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(Fotografia: © Federação Portuguesa de Ciclismo) |
Com o final dos Campeonatos Mundiais em Yorkshire é tempo de fazer balanços e não há dúvidas que países como Estados Unidos, Itália e Holanda saíram bastantes felizes, ainda que as últimas duas selecções tenham visto escapar o título na elite masculina. A Dinamarca também não tem razões de queixas com Mikkel Bjerg a fazer história nos sub-23 (terceiro título consecutivo no contra-relógio) e Mads Pedersen a surpreender tudo e todos na elite. A Bélgica é das equipas que sai mais cabisbaixa, enquanto a selecção de Portugal apontava mais com João Almeida, mas as condições eram difíceis para fazer melhor. Já Rui Costa cumpriu, garantindo o seu quarto top dez em Mundiais.
A comitiva nacional variou entre querer dar experiência aos mais novos - como os juniores Daniela Campos, João Carvalho e André Domingues e também a Maria Martins que, sendo sub-23, correu pela primeira vez na elite por não haver este escalão no sector feminino - e apostar no talento de João Almeida e experiência de Rui Costa, sem esquecer Nelson Oliveira.
Os eleitos para os sub-23 tinham potencial para fazer um bom resultado. João Almeida é um dos jovens que se vai estrear no próximo ano no World Tour, na Deceuninck-QuickStep, André Carvalho está numa das melhores equipas de formação, a americana Hagens Berman Axeon, enquanto Miguel Salgueiro (Sicasal-Constantinos) é um dos principais talentos a emergir em Portugal. Já Emanuel Duarte venceu a classificação da juventude da Volta a Portugal e a geral da Volta a Portugal do Futuro, numa época marcante na LA Alumínios-LA Sport como Continental sub-25.
O mau tempo dificultou a missão dos dois primeiros no contra-relógio, com João Almeida a inclusivamente cair. Na prova em linha, as dificuldades de um percurso que chegou a ser encurtado para que os ciclistas não terminassem já com pouca luz natural, devido ao mau tempo e ao horário da corrida (foi no mesmo dia das juniores femininas), acabaram por deixar Portugal longe de um bom resultado, com nenhum dos ciclistas a conseguir ficar na frente da prova quando começaram a verificar-se cortes. André Carvalho foi o melhor, na 30ª posição, com Emanuel Duarte a abandonar.
Na elite, Nelson Oliveira ficou a 14 segundos da medalha de bronze no contra-relógio, continuando a ficar constantemente entre os melhores do mundo nesta especialidade. Foi oitavo, mas o terceiro posto ficou ali tão perto! O ciclista da Movistar teve depois a missão de ajudar Rui Costa na prova em linha e fez o seu trabalho, tal como José Gonçalves e Rui Oliveira. Em condições meteorológicas miseráveis, que levaram a UCI a cortar duas subidas na fase inicial da corrida, não foi fácil conseguir depois chegar ao fim.
Os três acabariam por abandonar, com Ruben Guerreiro a resistir um pouco mais, ele que poderia funcionar como joker. Porém, também não terminaria, deixando a corrida já depois de garantir que Rui Costa ficava no grupo certo. A partir daí o campeão do mundo de 2013 ficou sozinho. Não foi com Mathieu van der Poel, na movimentação que levou os últimos ciclistas à frente da corrida, pelo que o português ficou a enfrentar a difícil missão de resistir à chuva e frio, sem que ninguém trabalhasse para fechar a diferença. O 10º lugar foi um objectivo cumprido, com Rui Costa a mostrar como tem tendência a aparecer bem nos Mundiais.
"Foi preciso estar muito forte psicologicamente para encarar um Mundial como este, porque foi um dia de muita chuva e frio. Durante uma prova tão longa como esta [261,8 quilómetros], muitas coisas nos passam pela cabeça. As sensações eram boas no início, mas a meio não estava tão bem. Foi preciso ultrapassar esses momentos difíceis, esse sofrimento, para chegar melhor aos últimos quilómetros. A corrida fez-se muito dura com o frio e com a chuva", explicou Rui Costa, citado pela Federação Portuguesa de Ciclismo. O ciclista considera que o percurso original teria feito uma maior selecção de ciclistas mais cedo, contudo ficou satisfeito com mais um top dez, terminando a 1:10 minutos de Mads Pedersen.
O seleccionador José Poeira não pôde contar com Domingos Gonçalves, que não viajou para Inglaterra, alegando motivos pessoais. Um ciclista a menos numa corrida tão difícil, é algo a lamentar, mas Rui Costa finalizou da melhor forma. "Apesar dos colegas terem ajudado o Rui Costa em determinada fase da corrida, ele ficou sozinho durante muito tempo. Nessa circunstância, não podia ter feito mais do que fez. Esteve muito bem", salientou José Poeira.
Os Mundiais não serão de grandes recordações não só para algumas equipas, mas também para a própria organização. A intempérie que marcou quase toda a semana de provas, colocou à prova o poder de decisão dos comissários e nem sempre as opções foram consensuais. O contra-relógio de sub-23 ficou marcado por quedas aparatosas devido às condições da estrada, que teve partes que mais pareciam piscinas. No entanto, a prova não foi adiada, como aconteceu depois com a das senhoras. A UCI decidiu encurtar as corridas dos sub-23 e da elite, por diferentes razões. Esta opção agradou a uns e não a outros, dependendo das características dos ciclistas e do que preferiam ver num percurso.
Depois houve a desqualificação de Nils Eekhoff, que numa fase inicial caiu e recuperou posição no pelotão pedalando atrás do carro da equipa. Os comissários só analisaram a situação no final, com recurso ao vídeo-árbitro, depois do holandês ter ganho a corrida de sub-23. Além de se questionar a dualidade de critérios, comparativamente com o que aconteceu na Volta a Espanha com Primoz Roglic e Miguel Ángel López, também se perguntou porque não foi tomada uma decisão mais cedo, evitando a enorme desilusão que o jovem ciclista foi obrigado a enfrentar ao não ser declarado o vencedor.
A nível de público, Yorkshire foi o esperado, mesmo com o mau tempo, principalmente no fim-de-semana. Afinal, é um público mais do que habituado a esta meteorologia. Porém, a chuva, vento e frio, que limitaram as transmissões televisivas e criaram constrangimentos aos ciclistas, acabando por tirar algum brilho aos Mundiais, mas houve espectáculo, surpresas, drama, um filme completo de bom ciclismo, para contrabalançar um pouco do que de mau se viu.
Para o ano, os Mundiais irão disputar-se no Cantão de Vaud e no de Valais, na Suíça.