18 de outubro de 2016

O Tour dos trepadores que tenta aprender um pouco com a Vuelta... mas sem entusiasmar

Eis a Volta a França de 2017, a 104ª edição: cinco etapas de alta montanha (três com chegadas em alto), outras tantas com muito sobe e desce (e as descidas podem ter um papel importante neste Tour), dois contra-relógios individuais (curtos) e nove etapas planas. Os números não dizem tudo, mas já mostram alguma coisa. Depois de um Giro e principalmente de uma Vuelta muito duros, o percurso do Tour não é o que mais entusiasma numa primeira abordagem. Analisando um pouco melhor as etapas, ver-se-á que até pode ser mais interessante que a edição de 2016, pois "aprendeu" um pouco com a Volta a Espanha ao incluir subidas curtas mas duras. Uma coisa é certa com um contra-relógio de 13 quilómetros e outro de 23, este será um Tour para os trepadores, algo que não agradará tanto a Chris Froome, mas que terá deixado Nairo Quintana bastante satisfeito.

Tudo começará a 1 de Julho em Düsseldorf, que curiosamente até tem a alcunha de "pequena Paris". Será a quarta vez que o Tour arranca na Alemanha, depois de Colónia (1965), Frankfurt (1980) e Berlim (1987). Este regresso a terras germânicas funciona também, de certa forma, como o confirmar das pazes feitas entre o país e o ciclismo, depois de alguns anos de revolta, quando foram revelados os casos de doping que afectaram também o germânico Jan Ullrich. A Volta a França chegou mesmo a não ser transmitida por nenhum canal alemão. Agora já é novamente transmitida, até há o regresso de uma Volta ao país e as pazes serão então seladas em Düsseldorf com um contra-relógio de 13 quilómetros e ainda com a partida da segunda etapa. Além da Alemanha, o Tour passará ainda pela Bélgica (Liège) e Luxemburgo.

Se desta vez os sprinters não irão disputar a primeira camisola amarela, não se terão de preocupar muito, pois terão oportunidade para tal pelo menos no segundo dia, até porque vão manter-se as bonificações de dez, seis e quatro segundos para o primeiro, segundo e terceiro classificados de cada etapa.

Porém, logo na terceira tirada, ciclistas como Peter Sagan, Julian Alaphilippe ou Greg van Avermaet terão um dia que pode muito bem ter um deles como vencedor, pois tem um final com uma ascensão curta, mas dura, ao estilo de uma clássica. Aliás a distância também faz lembrar corridas de um dia: 202 quilómetros. E logo na etapa cinco será momento para para os candidatos aparecerem, com a primeira chegada em alto em La Planche des Belles Filles. Ao contrário da Vuelta, no Tour haverá sempre tempo para respirar um pouco e para os sprinters aparecerem, pois não há mais do que duas etapas de montanha consecutivas.

Pela primeira vez desde 1992, os cinco principais locais montanhosos em França estão no percurso. Vosges, Jura, Pirenéus, Maciço Central e os Alpes. Não haverá Mont Ventoux e o Alpe d'Huez fica novamente fora. No que se refere a subidas míticas será o Col d'Izoard a figurar nesta edição (18ª etapa). Contudo, não é a etapa que mais assusta, ainda que ultrapasse os dois mil metros de altitude. A tirada nove, por exemplo, promete espectáculo e é a prova como os trepadores têm mesmo de se defender bem nas descidas (ver imagem em baixo).



Depois temos a etapa 13, que o director da prova, Christian Prudhomme, considera que poderá ser importante para os candidatos. O perfil nem dá a sensação de ser uma tirada das mais difíceis. Porém, são três duras subidas nos Pirenéus... em apenas 100 quilómetros. Etapas curtas têm tornado-se presenças habituais nas grandes voltas. Mas só 100 quilómetros? Não é nada normal.



A juntar ao Col d'Izoard teremos no dia antes também uma etapa que faz com que se houver algo por decidir na geral, este dois dias serão muito importantes. Na tirada 17, o pelotão passará por quatro subidas, a última o Col du Galibier (2642 metros de altitude), onde não está a meta. Será preciso ainda enfrentar uma descida.



O contra-relógio na penúltima etapa também não se pode dizer que assusta muito. Serão 23 quilómetros em terreno sem grandes dificuldades, em Marselha, o que significa que será difícil fazer grandes diferenças. E claro, os Campos Elísios estarão à espera para a consagração do vencedor, a 23 de Julho.

Quem sai beneficiado/prejudicado

A reacção da maioria dos ciclistas tem sido cautelosa. Dizem que parece ser um percurso interessante e com alguma intensidade com a integração de subidas curtas mas duras. Porém, em comum têm o discurso que agora é tempo de fazer o trabalho de casa e analisar etapa a etapa. Mas desde logo pode-se dizer que Chris Froome sai prejudicado sem um contra-relógio mais longo, ainda que é naturalmente um excelente trepador e pode ter alguma vantagem com as várias descidas da competição. Nairo Quintana é o oposto. Sai beneficiado com os contra-relógios e também com as subidas, mas terá de trabalhar muito bem as descidas para não voltar a ver Froome desaparecer, como aconteceu em 2016. Os franceses Thibaut Pinot e Romain Bardet também estarão relativamente satisfeitos, ainda que tanto um como outro gostariam provavelmente de mais chegadas em alto e menos descidas.

Se Vincenzo Nibali estiver no Tour, as etapas com muitas descidas agradam-lhe de certeza, ainda que sendo um bom contra-relogista, está numa situação parecida com Froome. Já Fabio Aru tem potencial para se mostrar bem melhor do que em 2016, ainda que tal como Pinot e Bardet, mais umas chegadas em alto poderiam beneficiá-lo. Alberto Contador não estará totalmente satisfeito. Faltarão chegadas em alto para entusiasmar mais o espanhol, mas certamente que o vamos ver a dar tudo, sendo um ciclista com capacidade para se adaptar mais facilmente a este tipo de percursos.

Richie Porte, Bauke Mollema e Louis Meintjes parecem satisfeitos, já Daniel Martin deixou no ar alguma incerteza quanto à sua temporada. O irlandês poderá apostar noutra grande volta e não esquecer que Chris Froome deixou no ar a possibilidade de fazer o Giro, dependendo do percurso que a 100ª edição apresentar.

Um desejo do director e uma mudança muito positiva para as senhoras

Christian Prudhomme quer que no Tour as equipas sejam compostas por oito ciclistas, em vez dos habituais nove, de forma a tentar evitar um domínio de uma formação, que é como a quem diz, da Sky! Será uma batalha difícil, mas a influência da ASO - que organiza a Volta a França e outras grandes provas do World Tour - já conseguiu exigências bem mais complicadas. Prudhomme anunciou ainda que o canal francês transmitirá na íntegra todas as etapas... mesmo as de 200 quilómetros e planas...

De salientar a mudança da prova feminina. Habitualmente tem sido realizada na última etapa, em Paris, mas este ano vai para a montanha, mais precisamente para o Col d'Izoard. Uma alteração bem recebida, que comprova como aos poucos o ciclismo feminino vai crescendo. Claro que as sprinters não ficaram tão satisfeitas!

Feitas as apresentações, agora é esperar até dia 1 de Julho. O percurso tem os seus momentos potencialmente emocionantes. Mas emoção é algo que tem faltado no Tour nos últimos anos. Há que esperar para ver como os ciclistas vão enfrentar esta Volta a França.


Le parcours en 3D / The route in 3D - Tour de... por tourdefrance

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