Encerrado o período das clássicas do pavé, a Amstel Gold Race marca o início da semana das Ardenas. Deixa-se a estrada incerta dos empedrados e passa-se para estradas sempre em alcatrão, mas com os chamados muros. Agora é altura de ultrapassar inclinações curtas, mas que fazem sofrer. Significa também que muda o perfil dos ciclistas. Na semana das Ardenas reaparecem os ciclistas com maior capacidade para ultrapassar as dificuldades que as subidas curtas e duras impõem, mas também é o momento para alguns sprinters, que se defendem bem nesse tipo de dificuldades, procurarem uma vitória em terrenos um pouco diferentes.
A Amstel Gold Race tem a particularidade de não ser exactamente nas Ardenas. Realiza-se na Holanda, perto de Maastricht, cidade também conhecida por ter dado nome ao tratado que em 1992 deu início ao processo da criação da moeda única nos países da União Europeia, por exemplo. São 248,7 quilómetros que mostram que a Holanda não é tão plana como se possa eventualmente pensar. Serão 34 subidas, com destaque para o Cauberg. É uma daquelas subidas históricas no ciclismo. São apenas 1200 metros, mas com pendente média de 5,8%. Em 200 metros chega a ter 11% de dificuldade, mas pelo meio são alguns metros a 9% outros a 6%...
A importância do Cauberg é tal que já chegou a ser incluído na Volta a França e na Volta a Espanha. É um daqueles sítios que é considerado quase obrigatório para os fãs assistirem a uma corrida. E na Amstel Gold Race deste domingo a subida será ultrapassada quatro vezes. Não surpreende por isso que ciclistas como Joaquin Rodríguez (Katusha), Bauke Mollema (Trek), Fabio Aru (Astana) e até o veterano Thomas Voeckler (Direct Energie) apareçam na lista de inscritos. Não são favoritos, mas aproveitam as dificuldades da corrida para preparar outras provas e nunca se sabe se com um secreto objectivo em surpreender.
Quem não está para surpreender e sim com estatuto de favorito é Michal Kwiatkowski (Sky), vencedor há um ano e que este ano chega já com uma vitória importante em Harelbeke. O estatuto é partilhado com dois homens da Orica-GreenEDGE, equipa australiana que estará desejosa para continuar a brilhar nas clássicas após a vitória no Paris-Roubaix. Michael Matthews esteve no pódio há um ano e é um daqueles sprinters que passa bem as dificuldades que a Amstel oferece. O australiano começou a temporada tarde, no Paris-Nice, mas conseguiu logo duas vitórias e chega a estas fase das clássicas com o objectivo bem definido em conquistar uma (está também escalado para a Flèche Wallone, na quarta-feira). A Orica tem ainda outra aposta: Simon Gerrans. Vencedor de uma Milan-San Remo e de uma Liège-Bastogne-Liège, Gerrans (35 anos) já conta com o triunfo na geral do Tour Down Under e tem as características certas para a Amstel.
Ambos terão o apoio de Mathew Hayman, o recente vencedor do Paris-Roubaix.
Ambos terão o apoio de Mathew Hayman, o recente vencedor do Paris-Roubaix.
O sempre super-favorito Philippe Gilbert
Em melhor ou pior forma, quando chega a semana das Ardenas, o nome de Philippe Gilbert é dos mais falados. Vencedor da Amstel Gold Race em 2010, 2011 e 2014, o belga da BMC tem esta semana como das mais importantes da temporada. No entanto, Gilbert teve uns últimos dias muito complicados. Um desentendimento com um condutor durante um treino resultou num dedo fracturado. Além das questões legais que enfrenta (Gilbert acusa o condutor de agressão, o condutor responde acusando o ciclista de ter utilizado gás pimenta), o belga vê-se limitado pela questão física, tendo admitido que foi obrigado a alterar a sua posição na bicicleta, nos travões por exemplo, para ficar mais confortável. "Não sou favorito", disse convictamente na conferência de imprensa, salientando que ao não participar na Brabantse-Pijl, na quarta-feira, ficou sem o ponto de referência que normalmente tem quando se aproxima a Amstel.
Depois de ter perdido Greg van Avermaet na Volta a Flandres devido a uma queda que o afastou também do Paris-Roubaix, a BMC nem quer pensar em perder agora outro líder. Ainda assim, o plano B poderá ser agora mais eficaz, pois Alessandro de Marchi é um ciclista lutador e que poderá adaptar-se bem às dificuldades da Amstel Gold Race.
Etixx-QuickStep desejosa por vencer
Tom Boonen não conseguiu nenhuma vitória durante a fase do pavé. Este domingo é a vez de um ciclista completamente diferente aparecer: Julian Alaphilippe. O jovem francês (23 anos) foi segundo há um ano na Flèche Wallone e na Liège - Bastogne - Liège e é uma das principais apostas da equipa para o futuro. Com a Etixx a realizar uma época de clássicas aquém do esperado - apesar de já contar com 22 vitórias em 2016 -, a equipa belga tem fortes aspirações a um vitória durante esta semana. Poderá parecer muita pressão para um jovem ciclista, mas não só Alaphilippe já mostrou estar à altura dos desafios que lhe colocam, como terá a seu lado a voz da experiência de Tony Martin, certamente motivado depois de um excelente Paris-Roubaix. E há ainda outro jovem, também de 23 anos: o checo Petr Vacok, que na quarta-feira conquistou a Brabantse-Pijl.
Cuidado com os portugueses
Rui Costa gosta destas corridas. O português não o esconde, como também não esconde que a Liège - Bastogne - Liège não é apenas um sonho, é um objectivo. Rui Costa tem não só as características físicas para estas corridas, como conta com a sua inteligência táctica, que tanto o ajudou a tornar-se num dos ciclistas mais respeitados no pelotão e que pode ser decisiva se voltar a ter pouco apoio da equipa, como tem sido habitual. A Lampre-Merida escolheu ainda o irmão Mário Costa para acompanhar o líder. Há uma semana esteve no Paris-Roubaix, mas não terminou a prova.
E depois há Tiago Machado. Apesar de na Katusha ser inevitavelmente um ciclista que trabalha mais para os outros, em corridas como as clássicas das Ardenas, o português eventualmente ter alguma liberdade.
Cuidado com...
- Ben Swift da Sky, mais um sprinter que não se deixa intimidar por subidas como as da Amstel;
- Sep Vanmarcke (Lotto-Jumbo) é dos poucos ciclistas que vem do período do pavé. Terceiro na Volta a Flandres e quarto no Paris-Roubaix, o belga é sempre um nome a ter em conta, mesmo não sendo o seu terreno preferido;
- Lars Boom (Astana) adapta-se a quase qualquer terreno. Lutador por excelência é um ciclista que ninguém pode dar um milímetro de vantagem;
- Edvald Boasson Hagen (Dimension Data) também esteve nas corridas do pavé (e bem). A equipa já disse que não há pressão sobre o norueguês, mas é difícil acreditar que esteja na Amstel só para marcar presença;
- Tony Gallopin (Louto Soudal) é um daqueles ciclistas que não é um trepador puro, mas já o vimos a acompanhar os melhores na Volta a França. Não sendo um especialista em corridas de um dia, com muros como o da Amstel, se o francês se encontrar bem fisicamente, certamente que tentará intrometer-se na luta, eventualmente com algum ataque no Cauberg, por exemplo;
- Fabio Felline (Trek-Segafredo) é daqueles sprinters que se defende bem em algumas subidas. Num bom dia, nunca se sabe...;
- Damiano Cunego (Nippo - Vini Fantini) está há muito afastado das grandes vitórias. Mas venceu a Amstel em 2008 e se agora não se poderá apontá-lo sequer como outsider, ainda assim o italiano deverá mostrar-se um pouco;
- Pieter Weening parece ter encontrado uma nova motivação na Roompot - Orange Peloton como demonstrou na Volta a Catalunha. Também não é sequer visto como outsider, mas a pedalar em casa...
Tom Dumoulin e a corrida que não podia perder
Poderá não ser a corrida perfeita para preparar a Volta a Itália, mas Tom Dumoulin não podia faltar à Amstel Gold Race. Natural de Maastricht era irresistível estar presente. "Não tenho um objectivo específico para a Amstel e espero ter alguma liberdade. Não tenho a certeza que seja o líder com o Simon Geschke e o Warren Barguil também na equipa. Mas depois de 2015, estarei mais confiante à partida", afirmou ao site HLN.be.
Porém, muito gostaria a Giant-Alpecin que Dumoulin, ou Geschke ou Barguil, conseguissem um bom resultado, que passaria por uma vitória. É que a Giant continua a zero em 2016.
Quanto a Dumoulin, esta será mesmo a única clássica, seguindo depois para a Volta à Romandia.
As ausências
São duas as grandes ausências este ano. Depois de um período intenso de competição nas últimas semanas, Peter Sagan descansa agora um pouco e, ao que parece, com um regresso ao BTT. Também Alejandro Valverde, que seria um crónico favorito, preteriu a Amstel, estando a participar na Vuelta a Castilla y Leon, tendo hoje ganho a etapa. Mas mesmo a preparar o Giro, estará de volta na Flèche Wallone e na Liège - Bastogne - Liège, corridas que já venceu três vezes cada uma. Já Sagan, só o voltaremos a ver na Califórnia, onde estará com o dorsal número um depois de ter vencido surpreendentemente a corrida americana em 2015.
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