9 de abril de 2017

Greg van Avermaet e a vitória da persistência

(Fotografia: Facebook BMC)
Que espectáculo de corrida! Que grande Avermaet! Na 115ª edição do Paris-Roubaix não houve apenas a emoção do costume (e é normalmente muita), houve um espectáculo de luxo, com ataques, contra-ataques, velocidade de loucos, indefinição até final... Quando alguém perguntar como é possível ficar quase seis horas a assistir a 257 quilómetros de ciclismo, a resposta tornou-se ainda mais fácil: vejam o Paris-Roubaix deste ano. Para tornar ainda mais inesquecível esta edição, Greg van Avermaet conquistou finalmente o seu primeiro monumento. E que bem que lhe soube! Claro que muitos considerariam que perfeito, perfeito, teria sido um Paris-Roubaix com a vitória de Tom Boonen no dia da sua despedida. Mas o triunfo de Avermaet não é menos perfeito, pois nestes últimos dois anos é dos ciclistas que mais ganha. Pode não ser tão amado como o compatriota, pode nunca vir a ter o currículo de Boonen, mas com este monumento Avermaet garante de vez o seu lugar de destaque na história do ciclismo belga.

"Sofri muito [durante a corrida], mas com a vitória, agora não sinto dores!" Avermaet não conseguiu esconder a emoção de um momento que há tanto tempo procurava. E de facto sofreu muito. Fisicamente e psicologicamente. Mas este Paris-Roubaix resume muito do carácter deste ciclista, que depois de ser um crónico segundo, encontrou nos últimos dois anos o caminho dos triunfos. Tem quase 32 anos, apareceu tarde, mas muito a tempo de construir uma carreira a todos os níveis excelente.

(Fotografia: Facebook BMC)
Avermaet lutou durante anos contra a desilusão de ficar perto de vencer, mas faltar sempre algo. Lutou contra as desconfianças que nunca estaria ao nível de, por exemplo, um Tom Boonen. Lutou para garantir que a BMC não lhe tirava o seu lugar de líder em prol de um Philippe Gilbert, então de créditos firmados. Lutou e lutou. Foi persistente, pegou nas desilusões e transformou-as em armas para se tornar um ciclista melhor e mais forte. Nunca desistiu. Neste Paris-Roubaix, teve uma avaria, apanhou um valente susto num estreitamento de estrada e por duas vezes teve de fazer uma recuperação. Chegou a parecer que, tal como na Volta a Flandres, poderia hipotecar os seus planos a 100 quilómetros do fim. Mas tal como na Flandres, não baixou os braços. Há uma semana ficou com o segundo lugar, mas desta feita, ficou no trio que entrou no velódromo de Roubaix para discutir o monumento. Avermaet sabia que era a oportunidade que tanto esperava. Dores? Cansaço? É daquelas alturas em que se vai buscar forças não se sabe bem onde, mas elas estavam lá e garantiram o famoso troféu em forma de pedregulho, que ficou muito bem entregue.

Vencer uma Volta a Flandres tem um significado especial para qualquer belga. É a corrida que Avermaet tanto ambiciona ganhar. Mas voltou a ser em França que foi feliz. No ano passado, no Tour, venceu uma etapa e vestiu a camisola amarela. Ficou muito orgulhoso. Agora leva o monumento, fechando uma fase das clássicas do pavé quase perfeita, depois de ter conquistado a tripla Omloop Het Nieuwsblad, E3 Harelbeke e Gent-Wevelgem. É uma fase do ano quase perfeita porque faltou a desejada Volta a Flandres. Mas foi um Março e Abril sensacional para Avermaet, a quem fica agora a faltar um título mundial, recordando que é o campeão olímpico.


Adeus amargo de Boonen, o azar de Sagan e a desilusão da Katusha

Grande parte das atenções estavam em Tom Boonen. O ciclista da Quick-Step Floors sonhava terminar a carreira com uma histórica quinta vitória no Paris-Roubaix, que seria um feito inédito na corrida. Deu tudo e um pouco mais, mas este já não é o Boonen de outros tempos e não houve um último fulgor de génio do belga. Acabou inclusivamente fora do top dez. Despedida sem glória, mas plena de homenagens dos fãs que ao longo da corrida o apoiaram e desejaram tanto como ele que o adeus fosse um conto de fadas com final feliz.

Boonen não conseguiu entrar no grupo que acabaria por discutir a vitória e como na frente estava um colega de equipa, Zdenek Stybar, não só limitou um pouco a sua margem de manobra, como também o prejudicou, pois não teve um companheiro da Quick-Step Floors que o ajudasse nos quilómetros finais. Stybar, que no final tentou poupar-se, não conseguiu derrotar Avermaet e ficou em segundo.

Peter Sagan merece o prémio de azarado do Paris-Roubaix. Tão crescido que se mostrou tacticamente e tão infeliz foi quando em dois ataques muito sérios, furou. Ao segundo percebeu que não ia ser o seu dia e terminou a mais de cinco minutos de Avermaet. Foi um 2017 para esquecer nas clássicas do pavé, tendo somado apenas uma vitória na Kuurne-Bruxelles-Kuurne.

Outro destaque pela negativa foi a Katusha-Alpecin. A equipa de José Azevedo alimentava as esperanças de ver Alexander Kristoff aparecer e tinha ainda um Tony Martin que colocou o Paris-Roubaix como um objectivo para 2017. A formação suíça esteve muito activa na primeira metade da corrida, sendo uma das grandes responsáveis por à entrada do primeiro sector de pavé não existir uma fuga digna desse nome, algo raro no Paris-Roubaix. Chegou inclusivamente a tentar a táctica de meter alguém numa fuga, mas foi um daqueles dias que ninguém conseguia afastar-se do pelotão.

Os dois líderes da Katusha-Alpecin acabaram por ser vítimas das circunstâncias da corrida, isto é, os sectores de pavé foram fazendo a habitual eliminação de ciclistas. O primeiro a ceder foi Kristoff. O norueguês passou novamente ao lado de uma das principais corridas e nem acabou o Paris-Roubaix. Tony Martin esteve melhor e até experimentou um golpe à Fabian Cancellara, tentando um ataque de longe. Não aguentou o ritmo e cortou a meta a quase dez minutos do vencedor.

Também a Trek-Segafredo não estará nada satisfeita com esta fase da época. John Degenkolb voltou a estar longe da decisão e Jasper Stuyven, que acabou por ser o ciclista que ficou na frente, não resistiu ao ritmo do trio que acabaria por lutar pela vitória. Dado o habitual suspense final no velódromo, Stuyven e Gianni Moscon, da Sky - atenção a este italiano para o futuro próximo - ainda chegaram novamente aos três da frente, mas de nada valeu. Zero vitórias nas clássicas do pavé, no ano pós-Cancellara.

Já a Cannondale-Drapac está entre mais uma desilusão e um bom resultado. A equipa americana continua apenas com uma vitória em 2017, que nem é de nível World Tour. Mas depois de Dylan van Baarle ter sido quarto na Volta a Flandres e demonstrado que aos 24 anos é um ciclista a seguir com atenção (foi 20º no Paris-Roubaix), este domingo foi a vez de um veterano sonhar com a vitória. Sebastian Langeveld (32 anos) sabia que tinha uma missão difícil tendo dois adversários claramente mais rápidos ao sprint que ele. Mas não desistiu e o terceiro lugar é um lugar honroso. Ainda assim pedem-se (começa a ser mais desespera-se) por vitórias na Cannondale-Drapac.

Para terminar, Nelson Oliveira e Nuno Bico não foram felizes. Os ciclistas portugueses da Movistar caíram, perderam tempo e acabaram por abandonar.

Ponto final no pavé, mas as clássicas continuam agora com uma das semanas mais popular do ciclismo, a das Ardenas, que irá também ficar marcada pelo regresso de Rui Costa à competição, depois de uma pausa de um mês, após de um início fenomenal de temporada.

Veja aqui os resultados da 115ª edição do Paris-Roubaix, o Inferno do Norte.



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