(Fotografia: Team Sky) |
Era o que se temia e não há Quintana ou Movistar que contrarie: a Sky volta a dominar a Volta a França a seu belo prazer e sim, o Tour está aborrecido, mas não, a culpa não é da Sky. Não se podendo dizer que o Tour está decidido, quando faltam quatro dias para o decidir, parece que se está mais na expectativa de ver se a Sky e Chris Froome fraquejam na última semana, como já aconteceu no passado, do que acreditar que alguém consiga medir forças com a equipa britânica. Há pouca fé que um Quintana ou mesmo um Bauke Mollema (que neste momento até se apresenta como a maior ameaça à liderança do britânico) possam de facto contrariar o poderio assustador desta super Sky.
Porquê assustador? Porque pura e simplesmente quando esta Sky está bem ninguém a consegue bater e é assustador pensar que isto poderá manter-se mais uns tempos. Nos últimos anos, só quando Froome caiu e foi obrigado a abandonar é que a equipa ficou exposta e Vincenzo Nibali aproveitou para conquistar a Volta a França e entrar no restrito grupo de ciclistas que venceu as três grandes voltas. Nos outros anos, a Sky pode ter tremido um pouco - como aconteceu em 2015 - mais não caiu.
Claro que este domínio nos faz pensar que se não fosse a Sky se calhar tínhamos mais espectáculo no Tour. No entanto, não se pode culpar a equipa britânica de tirar interesse à Volta a França. O problema está que desde que em 2012 a Sky começou a cumprir a promessa de vencer o Tour, nenhuma outra equipa encontrou ainda forma de contrariar a superioridade britânica.
A Sky mudou a forma de treinar, mudou a forma de competir, mudou a forma de contratar (tem dinheiro para escolher quem quer). A Sky revolucionou o ciclismo e tem estado desde então na linha da frente. As restantes equipas foram tentando adaptar-se, mas a Sky parece estar sempre um passo à frente, principalmente no que se refere à Volta a França. Por enquanto, ainda não tentou expressar todo o seu poderio em nenhuma das outras competições.
Sabendo deste poderio, a Movistar concentrou este ano Nairo Quintana apenas e só para o Tour, um pouco à imagem do que aconteceu há um ano, mas desta vez prometendo uma mentalidade diferente, tendo em conta que ficou a impressão que o colombiano poderia ter ganho se tivesse atacado a liderança mais cedo de Froome e não ter deixado para o fim.
O que se tem visto de Quintana? Um ciclista mais preocupado em não deixar fugir Froome do que em fazer a sua corrida. Passa o tempo na sua roda, na expectativa. Afinal a Movistar ainda não perdeu o respeito à Sky e receia atacar. Valverde já o fez, mas nem a ele próprio convenceu. E Quintana? Foi praticamente uma humilhação o que aconteceu no Mont Ventoux: tentou atacar duas vezes e das duas vezes foi apanhado por Wout Poels. Froome nem precisou de se mexer. Já para não falar que por duas vezes Quintana foi apanhado desatento e que por duas vezes Froome fugiu, além de no Mont Ventoux estar a desaparecer da vista do colombiano até ao insólito momento da moto e da corrida a pé.
Neste momento, só Bauke Mollema (Trek-Segafredo) e Romain Bardet (AG2R) dão indicações que têm ideias de perder o respeito à Sky. E quando se fala de perder o respeito, é numa perspectiva de atacar, não ficarem presos ao ritmo que a equipa impõe e que tantas dificuldades cria para quem quiser sair do grupo. A questão é que se nenhum destes ciclistas tem equipa para os ajudarem, talvez esteja na altura de formar alianças. Só com ataques sérios e não as amostras que até agora se viram, esta Sky pode ser colocada verdadeiramente à prova. Porque assim, parece imbatível, porque ninguém nem sequer testar os limites. Na Volta a França estão os melhores do mundo e não estão todos na Sky. Está na altura de se mostrarem
O tempo urge, e são quatro dias (três se descontarmos o contra-relógio, no qual estará cada um por si) para salvar algum espectáculo neste Tour. Para trazer alguma emoção que vá além de: será que Froome vai fraquejar? O que se quer é: será que Mollema, Quintana, Bardet, ou outro nome, poderá finalmente fazer Froome ser obrigado a defender a camisola amarela? É que até ao momento, até tem sido Froome a atacar de forma séria. E não nos podemos esquecer que o britânico afirmou que na preparação para este Tour concentrou-se em garantir que estará melhor na terceira semana do que aconteceu em edições anteriores.
A Sky pode ter o dinheiro para comprar qualquer ciclista. A Sky pode ter potencial para controlar um pelotão durante quilómetros e quilómetros e tem o estatuto para influenciar decisões como as do Mont Ventoux, mas se nenhuma outra equipa pelo menos tentar, então será impossível explorar algum ponto fraco, como há um ano surgiu no Alpe d'Huez... e quando descobriram já era tarde.
O poder da influência
Voltando à questão do Mont Ventoux e à polémica decisão de deixar Chris Froome de amarelo após a perda de tempo provocada pelo choque com uma moto e a bicicleta partida. A regra dos três quilómetros é para as etapas planas, mas quantas vezes se fala na "verdade desportiva"? Desta vez foi possível restabelecê-la. Afinal porque tinham os ciclistas de pagar por uma estupidez do público? Claro que as regras foram adaptadas e só o foram porque Chris Froome era um dos envolvidos. A influência da Sky a funcionar em pleno. Se tivesse sido só Bauke Mollema ou Richie Porte, o mais provável é que tivessem mesmo perdido tempo. Porém, quantas vezes mudaram-se regras precisamente porque algum influente ciclista esteve no centro da questão. Não foi Fabian Cancellara que parou uma corrida devido ao calor extremo e foi a voz do pelotão para a criação de uma regra para situações de meteorologia que coloquem em risco os ciclistas?
Exemplo diferente, é certo, e sem a influência directa do que se passou no Mont Ventoux, mas serve para demonstrar que é muitas vezes necessário alguém importante envolver-se para as regras serem alteradas. O correcto talvez tivesse sido cumprir a regra e mudá-la depois, mas então para quê falar em "verdade desportiva"? O importante será perceber se no futuro a mesma regra será aplicada, porque aí sim, será escandaloso se não for.
Ataquem, por favor
Regressando à estrada, de quarta a sábado não haverá uma etapa fácil. Mantém-se a esperança que alguém ataque e que esse alguém não seja apenas Chris Froome, que até tem sido quem mais espectáculo já deu entre os candidatos à geral. Isto é ciclismo. Quer-se espectáculo, ainda mais quando se fala da Volta a França, a mais importante prova da modalidade e uma das mais populares a nível mundial.
Não é a Sky que estraga o espectáculo, é a atitude conservadora de todos os outros que tem transformado mais um Tour aborrecido em muitas etapas, como foi o caso da deste domingo, que era uma das mais aguardadas. Porém, perante a importância e pressão dos patrocinadores em alcançar bons resultados no Tour - que não precisa de passar pela vitória na geral -, arriscar em demasia poderá estar fora de questão, contribuindo para o domínio da Sky. Ou seja, um lugar no pódio é para muitas equipas uma vitória e muitas vezes até um top dez já é um resultado mais do que desejado.
No fundo procura-se um ciclista que não só deseje ganhar o Tour (qual deles não ambiciona), como esteja disponível a arriscar ser aquele que bate a Sky e para tal terá de estar preparado para o melhor e para o pior, que pode significar perder tudo... Mas se alcançar a glória, esta é a Volta a França, e a glória será eterna. Não valerá o risco?
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