana e 2020 é um bom ano para recuperar a sua melhor versão nesse tipo de provas. Desde 2018, quando conquistou a Volta à Suíça, que Porte não ganhava uma classificação geral, pelo que não surpreende que tenha admitido que sabia bem voltar a saborear este tipo de sucesso. No currículo conta com vitórias na Romandia, Paris-Nice, Catalunha e também no Algarve, em 2012.

Contudo, Porte é, por agora, aquele ciclista que vive ensombrado pela dúvida do que poderia ter acontecido se não tivesse caído no Tour de 2017, quando se apresentava claramente muito forte, então na BMC. Até já foi quinto (2016), mas aquele ano era um Porte numa forma que não mais repetiu.

Porte não aparece actualmente como alguém que possa desafiar um Egan Bernal, ou porque não dizer um Primoz Roglic, a aposta da Jumbo-Visma para a próxima Volta a França. E não vai aparecer como tal. Ganhar o Tour, só num daqueles momentos inesperados que, falando-se de ciclismo, é melhor nunca dizer nunca. Mas para Porte um pódio seria uma forma de prolongar o seu estatuto e está também na altura de ganhar uma etapa. Pode ser um excelente ciclista para as provas por etapas, mas ao fim de 10 anos ao mais alto nível, continua sem uma única vitória numa grande volta. 

A nova geração está aí. Chris Froome, Nibali e outras grandes figuras da última década sabem disso. Porte, por exemplo, tem um Giulio Ciccone preparadíssimo para assumir uma liderança na Trek-Segafredo, que vá além de conquistar etapas, ser rei da montanha, ou vestir camisolas amarelas por um dia. Tudo já feito! Ciccone é um nome que se vai ouvir na luta por gerais. 

Em 2020 estará ao lado de Nibali no Giro e o jovem italiano mantém o discurso de estar orgulhoso por poder aprender com o "Tubarão de Messina". Mas a Trek-Segafredo sabe que não o pode "prender" muito mais tempo atrás de Nibali e Porte, principalmente se estes não produzirem bons resultados. 

Vencer o Tour Down Under é um bom tónico para Richie Porte. Um pouco de motivação com uma vitória não faz mal a nenhum atleta, independentemente da experiência que tenha. Mas o australiano precisa de mais resultados e boas exibiçōes em 2020 para conseguir ter um lugar de destaque nesta fase emocionante de transição de geração que se vive no ciclismo. 


25 de janeiro de 2020

As novas cores do Tavira

(Fotografia: Facebook Clube de Ciclismo de Tavira)
Depois de quatro anos de parceria com o Sporting, o clube de Alvalade deixou mais uma vez o ciclismo. Já o Tavira segue a sua longa história na modalidade agora com novo nome e, claro, novos equipamentos. Já era conhecido que em 2020 a equipa será Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel. Agora, a um dia do início da temporada para a primeira equipa portuguesa a entrar em acção, a formação algarvia mostrou as novas cores.

O azul e amarelo, cores tão características do sul do país, foram as eleitas no início de uma era em que o director desportivo Vidal Vitas vai apostar forte em Frederico Figueiredo. Ano após ano tem sido um ciclista extremamente regular, com vários top dez e que agora terá a oportunidade mais do que aguardada de ser o líder. O primeiro teste será já na Volta à San Juan, corrida que arranca este domingo. César Martingil, Rúben Simão, Aleksandr Grigorev, Alvaro Trueba e Alejandro Marque (o veterano espanhol continuará a ter um papel de destaque na equipa) estão na Argentina, num pelotão que contará com algumas figuras do ciclismo mundial.

O tricampeão mundial Peter Sagan (Bora-Hansgrohe) elegeu a América do Sul para começa a temporada, assim como Julian Alaphilippe e Remco Evenepoel, da Deceuninck-QuickStep, e Fernando Gaviria que em 2020 terá a seu lado na UAE Team Emirates um lançador que tanto confia: Max Richeze, argentino que estará a correr em casa. O português Nelson Oliveira (Movistar), também estará presente.

(Fotografia: Facebook Clube de Ciclismo de Tavira)
De recordar que em Portugal a época terá início a 16 de Fevereiro, com mais uma edição da Prova de Abertura Região de Aveiro. Três dias depois, a Volta ao Algarve contará com as equipas portuguesas (excepto o Feirense) e 11 do World Tour.

No Facebook do Clube de Ciclismo de Tavira é possível ver mais fotografias dos novos equipamentos e é também explicado que "a pedido das Conservas Ramirez o nome impresso nos equipamentos em corridas internacionais será Conservas Ramirez, ficando nas corridas em Portugal o nome Atum General". A troca foi devidamente autorizada pela UCI.

Os ciclistas da Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel vão continuar a contar com as bicicletas KTM, equipadas com travões de disco, tal como em 2019.

A Volta a San Juan realiza-se até ao próximo sábado (transmissão no Eurosport a partir das 22 horas) e depois de duas etapas para sprinters, haverá um contra-relógio, antes de três dias de montanha, mas apenas um de alta montanha. A fechar, mas uma tirada para os homens rápidos do pelotão.



Intxausti termina a carreira a pensar onde poderia ter chegado

Vestir a camisola rosa em 2013 foi um dos pontos altos
da carreira do ciclista basco
(Fotografia: Facebook Movistar Team)
Outrora visto como um talentoso basco que a Sky foi buscar à Movistar por acreditar que poderia tornar-se num elemento chave da equipa, esse mesmo 2016 que Beñat Intxausti pensou ser o ano do salto em frente numa carreira já com momentos importantes, acabou por ficar marcado por um início de um pesadelo que nunca chegou ao fim. Diagnosticado com uma mononucleose, a temporada que começou promissora, com bons resultados na Volta à Comunidade Valenciana, terminou em Julho e já com semanas de interrupção pelo meio. Foram apenas 15 dias de competição. Intxausti bem tentou regressar ao seu melhor nível e teve o total apoio da Sky e mais tarde da Euskadi-Murias, mas aos 33 anos admitiu que não é possível atingir o nível que o profissionalismo exige. Ponto final na carreira.

Em 2017 só começou a competir em Julho, mas abandonou a Clássica de San Sebastián. Em Outubro foi à China com a ilusão que o pior poderia ter passado. Abandonou a Volta a Guangxi ao segundo dia. Ainda assim, a Sky renovou por mais um ano com Intxausti. Cinco dias de competição em 2018. Era o fim do sonho de triunfar na toda poderosa Sky, depois de na Movistar ter ganho duas etapas no Giro e vestido a camisola rosa, algo que agora considera como um dos momentos altos da carreira, assim como o segundo lugar na Volta ao País Basco em 2010, que perdeu para Chris Horner por 58 segundos.

Foi um ciclista para lutar pela geral, como comprovam o quarto lugar no Critérium de Dauphiné, o quinto na Romandia e um oitavo no Giro, a sua melhor classificação numa grande volta. E fez três a Itália, duas a França e cinco a Espanha. Venceu a Volta a Pequim em 2013, batendo Daniel Martin, num ano em que Rui Costa - então companheiro de equipa de Intxausti - também esteve na luta, sendo quarto, a apenas 18 segundos. "Agora estou tranquilo com aquilo que fiz", afirmou Intxausti quando anunciou o seu adeus, no início da semana.

No entanto, haverá sempre um "se" que acompanhará Intxausti: "Fui para a Sky num ano chave da minha carreira, mas chegou a doença e isso é algo que tenho pena. Não sei onde poderia ter chegado." Depois de tantas boas exibições, inclusivamente em 2015, Intxausti eclipsou-se devido à mononucleose. No ano passado fez uma última tentativa na Euskadi-Murias. Um regresso a casa, a uma equipa basca. O ciclista representou numa só época a Euskaltel-Euskadi (2010), no seu segundo ano no World Tour. A estreia foi na Fuji-Servetto, com a Movistar a contar com Intxausti durante cinco temporadas.

Na Euskadi-Murias conseguiu competir com mais frequência. 39 dias. Porém, somou muitos abandonos, sendo a Volta ao Alentejo das poucas que terminou. Com a equipa a fechar portas ao não conseguir garantir patrocinadores para 2020 e sendo claro que Intxausti não conseguiria ser o ciclista de outros tempo devido à doença, a opção é seguir outro caminho, que não será totalmente novo, já que garantiu que vai manter-se ligado ao ciclismo.


22 de janeiro de 2020

Froome agenda regresso para Fevereiro numa época cheia de dúvidas

© Team Ineos
Abandonou um estágio, regressou no seguinte; a Ineos anuncia Bernal e Thomas como líderes para a Volta a França, no dia seguinte Froome diz que só vai pensar no Tour em 2020... O ciclista britânico vai estar no centro das atenções mais do que nunca. Até mais do que há dois anos, quando uma suspensão por ter superado os valores permitidos de um medicamento para a asma, pairou durante vários meses. Chris Froome já deixou bem claro que esta época será toda preparada a pensar na participação no Tour. É esse o único resultado que lhe interessa, mas para isso terá de ganhar antes uma luta: recuperar 100% das graves lesões após a queda no Critérium du Dauphiné, em Junho.

O ciclista garantiu que está a treinar normalmente, depois dos médicos lhe terem dado luz verde para o fazer. No entanto, as dúvidas são mais do que muitas, sobretudo depois das declarações de um dos directores desportivos da Ineos. Froome abandonou um dos estágios da equipa por, alegadamente, não estar em condições. Dois sites italianos, Bicisport e SpazioCiclismo, citaram o responsável Dario Cioni: "Ele não está bem e quem sabe se recuperará?"

Dias depois, Froome integrou outro estágio da Ineos, em Espanha, e até brincou com a situação. O britânico tenta demonstrar alguma confiança no processo de recuperação, já por parte dos responsáveis da equipa, o discurso é mais cauteloso. Dave Brailsford, o director principal da equipa, é um exemplo disso mesmo. Anunciou que Egan Bernal e Geraint Thomas serão co-líderes no Tour, limitando-se a dizer sobre Froome: "E claro, o Chris está a voltar. Ele ainda ambiciona muito àquela grande quinta vitória e está a trabalhar muito, no duro para regressar ao nível necessário para ser competitivo."

A nomeação de Bernal para o Tour, que venceu em 2019, não é uma surpresa e o próprio colombiano já havia confirmado, mas a escolha de Thomas é apenas mais um sinal que a Ineos quer estar preparada para ter as melhores armas, sem estar dependente da recuperação de Froome. O britânico terá todo o apoio até à Volta a França, mas a  Ineos não está a precisar de olhar para o futuro, pois já tem o novo ciclista do presente. Bernal tem apenas 23 anos, ganhou a grande volta mais desejada e até já fala de não se importar em não ter o Tour como objectivo, pois também quer conquistar o Giro e Vuelta. Claro que ao ser eleito um dos líderes, Bernal só pensa em estar a 100% para tentar vencer novamente o Tour.

A queda no Critérium du Dauphiné vai marcar a carreira de Froome. Falta saber se vai marcar como o princípio do fim, ou se haverá capacidade física e mental para o britânico ser a figura principal de uma história de quem recuperou de lesões que potencialmente poderiam tê-lo afastado do ciclismo, para entrar o restrito grupo de quem venceu o Tour em cinco ocasiões.

Mentalmente, Froome já mostrou vezes sem conta como é forte. Há dois anos lidou com a enorme pressão de toda a suspeita que recaiu sobre ele, com alguns ciclistas a expressarem que não deveria estar no Giro. Nessa corrida, mostrou mais uma vez que o darem como derrotado é um erro. Uma fuga de 80 quilómetros pela montanha para ganhar a camisola rosa foi algo simplesmente épico. Muitas das suas vitórias, principalmente no Tour, têm por trás uma Ineos fortíssima, que protege o líder como poucas equipas. Aos 34 anos, Froome sabe que a luta é só sua para recuperar fisicamente e acabar com todas as dúvidas.

Talvez seja preciso esperar até 26 de Junho, quando começa o Tour, para perceber o que reserva a Chris Froome, que sabe que não terá muito mais tempo para perseguir aquela quinta vitóra. É que além de Bernal, o que não falta na Ineos são jovens talentos preparados para ser as figuras da equipa.

Fracturas no fémur, cotovelo e em algumas costelas, no esterno, osso situado na parte anterior e média do tórax, e na vértebra C7... Depois de tudo isto, Froome não desiste. Falta aquela quinta vitória no Tour. Talvez a sexta e assim ser o recordista solitário, já seja algo que evite pensar perante o desafio que agora enfrenta. Porém, para tentar chegar à quinta, vai fazer o primeiro teste em competição em Fevereiro. A corrida eleita foi a Volta aos Emirados Árabes Unidos, de 23 a 29 do próximo mês. Em Outubro foi ao Japão para um evento de exibição e pedalou durante 3,1 quilómetros. Agora começa a ser mais sério.

Infelizmente para os adeptos portugueses, esta decisão afasta Froome da Volta ao Algarve. Ainda chegou a ser falada como possível a sua vinda ao sul do país, mas com o final em Lagoa a ser no dia em que arranca a prova nos Emirados, será Geraint Thomas a estrela da Ineos na Algarvia, onde irá procurar a sua terceira vitória.


20 de janeiro de 2020

Os portugueses no World Tour

O contingente português no World Tour ficou mais curto, mas, ainda assim, é mais um exemplo do que está a acontecer no pelotão internacional: os mais jovens estão a conquistar o seu espaço. Dos seis lusos, quatro têm 25 anos ou menos. Já duas das principais figuras do ciclismo nacional na última década continuam a sua carreira ao mais alto nível, depois de terem renovado pelas respectivas equipas por mais duas temporadas. É o caso de Nelson Oliveira e Rui Costa.

Entre os mais novos, o destaque deste início de 2020 é a estreia de João Almeida. Tal como os restantes três jovens portugueses no World Tour, esteve dois anos na formação americana da Hagens Berman Axeon antes de dar o salto. E que salto! O campeão nacional de fundo e contra-relógio de sub-23 entrou para a equipa que mais ganha, é a dominadora das clássicas (principalmente do pavé) e que chega a qualquer outra corrida quase sempre a somar triunfos. E praticamente todos os seus ciclistas têm oportunidades para brilhar.

Recorde-se que José Gonçalves e Amaro Antunes despediram-se do World Tour no final de 2019, o primeiro depois de três anos na Katusha-Alpecin e o segundo apenas após uma época, a que a CCC subiu ao escalão mais alto. Gonçalves está na francesa Nippo Delko One Provence (ProTeam) - que já havia representado em 2013 e 2014 - e Amaro regressou à W52-FC Porto (Continental).

© Deceuninck-QuickStep
João Almeida (21 anos, Deceuninck-QuickStep, estreante no World Tour)
É o primeiro dos portugueses a entrar em acção em 2020. Ou melhor, já entrou, pois no domingo participou na clássica Schwalbe, corrida de apenas 50 quilómetros integrada no programa do Tour Down Under. Mas é esta prova australiana que abre oficialmente o calendário World Tour, na madrugada desta terça-feira. João Almeida vai ter tempo para se adaptar à competitiva realidade não só desta categoria, mas de uma equipa sempre sobre intenso escrutínio. No entanto, a Deceuninck-QuickStep é uma formação que dá tempo às suas jovens apostas para evoluírem, com pouca pressão, dando oportunidades para começarem a mostrar-se ao seu ritmo. O português é um ciclista que tem potencial para as provas por etapas, mas há clássicas que lhe assentam bem. No seu currículo está a vitória na Liège-Bastogne-Liège de sub-23 em 2018. Almeida surge na imprensa especializada como um dos os estreantes a seguir com atenção em 2020. 

© UAE Team Emirates
Ivo Oliveira (23 anos, UAE Team Emirates, segunda temporada no World Tour)
Não foi uma primeira época para recordar. A queda num treino em Abril foi de tal forma grave que o ciclista correu o risco de não voltar a andar. Conseguiu recuperar, acabou o ano a sagrar-se campeão nacional de omnium no Velódromo de Sangalhos e agora quer continuar em 2020 a afirmação interrompida. Vamos vê-lo na Volta ao Algarve e na UAE Team Emirates continua a ser considerado como um dos talentos jovens que a equipa quer desenvolver e inclui-lo no núcleo duro que, no futuro próximo, torne a equipa numa das mais fortes no World Tour. O contra-relógio poderá ser um dos seus pontos fortes quando chegar a altura de lutar por resultados pessoais, mas começará por ser um ciclista que trabalhará muito para a equipa. Consoante a sua evolução, poderá surgir alguma oportunidade para se destacar e Ivo não quer perder mais tempo em mostrar todo o talento mais do que reconhecido apesar de ter apenas 23 anos.

© UAE Team Emirates
Rui Oliveira (23 anos, UAE Team Emirates, segunda temporada no World Tour)
Ao contrário do irmão gémeo, Rui teve uma época de estreia muito positiva. Conseguiu afirmar-se como um elemento importante a trabalhar para os líderes, principalmente na preparação de sprints. Jasper Philipsen (que também esteve na Hagens Berman Axeon) foi um dos ciclistas que beneficiou do grande trabalho realizado por Rui em algumas corridas. Infelizmente para o jovem corredor de Gaia, a temporada começou com uma queda na pista. A clavícula partida é um revés para um ciclista que queria começar apostar na primeira metade da temporada, também a pensar na possibilidade de ser chamado para a Volta a Itália, pois está pré-convocado. Porém, apesar da lesão, Rui mantém-se optimista que poderá ter um bom 2020. O plano de continuar a evoluir e de conquistar o seu lugar na equipa continuará intacto, mesmo que corra o risco de ver adiado o objectivo de se estrear numa grande volta. Poderá ter de mudar o calendário (já não estará na Volta ao Algarve), mas não muda a sua atitude de lutador, de quem quer sempre estar ao seu melhor.

© EF Pro Cycling
Ruben Guerreiro (25 anos, EF Pro Cycling, quarta temporada no World Tour)
Guardou para o final 2019 o melhor e aquela Vuelta pode marcar a carreira de Ruben Guerreiro. Apesar de já ir para o seu quarto ano no principal escalão, os primeiros dois foram marcados por muitos altos e baixos. Tanto aparecia a confirmar expectativas, como uma queda ou um problema de saúde, atrasavam a sua afirmação. Na Katusha-Alpecine estabilizou um pouco e a exibição na Volta a Espanha despertou novamente o interesse das equipas. Regressa a uma formação americana (além da Hagens Berman Axeon, estreou-se no World Tour na Trek-Segafredo) que lhe dará liberdade para perseguir os seus resultados em várias corridas, mas não se livrará também de algum trabalho para companheiros. O campeão nacional de 2017 não esconde o desejo de apostar nas três semanas. Admitiu que não sabia o que poderia fazer em provas tão longas, mas a Vuelta não só lhe aguçou o gosto por estas corridas, como lhe deu confiança que pode alcançar bons resultados.

© Photo Gomez Sport/Movistar Team
Nelson Oliveira (30 anos, Movistar, 10ª temporada no World Tour)
É uma peça fundamental da Movistar, que representa desde 2016. Num ano atípico com muitas entradas e saídas de ciclistas na equipa espanhola, a importância do português foi mais uma vez notória com a renovação de contrato por mais duas temporadas. Apesar de ser um ciclista de trabalho, função que continuará a ser a sua principal na Movistar, tem voz para também conseguir ter um calendário que lhe agrade. Com os Jogos Olímpicos a poucos meses, Nelson Oliveira preferia deixar de parte a Volta a França, que termina apenas seis dias antes da corrida de fundo olímpica. Concretizou o desejo e vai ao Giro, com a Movistar a dar a oportunidade do português gerir a sua forma física para estar bem em Tóquio, a pensar mais no contra-relógio. Mas antes dos Jogos, a Movistar sabe que terá sempre o melhor e leal Nelson na ajuda aos seus líderes.

© UAE Team Emirates
Rui Costa (33 anos, UAE Team Emirates, 12ª temporada no World Tour)
Dos seis portugueses no World Tour, três estão na UAE Team Emirates. A equipa até pode estar a apostar cada vez mais em jovens talentos, mas não abdica em ter ciclistas experientes. Rui Costa renovou por mais dois anos e vai para o seu sétimo na estrutura, contando com o tempo em que era a Lampre-Merida. Já não é um dos líderes, mas não significa que ficará relegado apenas ao papel de apoio. Já na Volta ao Algarve terá a oportunidade de lutar pela vitória, situação que deverá acontecer noutras corridas, como a muito desejada Liège-Bastogne-Liège, uma das clássicas preferidas do campeão do mundo de 2013. Neste caso, provavelmente irá partilhar a liderança. Tal como Nelson Oliveira na Movistar, Rui Costa tem estatuto na equipa para conseguir "negociar" um calendário que lhe permita lutar por objectivos pessoais que incluem a selecção nacional. Também vai apostar forte nos Jogos Olímpicos, ficando Rui com a responsabilidade de ir atrás da medalha olímpica na corrida de fundo. Com a UAE Team Emirates a rechear-se de ciclistas fortes, Rui Costa pode ter um papel diferente de há uns anos, mas é ainda assim importante e jovens como os gémeos Oliveira só têm a beneficiar da experiência do poveiro.

»»Movistar renovada, UAE Team Emirates a apostar nos jovens e uma nova era na Sunweb««

»»Os colegas de equipa de João Almeida e Ruben Guerreiro e a estreia da Israel Start-Up Nation««

18 de janeiro de 2020

Mais uma parceria entre o ciclismo e a Fórmula 1

(© Israel Start-Up Nation/Israel Cycling Academy)
E já são três. Se até ao final de 2018 o mais próximo que existia entre marcas ligadas à Fórmula 1 e o ciclismo eram parcerias para criar bicicletas - que só estão ao alcance de alguns bolsos -, agora as duas modalidades estão a unir-se cada vez mais. A mais recente junção é entre a recém-chegada ao World Tour Israel Start-Up Nation e a histórica Williams, uma das estruturas mais antigas deste desporto automóvel. Os moldes desta parceria são um pouco diferentes das duas já existentes, pois o foco é mais no marketing, do que na tecnologia.

A McLaren juntou-se à Bahrain no final de 2018 e esta temporada já tem o seu nome na equipa. Perto do Natal, a toda poderosa Ineos anunciou a parceria com a formação que tem dominado a Fórmula 1, a Mercedes. Em ambos os casos, o desenvolvimento tecnológico, a análise de dados, um trabalho que permita uma melhor performance dos atletas, faz parte dos acordos. Já no caso da Israel Start-Up Nation e Williams está em causa promover o nome principalmente da equipa de ciclismo.

"O carro da Williamos terá o logotipo da Israel Start-Up Nation e haverá um marketing cruzado e desenvolvimento de produtos entre os dois programas", explicou Sylvan Adams, um dos donos da estrutura israelita de ciclismo. A Williams terá também um piloto de testes de Israel, Roy Nissany, amigo dos corredores Guy Sagiv e Guy Niv,

Adams referiu que espera que esta parceria possa levar a sua equipa a ter alguma projecção entre os adeptos de Fórmula 1 da Williams, ganhando assim mais apoio. E o objectivo passa também por levar os seus actuais fãs a seguir mais aquele desporto motorizado, apoiando a Williams.

A Israel Start-Up Nation não está certamente a querer passar despercebida quando se prepara para a sua primeira temporada no principal escalão. A compra da licença da Katusha-Alpecin permitiu dar este salto, há muito desejado. Começou por contratar ciclistas bem conhecidos, como André Greipel e Daniel Martin e garantiu que Nils Politt - uma das confirmações de 2019 - fizesse a passagem da Katusha-Alpecin para a equipa israelita. Mudou o nome (era Israel Cycling Academy, que passa a ser a equipa de desenvolvimento, que está no escalão Continental) e agora quer ter a certeza que o novo seja bem conhecido, além do ciclismo. No entanto, é o antigo que aparece no monolugar da Williams (ver fotografia em cima).

A Williams ganha um aliado com algum poderio financeiro, sendo uma equipa que há muito não consegue o destaque que teve nas décadas de 80 e 90, quando lutava e ganhava campeonatos do mundo. O último foi em 1997, com Jacques Villeneuve, tendo sido também a derradeira vez que venceu o Mundial de Construtores. Quanto a Grandes Prémios, Pastor Maldonado venceu em Espanha em 2012, terminando com um jejum que durava de 2004. Mas desde então que não nenhum piloto da Williams sube ao lugar mais alto do pódio.

Terça-feira arranca oficialmente a temporada com o início do Tour Down Under. Este domingo, durante a madrugada na Europa, realiza-se a habitual corrida de apenas 51 quilómetros, que tem sido uma forma diferente de "aquecer motores" para a longa época de ciclismo.

»»A equipa que domina o Tour junta-se à que domina a Fórmula 1««

»»Bahrain terá novo segundo nome de um parceiro mais conhecido da Fórmula 1««

16 de janeiro de 2020

Convites para o Giro ficam em casa

(© Giro d'Italia)
No ano em que as organizações viram reduzidos os convites que podiam atribuir para as suas corridas, grandes voltas e não só, no que diz respeito às provas de três semanas a escolha está a recair em garantir a presença das equipas da casa. Foi assim com a ASO na Volta a França e agora a RCS Sport seguiu o exemplo para o Giro. Até teve direito a mais um wildcard do que o inicialmente previsto, pelo que foi possível colocar as três equipas italianas sobreviventes no segundo escalão do ciclismo, as ProTeams.

Androni Giocattoli-Sidermec, Bardiani-CSF-Faizanè e Vini Zabù-KTM (a antiga Neri Sottoli-Selle Italia-KTM) têm lugar garantido na Volta a Itália (de 9 a 31 de Maio), para alívio dos responsáveis das três formações. Com as novas regras estabelecidas pela UCI, as organizações passaram a dispor de dois convites em vez dos habituais quatro. A vencedora do ranking entre as ProTeams no ano anterior - neste caso a francesa Total Direct Energie - fica com presença assegurada e com a subida da Cofidis a World Tour, passaram a ser 19 equipas neste nível e o limite nas provas de três semanas continua a ser de 22 formações.

Mauro Vegni acabou por beneficiar do abdicar da Total Direct Energie no que diz respeito ao Giro (irá ao Tour e à Vuelta), algo também previsto nos regulamentos. Desta forma, o director da corrida passou a ter três convites, algo que muito desejava para não ter de deixar uma das formações italianas de fora. Não é que já não o tenha feito no passado recente, quando até dispunha de quatro convites. Contudo, Itália não tem representantes no World Tour e no segundo escalão a Nippo Vini Fantini Faizanè-Selle Italia fechou portas no final de 2019, pois tornou-se ainda mais difícil garantir patrocinadores quando não se consegue "vender" uma provável presença no Giro. Era importante que as três estruturas resistentes tivessem espaço na grande volta italiana.

Algumas notícias deram conta que a organização da Volta a Itália até teria oferecido dinheiro à Total Direct Energie para que esta abdicasse do seu lugar, mas oficialmente a decisão foi justificada com a falta de capacidade para competir num calendário tão extenso, sendo que o principal objectivo continua a ser cumprir o calendário francês, independentemente da categoria a que as corridas pertençam.

Nas últimas duas temporadas a Israel Cycling Academy havia sido uma das convidadas para o Giro, mas este ano também não era uma concorrente para as equipas italianas, pois comprou a licença World Tour da Katusha-Alpecin, subindo assim de escalão. Chama-se agora Israel Start-Up Nation.

A RCS Sport também anunciou os wildcards para outras das suas corridas. O destaque vai inevitavelmente para os que foram entregues à Alpecin-Fenix, que abrem as portas a Mathieu van der Poel à sempre espectacular Strade Bianche e ao monumento Milano-Sanremo. Mais uma oportunidade para o holandês começar a ganhar nos chamados cinco monumentos, pois já sabia que podia estar presente na Volta a Flandres e Paris-Roubaix.

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15 de janeiro de 2020

Ponto final na carreira do ciclista que nunca teve medo de arriscar

Um dia marcante na carreira de Filipe Cardoso (Fotografia: © Volta a Portugal)
É o adeus de um ciclista que, em tempos recentes, foi a par de Rui Sousa dos mais acarinhados pelos adeptos portugueses. Filipe Cardoso foi sempre um corredor que não se coibiu de dar espectáculo, fosse pelo seu estilo atacante, sem medo de arriscar, fosse pelas pequenas acrobacias, que quem assista vibrava a ver. Nem que fosse um cavalinho em plena Senhora da Graça! Foi precisamente nesta mítica subida que viveu um dos grandes momentos da sua carreira, ele que foi um ciclista que tanto trabalhou para os líderes das equipas que representou. Contudo, para quem acompanhava na berma da estrada as corridas, Cardoso sempre foi um dos favoritos, pois nem tudo se resume a quem mais ganha. Ambicionava colocar um ponto final na carreira sob os seus termos. E assim foi. É altura de agarrar novos desafios.

"Quero acabar a carreira de bem com a modalidade e com as pessoas que dela fazem parte. Quero sair sabendo que vou ter vontade de ir assistir à Volta a Portugal e de telefonar aos meus amigos do pelotão. Obrigado pelas propostas das equipas que recebi e recusei para 2020", escreveu na sua página de Facebook. Realçou que o final de carreira não é uma coisa má, "é só uma mudança". O pelotão nacional perde uma das suas vozes mais fortes e que no último ano representou a Vito-Feirense-PNB. Nesta estrutura teve um papel importante ao lado de jovens companheiros que estavam a chegar ao mais alto nível do ciclismo português.

Parte da sua carreira foi passada na Efapel (seis anos), mas esteve na extinta Liberty Seguros, LA, reencontrou-se com o amigo Rui Sousa (que terminou a carreira em 2017) na Rádio Popular-Boavista, antes da última aventura no Feirense. Filipe Cardoso admitiu algum cansaço em ser ciclista profissional, mas deixa claro que continua a adorar andar de bicicleta, que continuará presente na nova fase da sua vida.

"Eu adoro as bicicletas e o ciclismo, mas sempre soube que a vida de ciclista profissional não dura para sempre e que a saída na altura errada nos pode perseguir por muito tempo, ou até para sempre. Por isso tenho vindo a preparar o final da minha carreira da forma que me parece mais acertada, por minha vontade, numa altura em que ainda tenho o que é preciso para ser combativo e acrescentar valor a uma equipa profissional de ciclismo. Não quero sair por qualquer outro motivo, mais tarde, contra minha vontade", lê-se no texto de despedida. E acrescentou: "Já me diziam os 'velhinhos' atletas nos meus primeiros anos de profissional: 'Quando começares a ter dúvidas é hora de parar'."

E Filipe Cardoso parou e a sua nova paragem passa pela Grandíssima. O projecto nasceu há pouco mais de dois anos e é mais do que uma loja. É onde se vive a "cultura da bicicleta". O adeus ao ciclismo profissional já estava a ser preparado desde que abraçou a Grandíssima, localizada em Sanfins, Santa Maria da Feira.

Mas antes de se fechar o capítulo de se escrever sobre o ciclista Filipe Cardoso, é inevitável recuar àquele 2 de Agosto de 2015. Foi o dia em que arriscou tudo para ganhar na Senhora da Graça. Naquele ano não houve cavalinhos, mas uma determinação em vencer num local que tanta história tem no ciclismo nacional.

Longe de ser um trepador nato, naquela quarta etapa da Volta a Portugal, Cardoso subiu quase como tal. Porém, ainda mostrou porque era um corredor que dava tudo pela equipa. Apesar de ter cerca de quatro minutos de vantagem antes dos oito quilómetros da mítica subida, Cardoso perguntou ao seu então director desportivo na Efapel se era necessário esperar por um companheiro. Américo Silva acreditou que o ciclista poderia ganhar, mesmo tendo Joni Brandão na luta pela geral. Deu-lhe liberdade para conquistar a glória. O risco compensou.

"Ao vir sozinho corri alguns riscos, mas quando se quer vencer não se pode pensar nisso. No dia em que tiver medo de arriscar deixarei de ser ciclista", disse após cortar a meta, algo incrédulo com o que tinha alcançado e com o seu companheiro, Joni Brandão, a recuperar praticamente todo o tempo que tinha de desvantagem, mas a não tirar um momento único na carreira de Filipe Cardoso. Somou outras vitórias, como três etapas na Volta ao Alentejo, lutou por muitas mais, ajudou companheiros a alcançar os objectivos.

Como se pode ver na fotografia que publicou no Facebook (ver em baixo), é tempo de brindar à carreira que teve e, principalmente, aos novos desafios.

Aqui fica o texto de despedida completo, publicado pelo agora ex-ciclista na referida rede social.




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14 de janeiro de 2020

Ineos completa pelotão de uma Volta ao Algarve com novo 'naming'. Feirense fica de fora

(© João Fonseca Photographer)
Onze equipas World Tour, quatro do segundo escalão e as portuguesas Continentais, ainda que com uma ausência. A pouco mais de um mês do arranque de um dos grandes eventos de ciclismo em Portugal, o único que traz ao país alguns dos melhores do mundo da modalidade - este ano há a "concorrência" da Vuelta que terá duas etapas a passar por cá -, foi confirmada oficialmente a presença da Ineos, o que faz com que a 46ª edição vá contar com 11 das 19 equipas da principal categoria. Além disso juntam-se cinco ProTeams, com a novidade a ser a espanhola Fundación-Orbea, uma vez que a Alpecin-Fenix já tinha confirmado ter escolhido para este início de temporada a Volta ao Algarve Cofidis, o novo naming da prova.

Entre os ciclistas que já anunciaram a presença no sul do país entre 19 e 23 de Fevereiro, não haverá dúvidas que o pelotão será novamente de luxo. Vincenzo Nibali e Bauke Mollema (Trek-Segafredo), Remco Evenepoel (Deuceninck-QuickStep), Philippe Gilbert (Lotto Soudal), Max Schachmann (Bora-Hansgrohe), sem esquecer o regresso de Rui Costa, que terá ao seu lado na UAE Team Emirates Ivo Oliveira, Mikkel Bjerg e Alexander Kristoff, são alguns exemplos.

Mais confirmações de ciclistas deverão acontecer até ao final do mês, com Geraint Thomas também a ter apontado a Algarvia como local para preparar a temporada, sendo uma corrida que já venceu por duas ocasiões. Pode ser o primeiro estrangeiro a conquistá-la por três vezes, feito igualmente ao alcance do seu companheiro, Michal Kwiatkowski. O polaco também poderá ser mais uma das estrelas na prova, com a Ineos a ser uma equipa com hábitos vencedores no Algarve, quando se chamava Sky. Greg van Avermaet (CCC) preferirá igualmente uma viagem a Portugal. Chris Froome (Ineos) e Mathieu van der Poel (Alpecin-Fenix) são dois nomes que estão a gerar alguma expectativa. O holandês já foi dado como certo por alguma imprensa, mas falta a confirmação oficial. O britânico, dado estar a recuperar das lesões contraídas na queda em Junho, ainda não tem qualquer calendário definido, a não ser o objectivo de estar na Volta a França.

Quanto às ProTeams (nova designação das equipas Profissionais Continentais), a Fundación-Orbea fará a sua estreia, naquele que é o primeiro ano da estrutura neste escalão. No ano passado, como Continental, esteve no nosso país e nunca passou despercebida, tendo sido, por exemplo, uma das principais animadoras da Volta a Portugal e venceu uma etapa na Volta ao Alentejo, por intermédio de Sergio Higuita. A equipa basca gosta de andar ao ataque. Também a norueguesa Uno-X conhece o país. Seguiu o exemplo de subida de escalão e esta presença irá fazer com que a Algarvia seja acompanhada na Noruega.

Apesar de ser uma corrida atractiva para algumas das principais equipas mundiais, há sempre espaço para as formações portuguesas. 2020 não será excepção, mas o Feirense fica de fora. Com a perda de patrocinadores, a equipa sofreu uma reestruturação e a inscrição surgiu um pouco mais tarde. Fica de fora da Algarvia, mas estará na estrada nas restantes corridas portuguesas.

São várias as competições que se realizam na mesma altura da Volta ao Algarve, numa fase do calendário cada vez mais preenchida. Ainda assim, as formações do World Tour continuam a eleger a Algarvia como uma das suas preferidas. A parceria com a Cofidis, cujo contrato foi esta terça-feira assinado entre a empresa e a Federação Portuguesa de Ciclismo, vem reforçar o estatuto e interesse que a corrida gera, tendo um orçamento a rondar os 600 mil euros. Porém, este acordo não significou que a equipa Cofidis estivesse presente, algo que aconteceu em anos recentes. O pelotão será forte, mas é difícil não lamentar que a Jumbo-Visma tenha escolhido outras paragens em 2020 que não o Algarve. Primoz Roglic, vencedor da última Vuelta, tem o seu nome entre os vencedores (2016) e Dylan Groenewegen gosta de ganhar por cá ao sprint.

De referir que a Cofidis também patrocina o Algarve Granfondo, que se realiza no último dia da corrida e vai em conjunto com a federação dinamizar a prática de base, recreativa, desportiva e utilitária do ciclismo junto dos mais jovens, através do já existente programa O Ciclismo Vai à Escola.

As 24 equipas da 46ª Volta ao Algarve Cofidis

WorldTeams (nova designação das equipas World Tour): Astana, Bora-Hansgrohe, CCC, Deceuninck-QuickStep, Groupama-FDJ, Ineos, Israel Start-Up Nation, Lotto Soudal, Sunweb, Trek-Segafredo e UAE Team Emirates.

ProTeams: Alpecin-Fenix, Caja Rural, Circus-Wanty Gobert, Fundación-Orbea e Uno-X.

Continentais: Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel, Aviludo-Louletano, Efapel, Kelly-InOutBuild-UD Oliveirense, LA Alumínios-LA Sport, Miranda-Mortágua, Rádio Popular-Boavista e W52-FC Porto.

»»Evenepoel na Volta ao Algarve. E Van der Poel?««

»»Os perfis das cinco etapas da Volta ao Algarve««

11 de janeiro de 2020

Evenepoel na Volta ao Algarve. E Van der Poel?

(© Sigfrid Eggers/Deceuninck-QuickStep)
Um dos ciclistas que está a conquistar o World Tour e um dos novos fenómenos da modalidade, confirmou a presença na Volta ao Algarve. Depois de Tadej Pogacar (UAE Team Emirates) ter conquistado a edição de 2019, partindo para uma primeira temporada de luxo, este ano teremos Remco Evenepoel. A jovem estrela belga confirmou que a corrida portuguesa faz parte do seu calendário e fica desde já como um dos candidatos à geral, pois este Evenepoel estará a preparar a sua estreia numa grande volta, o Giro.

A afirmação foi feita ao site wielerflits.be e Evenepoel será inevitavelmente um cabeça-de-cartaz, juntamente com Vincenzo Nibali (Trek-Segafredo), numa perspectiva de ciclistas que nunca estiveram nesta corrida. Mas há mais três grandes nomes que ainda se aguarda com expectativa a confirmação. Mathieu van der Poel estará por decidir se vem a Portugal ou à Ruta del Sol, prova espanhola que se realiza exactamente nas mesmas datas, de 19 a 23 de Fevereiro. Já foi dado como certo na Algarvia por alguma imprensa, mas, a nível oficial, a única garantia é a presença da Alpecin-Fenix, a antiga Corendon-Circus. Com o aproximar do arranque de temporada de estrada - o holandês tem andando dedicado à sua paixão do ciclocrosse - não deverá demorar muito a ser anunciado o seu calendário. Escusado será dizer, que será muito bem-vindo em Portugal!

Outro corredor que poderá estar a caminho, ainda que já com muita experiência na Algarvia, é Geraint Thomas. O vencedor das edições de 2015 e 2016 confessou há um ano o quanto gosta do Algarve, pois ao não estar presente, escreveu nas redes sociais o desejo de regressar. Se o galês escolher a Algarvia, poderá tornar-se no primeiro estrangeiro a ganhar a corrida por três ocasiões, algo que o seu companheiro da Ineos também o poderá fazer: Michal Kwiakowski. A equipa ainda não foi confirmada na Volta ao Algarve, mas a presença é praticamente certa. A título de curiosidade, Belmiro Silva é um único com o tri: 1977, 1981 e 1984.

E Miguel Ángel López, da Astana, também poderá escolher a Volta ao Algarve como prova de início de temporada.

Quanto a Remco Evenepoel, é o campeão europeu de contra-relógio e com apenas 19 anos é visto como um dos maiores talentos da nova geração. Como júnior praticamente só soube ganhar, saltando directamente para a Deceuninck-QuickStep em 2019. De início precisou de uma fase de adaptação, apesar da sua vontade de rapidamente mostrar serviço. Chegou a ouvir algumas críticas do director Patrick Lefevere, que procurou principalmente espicaçar o jovem atleta. Em Junho conquistou a Volta à Bélgica, foi brilhante na Clássica San Sebastián e ninguém tem dúvidas do fenómeno que é, sendo apenas incerto tudo o que poderá alcançar, pois o seu potencial é enorme.

2020 vai começar para Evenepoel na Volta a San Juan, na Argentina, sendo que depois do Algarve viajará para Itália, para o Tirreno-Adriatico, tendo como objectivos nas clássicas a Flèche Wallonne e o monumento Liège-Bastogne-Liège, antes de atacar o Giro, que será uma corrida encarada mais para ganhar experiência. Mas Evenepoel não é um ciclista que goste de "passear" quando está a competir.

Entre os jovens talentos no Algarve, igualmente com 21 anos, Mikkel Bjerg é o contra-relogista que quer conquistar o mundo nesta vertente e tornar-se recordista da hora. É tricampeão mundial de sub-23 de contra-relógio, um feito inédito neste escalão. É mais uma jovem aposta da UAE Team Emirates, que contará com o experiente Rui Costa como líder e os gémeos Oliveira também poderão estar presentes na Algarvia. Pogacar será "desviado" para a Volta aos Emirados Árabes Unidos, que começa no último dia da Volta ao Algarve.

Na luta pela geral, e entre as confirmações mais recentes para a corrida portuguesa, estará o alemão da Bora-Hansgrohe, Max Schachmann. Já no sprint haverá André Greipel (Israel Start-Up Nation), que sabe o que é ganhar no Algarve, e Alexander Kristoff (UAE Team Emirates).