30 de abril de 2016

A semana 'horribilis' do ciclismo britânico

Jess Varnish acusou director técnico de sexismo
É caso para dizer que quando uma semana começa mal... é porque vai correr mal. No ciclismo britânico foi mesmo isso que aconteceu. Numa semana houve acusações de discriminação sexual que provocou uma baixa, um caso de doping de um dos mais promissores ciclistas, tweets polémicos e ainda alegações que equipamentos estão a ser vendidos na internet. Semana de muito trabalhado para os responsáveis britânicos.

A semana horribilis começou precisamente há oito dias quando Jess Varnish acusou o director técnico do ciclismo britânico (BC, na sigla inglesa de Bristish Cycling), Shane Sutton, de sexismo. Numa entrevista ao Daily Mail, a ciclista contou que Sutton disse-lhe que estava velha, que "devia ir ter um bebé" e que ela tinha um rabo grande. A polémica surgiu imediatamente. De referir que entrevista surge dias depois de Varnish ter sido retirada da equipa olímpica, dispensa justificada pelo declínio das suas performances.

A BC reage salientando que nunca Jess Varnish tinha levantado estas questões, mas mostrou-se disponível para falar com a ciclista de forma a apurar o que aconteceu, afirmando que leva alegações do género muito a sério.

Na terça-feira, mais duas ciclistas falam publicamente sobre a discriminação que dizem existir na federação britânica. Nicole Cooke e Victoria Pendleton são duas vozes importantes, sendo ambas campeãs olímpicas. Cooke afirmou que enquanto alguns homens recebiam equipamentos novos, as mulheres que competiam na elite tinham de continuar com os velhos. Já Pendleton admitiu que evitava falar em encontros e estágios, pois sentia que a sua opinião não era tão respeitada como a dos atletas masculinos, mesmo tendo ela um currículo com os títulos mais importantes.

Em ano de Jogos Olímpicos, a BC responde rapidamente, garantindo que "uma medalha de ouro é valorizada, não interessando quem a ganha". "Orgulhamo-nos igualmente de todos os nossos campeões olímpicos e do mundo."

E como não se não bastassem as acusações de Jess Varnish, Shane Sutton via-se agora com outro problema. Darren Kenny, ciclista paralímpico, acusa o director técnico de ofender paraciclistas. Desta vez foi de mais para a BC. Sutton é suspenso.

No dia seguinte, numa entrevista ao The Times, Sutton nega ter alguma vez dito o que Varnish e Kenny o acusam. Mas nessa mesma quarta-feira anuncia a sua demissão: "Os desenvolvimentos nos últimos dias tornaram-se uma distracção. Por isso, falei com amigos e família e acredito que é no melhor interesse do ciclismo britânico eu abandonar o meu cargo de director técnico."

Problema resolvido? Longe disso.

Um dia depois é a vez de Emma Pooley falar, desta feita ao The Guardian. A ciclista afirmou que o problema não se limitava a Shane Sutton. Pooley aponta o dedo a Dave Brailsford, questionando porque foi apoiada a criação de uma equipa masculina para vencer a Volta a França, mas nunca foi feito o mesmo para uma equipa feminina. Na altura da formação da Sky, Brailsford trabalhava na BC.

A resposta surgiu no Twitter por parte de Peter Kennaugh, actual campeão de estrada britânico e ciclista da Sky. "Emma Pooley porque é que a Sky haveria de colocar dinheiro no Giro que ninguém conhece no Reino Unido". (O Giro tem a mesma importância para as mulheres que a Volta a França tem no ciclismo masculino.) Kennaugh escreveu para Pooley deixar de ser tão egocêntrica.

Kennaugh também tinha apoiado publicamente Sutton, mas os tweets dirigidos a Pooley acabaram por ser apagados. Aliás, a sua própria conta na rede social chegou a estar suspensa. Quando "regressou", Kennaugh escreveu que tinha parecido ser um idiota (ver tweet em baixo).


Mas os problemas nesta quinta-feira ainda estavam a começar. O Daily Mail publicou uma notícia que dava conta que equipamentos, incluindo bicicletas que valem mais de 12 mil euros, estavam a ser vendidos na internet. Avançou ainda que a federação já tinha recebido um pedido para investigar as alegações.

A BC reage, negando que tal alguma vez tenha acontecido, garantindo que nos últimos dez anos têm sido feitos inventários rigorosos. Admitiu que alguns equipamentos antigos foram vendidos em encontros de ciclismo e que não pode controlar o que lhes acontece depois de estarem em mãos de particulares.

Tempo para respirar fundo... É que ao início da noite surgiu mais uma bomba: um ciclista britânico tinha falhado um teste antidoping. O Daily Mail volta a ser a fonte da notícia que não deixaria a BC descansar. Inicialmente não foi divulgado um nome, mas não demorou muito até que o dedo fosse apontado a Simon Yates. O ciclista de 23 anos acusou terbutalina durante o Paris-Nice.

O que ameaçava tornar-se em mais um escândalo - ainda mais tendo em conta que Yates é visto como uma das grandes promessas do ciclismo britânico e tem como um dos objectivos do ano estar nos Jogos Olímpicos - provavelmente não o será porque a Orica GreenEDGE saiu imediatamente em defesa do seu atleta.

Na sexta-feira, a equipa australiana admitiu o caso, explicando que tudo não passa de um erro administrativo. Ou seja, o médico terá dado um medicamente para a asma a Yates que contém a substância proibida, não tendo alertado os responsáveis pelos controlos antidoping da situação.

E para acabar a semana, o dono da Orica, Gerry Ryan acusou de alguém na BC ter falado com um amigo seu australiano sobre um ciclista que tinha acusado positivo. "Estou desiludido porque o Simon não teve a oportunidade de apresentar o seu caso. Estou desiludido que a BC tenha dito que o Simon testou positivo antes do caso ser ouvido e não houve uma contra-análise", afirmou ao site Cycling Tips.

Que semana... Pelo menos este sábado houve alguma normalidade para o ciclismo britânico: Chris Froome ganhou a etapa rainha na Volta à Romandia, mostrando que está a melhorar a sua forma rumo à Volta a França. E para talvez começar uma semana melhor, os elogios à Volta a Yorkshire para as mulheres são o mais importante - tendo em conta tudo o que aconteceu -, não esquecendo que por um dia de corrida a vencedora (Kirsten Wild, da Hitec Products) amealhou 20 mil euros. Já os homens, caso o mesmo ciclista ganhasse as três etapas e a classificação geral, "só" levaria 14 mil. No primeiro ano do World Tour feminino, este foi um grande passo para as mulheres no ciclismo.

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